Tópicos | educação domiciliar

Suellen e Lucas Alencar optaram pelo ensino domiciliar há cinco anos. Foto: cortesia

Desde 2017, Suellen Alencar, de 29 anos, é responsável pela educação dos filhos. Mãe de quatro crianças, a mais velha tem 6 anos e o caçula está com um mês, ela vê no homeschooling, ou ensino domiciliar, um meio de proporcionar educação individualizada e abordar conteúdos que ultrapassam os muros da escola.

##RECOMENDA##

“Temos a oportunidade de ensinar [com o homeschooling] não apenas com lápis e papel, mas com a vida cotidiana. Executar uma receita de bolo pode ser uma aula. Além de nos divertimos, podemos aprender também sobre matemática por exemplo. Além disso, o homeschooling proporciona um tempo mais presente na vida dos nossos filhos, que para nós é de grande valor”, explica ao LeiaJá.

À reportagem, Suellen, que é do lar e tem formação superior em administração, conta que as crianças possuem uma rotina desde o acordar ao dormir. As aulas domiciliares são no turno da manhã e duram entre 1h30 e 2 horas de estudos. Já as tardes são dedicadas a passeios ao ar livre. Todo o planejamento das atividades educacionais é realizado pela própria Suellen.

“Todo fim do ano verifico a grade curricular da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que é a grade usada pelas escolas e também o currículo de educação clássica, que se encontra no livro ‘A mente bem treinada’. A construção é feita levando os dois em consideração. Pode parecer muito trabalho, mas faço com muito prazer!”, ressalta.

Suellen Alencar com os quatro filhos. Foto: cortesia

Nenhum dos filhos chegou a frequentar a escola e Suellen garante que ela e o marido, Lucas Alencar, de 31 anos, nunca foram alvos de críticas por parte da família ou amigos por isso. “Nunca sofremos nenhuma crítica a respeito por pessoas que nos conhecem e convivem conosco, muito pelo contrário, a maioria das pessoas ficam curiosas e encantadas ao ver como educamos nossos filhos”, conta.

Mas pondera: “Claro, que para quem não nos conhece, tem sempre os questionamentos. Lidamos com calma, entendendo que muitas dessas críticas são porque essas pessoas nunca conheceram uma família educadora e normalmente o desconhecido causa estranheza”. Outro fato que a dona de casa assegura é sobre a questão da interação e socialização não ser comprometida pela ausência no ambiente escolar.

“A socialização não é formada apenas pela escola, tendo em vista que a mesma surgiu há menos de 500 anos (...) entendemos a socialização como algo importante para o desenvolvimento dos nossos filhos e proporcionamos esses momentos, seja com encontros com outras famílias educadoras, atividades extracurriculares (natação, futsal, por exemplo), passeios diários ao parque, quando visitamos os avós, os primos. Quando não diminuímos a socialização de uma criança a quatro paredes de uma sala de aula, entendemos então que tudo pode ser uma oportunidade”, argumenta.

Nova rotina

Há quatro meses, Hannah, de 11 anos, trocou a escola tradicional pelo homeschooling. A escolha dos pais Everton Antônio da Silva e Adriana de Jesus Rocha pela educação domiciliar foi bem aceita pela menina, caso contrário, de acordo com Everton, ela continuaria a frequentar o colégio.

“A Hannah opina. Se ela falasse que queria continuar na escola, ela continuaria. Nós mostramos a ela, porque, a meu ver, o mais importante da escola é o ensino de base, alfabetização, a escola contribui mais é nessa parte. Depois dessa parte, formação da personalidade, do caráter, questão de gosto, ideologia, conhecimento, eu acredito que seja no seio familiar”, frisa Everton.

