Um tempo de 12 horas para praticar quaisquer tipos de atividades ilegais, sem represálias. “Uma noite de crime” no maior símbolo do capitalismo e onde a indústria armamentista ainda gera, legalmente, bilhões aos cofres públicos. Por baixo dos panos, uma chance de expurgar o inferno que são os outros, libertando o niilismo para justificar uma suposta redução dos índices de criminalidade. Tal argumento original fez surgir o primeiro capítulo da franquia “The Purge” (título original), em 2013, e após o inesperado sucesso do filme dirigido por James DeMonaco, as continuações tornaram-se inevitáveis. Em 2014, “Uma Noite de Crime: Anarquia” investiu na ação da desordem proposta pelo subtítulo, do que na tensão do expurgo em um micro-espaço, foco da produção original.
O terceiro longa da série estreia nesta quinta-feira (06) e ganhou um novo título: “12 Horas para Sobreviver - O Ano da Eleição”. Entretanto, quem testemunhou a Anarquia vai, de pronto, perceber que a sequência copia os erros e acertos do anterior, investindo ainda mais nas sequências de ação e, praticamente, abandonando qualquer resquício de horror, exceto o social, no qual a obra mergulha, mesmo que no raso.
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DeMonaco continua à frente da franquia e entrega uma trama interessante, apesar das poucas novidades. Pecado: ao invés de usar a protagonista, a senadora Charlene Roan (Elizabeth Mitchell), para o aprofundamento das questões do expurgo, velhas proposições voltam à tona girando em torno do preconceito, controle da população e maniqueísmo. Charlene teve sua família ceifada em uma das edições da noite criminosa. Ela candidata-se à presidência dos EUA, 18 anos depois, e tem o fim das chacinas assistidas como seu principal objetivo no cargo. Mas, claro: o governo formado pelos Novos Pais Fundadores da América (NPFA) não vai deixar barato a ameaça representada pela opositora, carismática e cada vez mais popular.
Como todo governo facista, a NPFA manipula arbitrariamente a legislação nacional, derrubando a norma que proibia atentados a autoridades políticas na noite do expurgo. Assim, a correria do filme é para que a senadora, seu segurança (Leo - Frank Grillo, que volta para sua segunda participação na franquia) e uma mini-tropa de coadjuvantes tentem, primeiramente, sobreviver à violência deflagrada por seus perseguidores para então, por fim, revidá-la. A propósito, está nos coadjuvantes a maior diversão do filme ao passo em que estes também representam grandes segmentos de resistência social, nos Estados Unidos e no resto do mundo. O longa acerta em identificar o protagonismo das maiores vítimas de racismo e outros preconceitos (negros, imigrantes, mulheres), na luta pela manutenção do direito basal da sobrevivência numa sociedade de moral transversa e numa noite onde os fracos não tem vez (as cenas que refletem o expurgo, aqui, são excelentes). De mesmo modo, acerta em apresentar as verdadeiras marionetes do fascismo institucional, em tempos de uma ameaçadora evolução das ideologias de extrema direita ao redor do mundo.
Após um primeiro filme de horror latente e um thriller envolto em ação, “12 Horas” investe no carisma de Joe (Mykeltd Williamson), na obstinação do latino Marcos (Joseph Julian Soria) e nos bons de briga Laney (Betty Gabriel) e Dante Bishop (Edwin Hodge), para fazer valer os momentos de suspense silencioso - as imagens ganham mais força com a trilha sonora propositadamente escassa - que preludiam boas sequências de ação. De montagem apressada, início e fim da trama são os principais deméritos da projeção. DeMonaco, neste, também segue uma tendência de closes excessivos que só incomoda menos do que a iluminação errática de várias tomadas.
A irregularidade técnica da produção que tem nomes como Michael Bay envolvidos, no entanto, não diminui sua carga de entretenimento. O roteiro do filme abre pouco espaço para debate, entregando suas proposições prontas para serem digeridas. Mas a diversão surge com leves gostos de idiossincrasia e, só por isso, já dá um passo ante a maioria dos blockbusters multiplexers semanais.
Nota: 3 / 5