As incoerências nas correções das redações do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) divulgadas nesta semana colocam mais uma vez em xeque a capacidade do Inep de organizar e aplicar o exame. Roubo de provas, vazamento de questões e tema da redação, erros de impressão, cancelamento e adiamento dias antes da aplicação, tudo isso ocorreu nos últimos cinco anos.
A prova que antes era usada mais para avaliar o conhecimento dos estudantes que estavam concluindo o ensino médio ganhou mais importância quando as instituições públicas de ensino superior começaram a utilizá-la como processo seletivo na admissão de alunos, substituindo os vestibulares. Com a organização do Sistema de Seleção Unificada (SiSU), em 2009, o Enem ganhou ainda mais relevância e até alterou a metodologia das escolas, que preparam os alunos para enfrentar o exame, que também é pré-requisito para conseguir bolsas do ProUni.
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O anúncio do uso do Enem como forma de ingresso em universidades públicas ocorreu no meio do primeiro semestre de 2009, causando a insatisfação de muitos colégios, que precisaram alterar o calendário com o ano letivo já em andamento.
Após o congestionamento do site durante o período de inscrição, a prova acabou sendo adiada, dias antes da data prevista para a aplicação, porque alguns cadernos de prova foram furtados. O cronograma precisou ser mudado, alterando também o calendário de muitas instituições federais e estaduais públicas para os dias do exame não coincidirem.
Muitos candidatos também se queixaram dos locais de prova, distante de onde moravam. O MEC acabou atendendo ao pedido e determinando a alteração para os estudantes que se sentiram prejudicados. Após a realização do exame, o Inep divulgou um gabarito com as letras das respostas embaralhadas. O erro foi corrigido imediatamente após a constatação.
Em 2010, também houve muitos problemas, inclusive com erros de impressão nas provas amarelas e na folha de respostas. O enunciado de uma questão de história também continha informações erradas, mas segundo o MEC não impendia que o estudante chegasse à resposta correta. O vazamento do tema da redação e as novas regras no edital do exame - como a restrição no uso de lápis e relógios - também foram alvo de queixas.
O acesso à correção das redações foi permitido devido às queixas de alunos na edição 2011 que questionaram a nota e queria ter acesso à correção da prova. Na época, o Ministério da Educação informou que não havia uma ferramenta digital disponível que permitisse a consulta dos milhões de participantes às folhas de resposta que trazem a correção da redação. No entanto, a pasta se comprometeu a fornecer o espelho das correções na edição de 2012, o que de fato aconteceu.
Ainda em 2011, foi descoberto o vazamento de 14 questões do exame. De acordo com as investigações da Polícia Federal MPF, foi constatado que alunos do Colégio Christus, de Fortaleza, tiveram acesso antecipado às questões, pois os itens estavam em uma apostila distribuída pela escola semanas antes da aplicação do Enem. As questões vazaram da fase de pré-testes do exame, da qual a escola participou em outubro de 2010.
Cinco pessoas foram indiciadas. Duas funcionárias do Inep foram denunciadas por falsidade ideológica, por negarem a possibilidade de obtenção dos cadernos de provas do pré-teste. Também foram citados na denúncia uma representante da Fundação Cesgranrio, por ter colocado à disposição dos coordenadores dos colégios que participaram dos pré-testes do Enem os cadernos de prova, que eram protegidos por sigilo; e dois funcionários do Colégio Christus, por uso e divulgação indevida do material sigiloso e pela violação de sigilo funcional. Os 1139 estudantes do colégio tiveram as 14 questões anuladas.
Nesta semana, a surpresa foi foram as redações com receitas de macarrão instantâneo e com um hino de um time de futebol. Nas redes sociais, o descrédito sobre a organização e correção da prova é visível. A estudante Camilla Nogueira, da Paraíba, criticou as medidas do Inep. "Essa é ótima. Em vez de punirem os professores por não fazerem a correção de forma correta, vão punir os alunos brincalhões! Isso é incompetência", destacou. A defensora pública do estado do Ceará, Andrea Coelho, também se manifestou. "O prejuízo aos candidatos já aconteceu", frisou ela ao compartilhar uma notícia de que o Enem 2013 não aceitará redações com deboches.
Além das críticas, muitas brincadeiras sobre o que incluir nas redações: receita de pipoca de micro-ondas, hino do Flamengo, trechos das músicas da Xuxa. O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, garantiu que no Enem 2013 os corretores serão mais exigentes. "Haverá duas mudanças: uma é que as redações com brincadeiras não serão corrigidas: vai ser zero na redação. Já os casos de nota máxima passarão por uma banca formada por três doutores", informou.
De acordo com o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Luiz Cláudio Costa, mais de 300 corretores das redações do exame foram afastados da avaliação.