Hannah (no centro) começou no ensino domiciliar em fevereiro deste ano. Foto: cortesia

Ele afirma que a nova dinâmica de ensino não causou estranhamento e não precisou de grandes adaptações. Até o final de 2021, Hannah frequentava a escola tradicional, mas de forma remota devido à pandemia da Covid-19 no Brasil. “Ela dá continuidade aos estudos, só que em casa. Ela está na 6ª série. Então, a gente usa o material que seria usado na escola, a mesma coisa. Realizamos o acompanhamento, consultamos um site para aplicarmos as matérias, tem um professor nele. No final, lembra uma escola on-line", observa.

Homeschooling: que educação é essa?

Em entrevista ao LeiaJá, Rafaela Celestino, professora do Departamento Fundamento Sócio-filosófico do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e doutora em Educação, explicou que o homeschooling ou educação domiciliar surgiu na década de 1960 por meio do professor norte-americano John Hack, da Universidade de Harvard. De forma geral, a prática "defende, basicamente, a desescolarização e o direito a um ensino em casa", explicou.

À reportagem, a docente aponta que o ensino doméstico se difere do oferecido em instituições de ensino regular em vários aspectos. "Ele [ensino domiciliar] não tem a sistematização regular dos conteúdos, não precisa de um profissional habilitado para tal função, tendo em vista que são os pais que vão ter o direito de educar em casa os seus filhos" pontua. 

 Rafaela Celestino salienta que a prática vai de encontro ao que prevê o artigo 59, da Contituição Federal. O texto defende a obrigatoriedade da oferta de Educação Básica e gratuita para todo e qualquer cidadão. Além disso, ela reforça as lutas pela ampliação do acesso à Educação. "A gente pensa no histórico da Educação brasileira, a gente vê que já foi uma luta ampliar a educação escolar para a maioria. Então, [o homeschooling] soa como uma espécie de retrocesso", diz.

E complementa: "Embora o argumento do custo-benefício seja muito maior em relação à escola regular, o espaço formal de ensino, a gente sabe que quem tem estrutura para oferecer esse tipo de educação é a elite. Não é todo brasileiro. Na realidade brasileira, as crianças ainda vão para a escola até para ter direito a uma merenda".

Regulamentação 

No dia 18 de maio, a Câmara dos Deputados aprovou o texto-base que regulariza a prática de homeschooling. A proposta, que será encaminhada ao Senado Federal, determina que as atividades pedagógicas sejam periodicamente registradas pelos pais ou responsáveis. Os estudantes, pelo texto da proposta, devem estar matriculados em instituição de ensino credenciadas, que devem acompanhar a frequência nas atividades. O texto também ressalta que os alunos serão avaliados, anualmente, pelo Ministério da Educação (MEC) sobre conteúdos apontados na BNCC. 

Para Suellen Alencar a regulamentação da prática assegura o direito a família se responsabilizar pela educação dos filhos. "A regulamentação representa apenas uma segurança para as famílias que praticam homeschooling poder continuar executando esse trabalho livremente. Acredito que o homeschooling não é para todos os pais, e a escola é muito bem vinda como esse apoio. Promover a regularidade pode dar segurança a aqueles pais que por muito tempo desejam praticar o homeschooling, e não o fazem pelo medo", expõe. 

Everton da Silva classifica a possível regulamentação como uma vitória para as novas gerações e deve despertar a atenção de mais pessoas para a prática. "A modalidade fora do Brasil já é uma realidade. Eu acredito que é uma conquista muito importante e as pessoas vão poder se aprofundar na questão, analisar melhor". 

Já a professora da UFPE argumenta que a regulamentação traz desvantagens. "Vai faltar aquele espaço que é primordial para as crianças, que é o espaço de socialização, as dinâmicas e as interações. Ela [escola] é um espaço de preparação para o mundo público, ela nem é a casa da criança nem o espaço propriamente público. A escola reflete as relações sociais e ela é um espaço social importantíssimo", expõe.

Na última semana, o estado de São Paulo, por meio do Conselho Estadual de Educação, criou novas regras para a prática de educação domiciliar, também conhecida como  homeschooling. Em caso de aprovação pela Câmara dos Deputados, os estudantes que recebem aula em casa, por meio da família, vão precisar de matrícula na rede estadual ou municipal, passar por avaliações na escola com frequência e ter aula com um profissional da educação.

Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o homeschooling não é uma prática condizente com a constituição e que precisaria de regulamentação no Legislativo. Mesmo com a orientação, mais de 11 mil famílias se responsabilizaram pela educação de crianças e adolescentes, sem interferência do sistema de ensino público ou privado, de acordo com dados da Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned).

##RECOMENDA##

O projeto de lei 3179/12, que autoriza a educação domiciliar, estava parado desde 2019. O governo federal pressiona a Câmara para que a aprovação seja feita ainda neste semestre. Em resposta, o Conselho Estadual de Educação de São Paulo estipulou as restrições, caso entre em vigor.

Já na Câmara, a deputada Luísa Canziani (PTB/PR) está à frente do projeto e vai levar a pauta em audiências públicas com o Conselho Nacional de Educação (CNE), o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). Segundo a deputada, algumas normas de funcionamento serão estabelecidas para ter um maior controle do que está sendo feito nos lares.

O texto que será levado ao Plenário apresenta determinações, como a exigência do responsável pelo ensino da criança ter graduação, os alunos estarem vinculados a uma instituição de ensino para monitoramento das atividades, o uso de conteúdos que sigam a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), além das avaliações bimestrais ou anuais, que devem ocorrer com frequência.

Por Thaiza Mikaella

O Ministério da Educação (MEC) quer ampliar os debates acerca da educação domiciliar antes de definir um marco regulatório. Segundo a coordenadora-geral do Ensino Fundamental da Secretaria de Educação Básica do MEC, Aricélia do Nascimento, esta é uma pauta que não deverá sair do papel no curto prazo. "Estamos nos organizando para que possamos ampliar em grupos de trabalho essa discussão para aí sim elaborar um planejamento para o médio e longo prazo. Não estamos colocando essa pauta em curtíssimo prazo", diz.

A preocupação da pasta é que as crianças e adolescentes tenham assegurado o direito à aprendizagem e que o ensino siga o que está estabelecido na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento que estipula o mínimo a ser ensinado na educação básica, que vai do ensino infantil ao ensino médio. A BNCC ainda está em fase de implementação no país.

##RECOMENDA##

Segundo Aricélia, apesar de discutir o ensino domiciliar, o MEC não deixa de lado a pauta de acesso à uma educação de qualidade. "Em nenhum momento a educação domiciliar substitui a instituição escola. Entendemos que o Brasil pode e tem ambições de neste momento ampliar o debate para que a sociedade possa ter possibilidade a mais para aqueles que entendam que essa possibilidade possa assegurar o direito subjetivo das crianças, adolescentes e jovens de terem garantido o direito ao ensino".

O Brasil ainda não cumpriu a meta de universalizar a educação básica. Por lei, pelo Plano Nacional de Educação (PNE), até 2016, o país teria que universalizar a pré-escola e o ensino médio. Ainda há cerca de 1,9 milhão de crianças e jovens fora da escola.

A coordenadora-geral participou hoje (30) de seminário de educação domiciliar na Câmara dos Deputados. Na casa, tramita o Projeto de Lei 2401/19 regulamenta a educação domiciliar no país.  Pelo projeto cabe ao MEC registrar as famílias e aplicar uma avaliação aos estudantes cujos responsáveis optarem por essa opção.

A secretária nacional da Família do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, Ângela Gandra, defendeu a educação domiciliar: "Nosso ministério vem apoiar não uma vertente educativa, mas a liberdade e a responsabilidade dos pais com relação à educação. Sendo fundamento à liberdade, tivemos a preocupação em garantir o direito e viabilizá-lo sem sufocá-lo através da oportuna regulação. Por outro lado, queremos acompanhar a oportuna flexibilidiade para que as crianças que sejam educadas dessa forma sejam efetivamente bem educadas".

