A crise que se instalou em diversas livrarias e editoras de todo o Brasil já existe há alguns anos e por diversos fatores. Além da competição com livros disponibilizados em plataformas digitais, dos impostos sobre os livros que dificultam o acesso à cultura e do fechamento de livrarias que são referência no mercado, a pandemia surgiu como mais uma ameaça a esse setor.
Em Belém, a livraria Fox – com 34 anos de existência completados na última quinta-feira (13) – é um exemplo da crise literária no país e corre o risco de fechar as portas. “O mercado de livros vem sofrendo queda de vendas no Brasil desde 2014. A pandemia veio arrasar mais ainda com o nosso mercado, pois o isolamento obrigatório e necessário nos tirou os clientes de dentro da loja”, explica a empresária Deborah Miranda, sócia-proprietária da livraria.
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Deborah conta que as vendas diminuíram 80% nos primeiros meses da pandemia. Para tentar mudar esse cenário, os livreiros criaram um site e continuaram a vender pelo Instagram e Whatsapp.
A campanha “Abra um livro pra Fox não fechar”, iniciada e divulgada nas redes sociais pelo autor paraense Edyr Augusto Proença, foi recebida com surpresa. “Soubemos por clientes que entravam e mencionaram a postagem do Edyr. A notícia foi recebida com muita surpresa pela repercussão extremamente positiva. Sabíamos que a Fox faz parte cultura da cidade, mas percebemos também uma imensa relação de afeto do público com a empresa”, relata Deborah.
Deborah Miranda fala que a livraria é necessária para a formação de leitores, para aprofundar saberes, e acredita que a Fox cumpre esse papel em Belém.
“Acho que a importância de uma livraria em qualquer lugar é de necessidade básica para a formação de leitores, de aprofundamento de conhecimento para quem o busca. No nosso caso, pensamos ter cumprido esse papel, e também com muito orgulho fizemos isso na nossa cidade, que amamos. Somos papa-chibés e temos muito orgulho disso”, afirma.
O escritor e jornalista Edyr Augusto é cliente e amigo dos donos da livraria e relata que já sabia o que estava acontecendo com a Fox. “O Tito Barata (jornalista) recebeu telefonema de Antônio Moura, poeta, dizendo que precisávamos fazer algo. Tito me ligou e fiz uma postagem dando a ideia de cada um ir lá comprar um livro, enquanto pensávamos em outras ações”, conta.
Um grupo que leva o nome “Amigos da Fox” foi criado no Whatsapp e várias pessoas entraram com sugestões que pudessem contornar a situação. Edyr também revela que algumas figuras renomadas na área da cultura demonstraram apoio e que levou um susto com o retorno imediato do público à campanha. “A livraria ficou lotada em todos esses dias, em uma prova de carinho das pessoas”, complementa.
Edyr define a livraria Fox como um foco cultural de resistência e afirma que defendê-la é também defender a cultura. “A Fox é a livraria que vende livros de autores paraenses. Um local agradável para encontrar amigos. E vende também livros de todos os gêneros”, destaca.
A Fox é onde ocorre todos os anos a Feira Literária do Pará (FliPA), tendo sido organizada pela primeira vez em 2014. Segundo o escritor e editor Filipe Larêdo, a feira é um ponto de encontro de diversos escritores, editores e influenciadores paraenses. “Pessoas que gostam de literatura comparecem à Fox para falar com os autores, conhecer os editores, trocar uma ideia. Porém, a pandemia prejudicou todos os eventos e naturalmente a FliPA não pôde ser continuada”, explica.
Filipe conhece a livraria desde quando ainda era criança. Ele relata que sempre teve o costume de visitar a livraria e que sempre foi encantado com a curadoria da Deborah Miranda. “Tem uma seleção de livros muito bons. Lá é um dos poucos lugares em que se consegue comprar livros de autores paraenses”, conta.
O escritor comenta sobre a importância da Fox e afirma que ela, assim como outras livrarias, tem um papel fundamental na disposição de livros. “Quando a livraria é física, em especial a Fox, quando é uma livraria de rua, você tem um ambiente voltado para aquele usufruto e isso faz com que a pessoa se sinta acolhida pela literatura, rodeada de livros selecionados pelo livreiro”, diz.
Filipe também aborda a necessidade de as pessoas irem às livrarias que existem na cidade, prestigiarem a literatura e o mercado local. Além disso, afirma que Belém ficará órfã de livrarias de rua caso a Fox deixe de existir. “Acho fundamental que as pessoas estejam se reunindo para salvar uma livraria. Espero que ela consiga se recuperar utilizando os mecanismos que as redes sociais têm a sua disposição”, acrescenta.
O escritor Franciorlys Viana também aderiu à campanha. “A Fox acolheu minha literatura, sem reservas, desde o primeiro livro. 'Fantasilhoso', por sinal, se esgotou por lá. Tenho 'Ojos', salvo engano. Como não citar a FliPA? Uma feira que surgiu como contraposto à prima rica, a Pan-Amazônica. E no seu processo de amadurecimento, fortaleceu bastante os laços (quase sempre frágeis) entre leitores, leituras e outras dores”, conta.
A jornalista Dedé Mesquita também se posiciona em defesa da Fox e descreve a livraria como um ponto de livros, leituras e encontros que ultrapassa a simples área do comércio. “É um 'Café Central' moderno. Por lá, gerações como a minha, as anteriores, os jovens escritores, passam, se cruzam, criam, dialogam, fervem de transformações e cultura”, diz.
Dedé também afirma que a considera não somente uma livraria, mas um espaço de militância pela literatura produzida em nossa terra. Frequentadora desde a inauguração da Livraria Fox – quando ela ainda era locadora de filmes –, a jornalista tem uma relação próxima e de muito carinho com o lugar. “Eu tenho um amigo – que hoje é um dos sócios da Fox –, ele passou em casa e disse: ‘olha tem uma inauguração da locadora da minha prima, bora lá?’ E eu fui na inauguração da Fox. Então, a relação que eu tenho com a Fox é muito próxima. Sempre gostei muito de cinema e tem uma locadora que sempre primou pela qualidade que eles tinham de filmes. Sempre foi uma coisa muito importante para mim”, conta.
Dedé Mesquita relata que chegou a trabalhar na Fox. “Eu trabalhei na Fox entre 1992 e 93. Tem muita gente que me conhece dessa época porque eu era a atendente. Eu recebia as pessoas para indicar filmes e também fazia inscrição e conversava com as pessoas” revela.
Ela também tem boas lembranças e amigos que fez na Livraria Fox. “A gente acaba se apegando com as coisas que a gente viveu, são lembranças, são amigos que a gente fez lá. Tenho amigos que eu fiz na Fox e são meus amigos até hoje, isso é uma coisa muito bacana”, afirma Dedé.
Para Dedé, a livraria é importante pelo apoio à cultura e aos autores locais. “A Fox é a cara de Belém. A Fox é a livraria, atualmente, que mais tem livros de obras paraenses, tem uma feira literária só de livros paraenses. Qualquer pessoa que tiver seu livro pode negociar com a Fox, fazer lançamento do livro e ela não cobra nada por isso”, diz. “Por tudo o que a Fox representa, faço coro ao apelo do Edyr Augusto: A FOX NÃO PODE PARAR”, conclui.
Por Carolina Albuquerque e Isabella Cordeiro.
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