A responsabilidade socioambiental das companhias começa a ganhar um espaço, ainda que tímido, nas métricas de análise de investimento no Brasil, seguindo um caminho semelhante ao trilhado no passado pela governança corporativa, que conquistou presença nas análises. Por aqui, o investidor que busca um apoio para uma escolha mais responsável pode olhar o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), que já completou dez anos e é considerado um marco no mercado de capitais por inserir questões ambientais e sociais na avaliação de companhias. Outro disponível é o Índice Carbono Eficiente (ICO2), que tem como base uma ponderação do IBR-X-50 usando como parâmetro o grau de eficiência na emissão de gás de efeito estufa pelas empresas.
Os dois índices da Bolsa brasileira que incorporam questões de sustentabilidade, conforme o diretor da consultoria Sitawi - Finanças do Bem, Gustavo Pimentel, são duas histórias de sucesso considerando o risco e retorno, além de mais baixa volatilidade. No entanto essa trajetória bem sucedida não tendo sido, até aqui, suficiente para atrair investidores. "Esse é o paradoxo desse mercado. Há produtos envolvendo questões ambientais que se mostraram lucrativas, mas o investidor ainda não abraçou essa ideia", diz.
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De novembro de 2005, quando lançado, até o dia 19 de novembro, o ISE acumulou ganhos de 128,9%, ao passo em que o Ibovespa, o principal índice da bolsa brasileira, apresentou alta de 50,8% na mesma base de comparação. Mesma trajetória é observada no ICO2, que desde seu nascimento, em agosto de 2010, registra ganhos de 21,6%, enquanto o Ibovespa perdas de 26,1%, no mesmo intervalo.
O Coordenador Executivo do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (Gvces), Aron Belinky, destaca que o argumento da sustentabilidade tem muita receptividade entre os investidores, mas que muitos deles alegam dificuldade em acompanhar a posição do índice. Segundo a presidente do Conselho Deliberativo do ISE, Sonia Favaretto, uma das razões é o fato de que algumas ações mais líquidas do Ibovespa não estarem presentes na carteira do ISE. Na carteira que vigorará no próximo ano, a 11ª, não estão, por exemplo, Petrobras e Vale, sendo que a saída da última ocorreu logo depois do acidente da Samarco, em Minas Gerais. A mineradora é uma joint venture entre a Vale e BHP Billinton. No entanto, não houve a confirmação de que a empresa não se elegeu para a carteira por conta dessa razão, já que essa informação é tratada com confidencialidade.
"Iremos aprofundar essa questão, como um de nossos objetivos estratégicos. Vemos um crescimento do uso do índice dos investidores, muito aquém ainda, mas estamos mais perto do que longe", afirma a presidente do Conselho do ISE. Segundo ela, já houve de fato um entendimento do investidor sobre o tema, mas avalia que são necessárias "decisões mais firmes que impactem o mundo empresarial de forma mais concreta".
No Brasil, embora existam duas opções para os fundos utilizarem como benchmark, ou seja, o indicador que dá a referência de performance que um fundo procura acompanhar, ainda são poucos fundos que utilizam como referência o ISE e o ICO2. Hoje, segundo levantamento feito pela Risk Office, há 17 fundos sustentáveis no Brasil, que começaram a surgir após o lançamento do ISE, que juntos somam patrimônio líquido de pouco mais de R$ 1 bilhão, sendo que nem todos usam esses índices como benchmark. Para se ter uma ideia, a indústria de fundos tem hoje cerca de 15 mil fundos, com um patrimônio líquido de R$ 2,8 trilhões.
Segundo Pimentel, da Sitawi, esse afastamento dos investidores ocorre por "preconceito", já que o senso comum aponta que investimento responsável diminui o retorno. O especialista lembra que esses dois índices têm seus fundos de índices (ETFs, na sigla em inglês) negociados na bolsa, o que facilita o investimento, em especial aos institucionais.
O ETF atrelado ao ISE, o ISUS11, possui um patrimônio líquido de R$ 24,44 milhões, sendo que o conjunto de 16 ETFs listados na Bolsa brasileira de R$ 3,3 bilhões, considerando os dados de outubro disponíveis no site da BM&FBovespa. Já ao atrelado ao ICO2 tinha um patrimônio de R$ 65,69 milhões também no fim de outubro.
"O que se tem provado é que inserir essa questão acaba reduzindo o risco e levando a ação a performar melhor e isso tem sido paulatinamente percebido", diz. Pimentel destaca que parte do preconceito tem origem no fato de que o investimento sustentável começou a existir abordando um viés ético, no qual setores inteiros eram excluídos do portfólio. "Essa questão evoluiu ao longo dos anos e hoje, ao invés de se excluir, há uma análise mais profunda e individualizada. Dentro do setor de petróleo e gás, por exemplo, há empresas mais eficientes", afirma. Setores que tradicionalmente são deixados de fora nesse olhar ético são: de bebidas alcoólicas, armas de fogo e de tabaco.
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Juliana Lopes, diretora da Carbon Disclosure Project (CDP), conta que mundialmente o número de investidores que olham como os riscos climáticos podem afetar os investimentos vem crescendo, com um número cada vez maior de investidores que estão incorporando questões climáticas em suas análises de risco. O CDP mundialmente possui 822 investidores signatários, com US$ 95 trilhões em ativos financeiros sob gestão. No Brasil hoje há 67 investidores signatários. "Em relação ao benchmark de mercado há boa correlação entre o bom desempenho em bolsa e o bom desempenho climático", afirma Juliana. Anualmente, segunda ela, o CDP solicita o relato sobre o gerenciamento das mudanças climáticas, riscos e oportunidades e dos dados de emissões das maiores empresas de capital aberto.
A pesquisa "Bolsas de Valores sustentáveis: obstáculos reais, oportunidades reais", mostra que há mais de 50 índices de sustentabilidade ao redor do mundo, sendo que o ISE foi o quarto a ser lançado com o olhar para o investimento sustentável e responsável (ISR), que é aquele que reúne os objetivos financeiros do investidor com suas preocupações sobre o meio ambiente, sociedade e governança (ESG, na sigla em inglês). Nos Estados Unidos, de acordo com pesquisa realizada pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), o ISR representa 11,3% do total de ativos sob gestão no mercado americano. No Brasil ainda não existe um levantamento semelhante.
No mundo, o índice mais famoso é o Dow Jones de Sustentabilidade (DJSI), lançado em 1999, que foi o primeiro a avaliar o desempenho das empresas listadas na Bolsa de Nova York utilizando critérios de sustentabilidade. Depois do DJSI, a bolsa de Londres lançou em 2011 o FTSE4Good e a de Johannesburgo, que em 2003 lançou o SRI e levou a África do Sul a ser o primeiro país emergente a incorporar a sustentabilidade ao mercado de ações.