A pasta defende como pontos fundamentais do Projeto de Lei a garantia de que cabe aos pais escolher o gênero de educação que dará aos filhos, a existência de uma base cadastral das famílias que optarem pela educação domiciliar e a avaliação da aprendizagem desses estudantes.

Para a coordenadora do Comitê DF da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Catarina de Almeida Santos, a educação não deve ser tarefa exclusiva da família. "A educação é direito de todos, dever do estado e da família. Isso significa que as famílas não estão excluídas. Na verdade, têm papel fundamental. O processo formativo fica mais rico quando tem a participacação da família, mas isso não prescinde da participação do Estado", diz.

Representante do Movimento Interfórum de Educação Infantil do Brasil, Maria Aparecida Martins defende que é dever constitucional do Estado garantir a educação básica gratuita para brasileiros de 4 aos 17 anos de idade, inclusive para quem não tiver acesso na idade adequada. Pela legislação, é dever dos pais matricular seus filhos na rede de ensino. Para ela, a proposta desobriga o Estado e os pais desses deveres.

Segundo Maria Aparecida, é importante que a criança vivencie experiências para além do ambiente familiar. “A convivência com seus pares e com a diversidade é de fundamental importância para o desenvolvimento da criança”, disse. Ela questionou ainda se os órgãos do Estado brasileiro estariam preparados para acompanhar e fiscalizar a aprendizagem em casa.

Defensor do ensino domiciliar, o presidente da Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned), Rick Dias, defendeu que o debate não se trata de família versus escola, mas de um "trabalho de solidariedade" entre ambos. De acordo com ele, é preciso olhar para a realidade, independente do que se gosta ou não. No Brasil, de acordo com a Aned, em 2018, 7,5 mil famílias praticavam a educação domiciliar. "Essas famílias estão em um limbo jurídico".

Segundo Dias, a educação domiciliar é permitida em 65 países. Ele ressaltou que o Brasil ocupa a 58ª posição no ranking internacional de liberdade educacional em ranking da organização sem fins lucrativos Oidel, com sede em Genebra, na Suíça.

O Ministério da Educação (MEC) quer ampliar os debates acerca da educação domiciliar antes de definir um marco regulatório. Segundo a coordenadora-geral do Ensino Fundamental da Secretaria de Educação Básica do MEC, Aricélia do Nascimento, esta é uma pauta que não deverá sair do papel no curto prazo. "Estamos nos organizando para que possamos ampliar em grupos de trabalho essa discussão para aí sim elaborar um planejamento para o médio e longo prazo. Não estamos colocando essa pauta em curtíssimo prazo", diz.

A preocupação da pasta é que as crianças e adolescentes tenham assegurado o direito à aprendizagem e que o ensino siga o que está estabelecido na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento que estipula o mínimo a ser ensinado na educação básica, que vai do ensino infantil ao ensino médio. A BNCC ainda está em fase de implementação no país.

##RECOMENDA##

Segundo Aricélia, apesar de discutir o ensino domiciliar, o MEC não deixa de lado a pauta de acesso à uma educação de qualidade. "Em nenhum momento a educação domiciliar substitui a instituição escola. Entendemos que o Brasil pode e tem ambições de neste momento ampliar o debate para que a sociedade possa ter possibilidade a mais para aqueles que entendam que essa possibilidade possa assegurar o direito subjetivo das crianças, adolescentes e jovens de terem garantido o direito ao ensino".

O Brasil ainda não cumpriu a meta de universalizar a educação básica. Por lei, pelo Plano Nacional de Educação (PNE), até 2016, o país teria que universalizar a pré-escola e o ensino médio. Ainda há cerca de 1,9 milhão de crianças e jovens fora da escola.

A coordenadora-geral participou hoje (30) de seminário de educação domiciliar na Câmara dos Deputados. Na casa, tramita o Projeto de Lei 2401/19 regulamenta a educação domiciliar no país.  Pelo projeto cabe ao MEC registrar as famílias e aplicar uma avaliação aos estudantes cujos responsáveis optarem por essa opção.

