Basta uma simples busca na Internet para encontrar dezenas de sites que oferecem, gratuitamente, o acesso a canais pagos. Todos estão lá: os de filmes – como os da rede Telecine e HBO – os famosos por seriados – Fox, Warner, Sony – e os especializados em esportes – ESPN, SporTV. Tem até o Pay Per View do Campeonato Brasileiro.
Em geral, a interface é intuitiva, mas poluída. Clique na emissora desejada e programação começará a ser mostrada em uma pequena janela no centro da página – antes, porém, é preciso fechar os inúmeros anúncios que atrapalham a exibição. O som é decente, o sinal, instável, e a qualidade das imagens, sofrível. Se o usuário preferir assisti-las em tela cheia, ficam ainda mais arrastadas e embaçadas.
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A novidade, porém, é o aparecimento de sites que, em troca de uma mensalidade, prometem um serviço livre desses problemas. Um deles é o Master TV. São 124 canais – alguns, supostamente em HD – por apenas 10,90 reais mensais.
“A qualidade em nossos serviços é uma marca forte em nossa metodologia de trabalho. Estamos aqui para inovar este seguimento (sic), prestando a você, prezado amigo, um serviço com qualidade, sem falhas e, principalmente, com respeito a você, diferentemente do que você encontra pela Internet”, diz o texto na página.
A assinatura é feita via PagSeguro. As únicas formas de contatar os responsáveis pelo site – para suporte técnico ou reenvio de senha, por exemplo – é via e-mail ou chat. Em nossos testes, tão logo entramos no bate-papo, um atendente veio responder nossas dúvidas.
O Master TV, de fato, exibe imagens melhores – a qualidade, porém, está distante das de alta definição. O principal inconveniente é que, durante a transmissão, várias interrupções ocorreram. A culpa, segundo o portal, é da conexão àdo usuário. Há, inclusive, a recomendação de acionar a operadora para saber se ela está entregando toda a banda do plano contratado.
LEGALIDADE
Naturalmente, as pessoas por trás desses portais atuam na ilegalidade. Renato Monteiro, da Opice Blum Advogados Associados, listou as diversas normas que elas estão infringindo por oferecer conteúdo pirata.
“Há, por exemplo, a lei dos direitos autorais. O artigo 7º fala das obras protegidas, o que inclui as criações audiovisuais”, disse. “As empresas que as produziram são suas donas. Elas só podem ser usadas mediante autorização”. Como os portais em questão não transmitem os programas com o consentimento de seus detentores, estão sujeitos a medidas judiciais.
“Já a resolução que regula a TV por assinatura (488/2007) atesta que as transmissões por Internet também podem ser considerados serviços do tipo. Assim, por não terem a autorização da Anatel, os sites estariam desrespeitando-a”, destaca.
Outro fator é quanto ao Código de Defesa do Consumidor. O que o norteia, segundo Leite Monteiro, é o princípio da transparência. Ao transmitir um conteúdo sem especificar que não tem o direito de fazê-lo, a exigência estaria sendo ignorada.
Por fim, podem ser acusados de estelionato, por levar o usuário ao erro, fingindo ter a autorização para exercer uma atividade. De acordo com o advogado, os proprietários das páginas, além de serem multados – o valor dependeria do poder econômico dos envolvidos – poderiam pegar até cinco anos de prisão.
Os usuários que acessarem ou assinarem os sites que transmitem os canais pagos também podem ser responsabilizados. No caso de um processo, se for comprovado que estavam cientes da ilegalidade dos mesmos, seriam considerados receptores – pena máxima de quatro anos de reclusão.
A dificuldade, porém, seria acionar judicialmente um número tão grande de internautas – a página do Assistir TV Online no Facebook, por exemplo, conta com quase 15 mil fãs. Provar sua ciência tampouco seria tarefa das mais fáceis, pois a maioria dos sites não possui termos de uso e os que possuem não fazem nenhum alerta. O do Master TV, curiosamente, além de não prevenir os usuários, chega a ameaçar aqueles que estiverem cometendo a mesma infração que ele comete.
“Não é permitida nenhuma e qualquer cópia ou reprodução de qualquer conteúdo que esteja no site www.mastertv.biz, sujeito a medidas cabíveis e legais”, diz o segundo artigo.
Leite Monteiro afirma que as operadoras de TV por assinatura já estão se movendo para fechar os portais em questão, e, se preciso, acionar legalmente seus responsáveis. Ele destaca que há diversos meios para identificá-los – verificar o endereço de IP de onde o sinal é gerado seria um caminho lógico.
Procurada, a NET afirmou que os maiores afetados pela prática são os canais e que, por isso, não iria se pronunciar. A TVA, por sua vez, disse que quem responde pelo assunto é a ABTA (Associação Brasileira de Televisão por Assinatura), da qual é afiliada. A Associação passou à reportagem o contato de seu assessor jurídico, que, no entanto, não pôde atender, nem retornou as ligações.
O outro lado
A vasta maioria desses serviços alega não estar infringindo nenhuma norma, pois, supostamente, a legislação acerca da TV paga não cobre transmissões via Internet. Alguns – como o Master TV, em e-mail enviado à reportagem - citam, inclusive, uma matéria do IDG Now, publicada em 2008.
“Na transmissão pela internet, você faz algo de valor adicionado”, o que não se configura como crime, afirmou o presidente da consultoria Teleco, Eduardo Tude. “É claro que isto é uma zona cinzenta que cada um pode interpretar como quiser”.
A matéria, porém, trata de sites ou softwares – gratuitos – que transmitem a programação de canais abertos. Alguns, de fato, exibem também a de emissoras estrangeiras pagas, mas, quando o fazem, é porque elas liberam o streaming a partir de suas páginas. O Megacubo, por exemplo, afirma que apenas deseja facilitar a experiência do usuário, para que ele possa trocar de canal sem mudar de janela ou digitar um novo endereço.
“Muitas emissoras disponibilizam a transmissão ao vivo em seus sites”, informam os responsáveis pelo programa. Apenas reunimos “todas em um lugar só, facilitando a vida do internauta, que pode alternar facilmente entre os canais sem precisar visitar dezenas de sites para isso”. Ao final, ressaltam que estão à disposição para “remover qualquer conteúdo reclamado do banco de dados”.
Tanto o Megacubo quanto os portais que transmitem os canais pagos, desde os gratuitos – como TV Ao Vivo Grátis e o Ver TV Online – aos pagos – Master TV e TV Gol – existem há anos. Por enquanto, não representam um risco às empresas de TV por assinatura – diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos, por exemplo. À medida que a conexão à Internet no Brasil melhore, é possível que as coisas mudem, de modo que elas passem de uma aparente mobilização – a NET disse à Folha de São Paulo, em janeiro, que tomaria as devidas providências para fechar os sites em questão – para uma ação conjunta e contundente.