A secretária nacional da Família do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, Ângela Gandra, defendeu a educação domiciliar: "Nosso ministério vem apoiar não uma vertente educativa, mas a liberdade e a responsabilidade dos pais com relação à educação. Sendo fundamento à liberdade, tivemos a preocupação em garantir o direito e viabilizá-lo sem sufocá-lo através da oportuna regulação. Por outro lado, queremos acompanhar a oportuna flexibilidiade para que as crianças que sejam educadas dessa forma sejam efetivamente bem educadas".

A pasta defende como pontos fundamentais do Projeto de Lei a garantia de que cabe aos pais escolher o gênero de educação que dará aos filhos, a existência de uma base cadastral das famílias que optarem pela educação domiciliar e a avaliação da aprendizagem desses estudantes.

Para a coordenadora do Comitê DF da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Catarina de Almeida Santos, a educação não deve ser tarefa exclusiva da família. "A educação é direito de todos, dever do estado e da família. Isso significa que as famílas não estão excluídas. Na verdade, têm papel fundamental. O processo formativo fica mais rico quando tem a participacação da família, mas isso não prescinde da participação do Estado", diz.

Representante do Movimento Interfórum de Educação Infantil do Brasil, Maria Aparecida Martins defende que é dever constitucional do Estado garantir a educação básica gratuita para brasileiros de 4 aos 17 anos de idade, inclusive para quem não tiver acesso na idade adequada. Pela legislação, é dever dos pais matricular seus filhos na rede de ensino. Para ela, a proposta desobriga o Estado e os pais desses deveres.

Segundo Maria Aparecida, é importante que a criança vivencie experiências para além do ambiente familiar. “A convivência com seus pares e com a diversidade é de fundamental importância para o desenvolvimento da criança”, disse. Ela questionou ainda se os órgãos do Estado brasileiro estariam preparados para acompanhar e fiscalizar a aprendizagem em casa.

Defensor do ensino domiciliar, o presidente da Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned), Rick Dias, defendeu que o debate não se trata de família versus escola, mas de um "trabalho de solidariedade" entre ambos. De acordo com ele, é preciso olhar para a realidade, independente do que se gosta ou não. No Brasil, de acordo com a Aned, em 2018, 7,5 mil famílias praticavam a educação domiciliar. "Essas famílias estão em um limbo jurídico".

Segundo Dias, a educação domiciliar é permitida em 65 países. Ele ressaltou que o Brasil ocupa a 58ª posição no ranking internacional de liberdade educacional em ranking da organização sem fins lucrativos Oidel, com sede em Genebra, na Suíça.

O ensino domiciliar ou homescholling entrou na pauta do governo, através da Associação Nacional de Educação Domiciliar (ANED), que solicitou a regulamentação desta modalidade de ensino.

 De acordo com a Pedagoga e coordenadora do curso de Pedagogia da Universidade UNIVERITAS/UNG, Vanessa Angélica Patrício, o projeto de lei para regulamentar a educação domiciliar, cuja proposta ainda precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional, tem sido alvo de muitas polêmicas e debates entre os especialistas das áreas. “Essa medida, se regulamentada, precisará de meios para garantir que a educação seja de qualidade e, consequentemente, que a criança esteja realmente estudando”, explica.

##RECOMENDA##

 A pedagoga sinaliza que a escola, como lugar de compartilhamento de conhecimentos, conteúdos e relações cotidianas, traz diversos benefícios, que somente acontecem no âmbito escolar. “É na escola que temos uma equipe formada por profissionais da área da educação, que organiza todo seu funcionamento. A educação como dever do estado e da família aponta a necessidade de uma discussão voltada para o processo de aprendizagem das crianças. As práticas pedagógicas precisam favorecer o desenvolvimento integral, propiciando um ambiente prazeroso e enriquecedor para que possa se aprender em condições de superar suas dificuldades e vencer desafios”, destaca.

 Os profissionais da área da educação precisam ter uma formação apropriada para atender as necessidades das crianças em cada faixa etária, sobretudo, pensar na formação dos pais para atuarem e contribuir para um processo de aprendizagem. "O processo educativo é de extremo valor para a sociedade, por isso, requer profissionais capacitados, além de analisar e refletir sobre as metodologias utilizadas, buscando um trabalho mais integrado e meios que possibilitem a educação de qualidade", explica a professora.

 Muitas pesquisas têm demonstrado o quanto à interação influencia no desenvolvimento da criança. Há a necessidade de conviver com os outros em diversas situações de seu dia a dia e não poderia ser diferente nas relações escolares. "A escola, como um espaço marcado pelo encontro de diferentes culturas, crenças e valores, é rica em troca de conhecimento entre os sujeitos envolvidos e traz diversos benefícios que vão muito além da discussão atual. Portanto, a lei que deverá garantir o direito da família de educar em casa, também, precisará prever um acompanhamento rigoroso para assegurar o direito da criança em receber uma boa educação, sem consequências negativas e que não seja prejudicada. Caberá, neste caso, um monitoramento de forma permanente aos aspectos didáticos e pedagógicos da educação", conclui.

*Da assessoria de imprensa

O presidente Jair Bolsonaro assinou nessa quinta-feira (11) projeto de lei que regula a educação domiciliar de crianças e adolescentes, prática conhecida como homeschooling. Segundo o Palácio do Planalto, o texto traz os requisitos mínimos que os pais ou responsáveis legais deverão cumprir para exercer essa opção, tais como o cadastro em plataforma a ser oferecida pelo Ministério da Educação (MEC) e a possibilidade de avaliação.

A proposta fez parte dos instrumentos assinados em uma cerimônia no Palácio do Planalto que marcou a passagem dos 100 dias de governo.

##RECOMENDA##

A princípio, o governo havia planejado editar medida provisória (MP) sobre a educação domiciliar, segundo informou  a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves.

Em entrevista coletiva nesta quarta-feira, o chefe da Casa Civil da Presidência da República, ministro Onyx Lorenzoni, disse que o governo resolveu enviar projeto de lei ao Congresso Nacional por entender que sua tramitação trará mais segurança para a família que quiser adotar essa modalidade de ensino.

Para virar lei, a medida provisória precisa ser aprovada pelo Congresso em até 120 dias. Caso contrário, perderá a validade. “E se ela [MP] caduca, e se cai por decurso de prazo? E as famílias que optaram por esse método? E as crianças, vão ficar sem salvaguarda? Vão perder aquele ano escolar? Então foi uma medida de proteção às crianças”, disse Onyx.

Homeschooling

No ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) não reconheceu o ensino domiciliar de crianças. Para a Corte, a Constituição prevê apenas o modelo de ensino público ou privado, cuja matrícula é obrigatória, e não há lei que autorize a medida. Segundo a fundamentação adotada pela maioria dos ministros do STF, o pedido formulado no recurso, que discutia a possibilidade de o ensino domiciliar ser considerado lícito, não pode ser acolhido, uma vez que não há legislação que regulamente preceitos e regras aplicáveis a essa modalidade de ensino.

O ano de 2019 começou com diversas mudanças no país, após a posse do presidente Jair Bolsonaro. Há a promessa de um novo governo, com reformas e reformulações que estão sendo ou já foram realizadas no Brasil. Uma delas é na perspectiva da educação. Segue sob preparação o texto que pretende regulamentar e legalizar a educação domiciliar no país.

Uma prática não muito difundida no Brasil, mas já adotada em outros países, como os Estados Unidos, a educação domiciliar, ou homeschooling, é a ação de ensinar conteúdos vistos em sala de aula no âmbito familiar. Em terras brasileiras, o governo estima um total de 31 mil famílias praticando o homeschooling. Um número bem mais enxuto foi divulgado pela Associação Nacional de Educação Familiar (Aned): 7,5 mil famílias educam os filhos em casa.

##RECOMENDA##

E é sob uma ótica majoritariamente religiosa que a Medida Provisória (MP) é preparada pelo governo. Criado pela gestão do presidente Jair Bolsonaro, é no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, comandado pela ministra Damares Alves, em que o projeto é tocado, saindo do seio do Ministério da Educação (MEC).

Segundo o texto em elaboração pelo diretor da Aned, Alexandre Magno Moreira, que tem cargo na pasta da ministra Damares Alves, o homeschooling poderá ser praticado do ensino infantil ao ensino médio. Além disso, também haverá um registro oficial das famílias praticantes do tipo de ensino. Ainda será pautada a aplicação de provas com o intuito de avaliar as condições de aprendizado das crianças submetidas a essa prática. O LeiaJá entrou em contato com o Aned, mas não obteve resposta.

Judicialmente, uma medida provisória só deve ser aplicada em caráter de urgência. A justificativa para que ela pudesse ser fincada foi a de que as famílias praticantes do homeschooling foram “postas na ilegalidade” pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2018, o STF cravou que a educação domiciliar só poderia ser realizada no Brasil quando houver normas com regras definidas.

Dentro de casa

O empresário Inácio Barreto* pratica educação doméstica com os filhos Ana* e Caio Barreto*, de dez e seis anos, respectivamente, desde 2017. A família de Barreto é composta por ele, os dois filhos e a esposa, Joana Barreto*. Inácio tem um e-commerce e trabalha home office. Já Joana resolveu não trabalhar para poder estar em casa e cuidar dos filhos, assim que nasceram. “Não é regra, é possível que tenha diferente, mas 99% das famílias que praticam homeschooling, são compostas por um casal de homem e mulher”, salienta Inácio.

O homem tomou conhecimento da prática do ensino doméstico entre os anos de 2015 e 2016, e decidiu inserir os filhos. “O motivo da minha escolha é para dar um suporte melhor, uma educação individualizada tem a tendência de ter um resultado superior. As escolas massificam e muitas crianças não aprendem o que deveriam aprender”, explica Inácio Barreto

Segundo o empresário, antes do homeschooling, as crianças estudavam regularmente em escolas tradicionais do Recife. “Quando eles saíram, minha filha sentiu mais do que meu filho. Como ele é muito pequenininho, não fez diferença. Ela ficou meio ‘assim’, mas se adaptou fácil”, revela o homem. Ele ainda fez uma crítica ao sistema educacional brasileiro. “O homeschooling é uma alternativa a essa educação que não cumpre o seu papel de formar cidadãos para a vida e profissionais para o mercado de trabalho”, pontua o empresário.

O segredo para que Ana e Caio tenham responsabilidade com os estudos está na rotina e na disciplina, segundo Inácio. As crianças têm aulas, dadas pelos pais, de segunda a sexta-feira, na parte da manhã, com duração de 1h30. À tarde, elas fazem uma espécie de “reforço” do que foi aprendido no contraturno, de 30 minutos. “O tempo vai depender de criança para criança. Na escola, esse tempo é maior porque o ensino é massificado. Com o trabalho individualizado, o resultado chega em 20 minutos”, diz.

Os conteúdos que os pequenos estudam, por sua vez, não são exatamente iguais aos que crianças da mesma faixa etária veem na escola. “O que uma criança precisa é do básico, português e matemática. Se meu filho tiver o domínio do português, souber matemática, conhecer uma outra língua e ter a preocupação com a sociedade, e respeite o indivíduo… tem maior socialização que esta?”, indaga o empresário Inácio Barreto. Ele salienta, ainda, que assuntos mais complexos devem ser dado às crianças conforme suas habilidades. "Se meu filho tem dom para música, minha filha tem para a área de Exatas, eu vou explorar isso, me aprofundar nisso, pode ser até mesmo contratando um professor para dar aula para eles de assuntos que não domino”, diz.

Pedagogos e especialistas criticam a educação domiciliar com o argumento de que o aprendizado não é realizado somente dentro do ambiente de sala de aula, como também no convívio em sociedade. Como defensor do homeschooling, Inácio rebate essa argumentação, afirmando que existem outras diversas formas de socializar. “Eles não estão preocupados com a socialização das crianças. Quando eu digo que meu filho faz natação duas vezes por semana, minha filha faz inglês, fazem karatê, eles vão à igreja aos domingos, e têm todo o tipo de outros momentos de socialização, não tem como dizer que a preocupação é isso”, opina.

Quando questionado pela reportagem do LeiaJá se colocará novamente os filhos na escola, Inácio é taxativo. “Não. A única visão de escola que eu posso pensar em colocar meus filhos novamente é aquela que abrirá para matérias isoladas. Por exemplo, só colocar minha filha para estudar química, física ou biologia”, revela.

Dentro da escola

Se por um lado existem os defensores do homeschooling, há quem seja totalmente contra a prática. Entre as pessoas que fazem oposição à proposta de MP realizada pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos está o professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Edson Francisco de Andrade. Segundo o docente, a única forma de o homeschooling ser positivo é se ele for uma ação complementar às práticas escolares. “Mas se for para substituir a escola, é o Estado se omitindo do seu dever e passando o papel para a família”, garante.

Especialista na legislação educacional, Andrade salienta que o Código Penal Brasileiro prevê crime em abandono escolar. O artigo 246 crava  que “deixar, sem justa causa, de prover a instrução primária de filho em idade escolar” garante pena de 15 dias a um ano de reclusão ou multa para os genitores.

O professor ainda aponta que a família assumir o papel de educar é a inversão da isonomia do direito à educação. “Ou seja, a universalização do direito à educação não vai valer. Cada família vai fazer como lhe couber. A educação brasileira teve toda uma produção de diretrizes curriculares. Produzimos essas diretrizes nacionais com base nos direitos humanos”, explica Edson Francisco de Andrade.

O impacto da regulamentação dessa medida para o docente é a não garantia do direito à educação, segundo o professor. “A criança tem direito ao saber historicamente produzido. Como a família poderá garantir que ela vai ter acesso a isso?”, questiona o professor. A participação da família, para ele, é de complementação e suporte à escola. "Na condição de que o homeschooling será uma negação à escola, como se ela fosse condenada e a única salvação fosse a educação promovida pela família, a medida é um grande retrocesso”, certifica o professor Edson.

Apesar das mudanças e da caminhada para a aprovação da MP, o Conselho Nacional da Educação (CNE) mantém o parecer indicado em 2010, “que considera a prática ilegal por não haver legislação sobre o tema". "Mesmo posicionamento confirmado em 2018 pelo STF”, considerou, em nota enviada à reportagem LeiaJá.

Após contato realizado pelo LeiaJá, a assessoria de imprensa do Ministério da Educação (MEC) limitou-se a reforçar a nota publicada em 15 de fevereiro. Confira o parecer da pasta, na íntegra, abaixo:

“O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, por meio da Secretaria Nacional da Família, em conjunto com o Ministério da Educação, informa que o texto da Medida Provisória (MP) que trata da educação domiciliar está em fase de elaboração. Tendo em consideração a densidade e a relevância do tema, é fundamental prosseguir com o diálogo para garantir que a MP possua efetividade e amplitude, e que respeite o equilíbrio harmônico entre os poderes da República.”

*Nome fictício

LeiaJá também

-> 'Educação em casa não substitui a escola', diz MEC

A medida provisória (MP) que vai regulamentar o ensino domiciliar no país deve ser publicada até o dia 15 de fevereiro, segundo a assessoria de imprensa do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

No fim do mês passado, o governo federal já havia anunciado a conclusão de uma primeira versão do texto. Na oportunidade, a ministra titular dos Direitos Humanos, Damares Alves, afirmou entender que, embora o ensino domiciliar pertença ao campo da educação, "é uma demanda de família", devendo ser, portanto, uma proposta apresentada pelo ministério que comanda.

##RECOMENDA##

Por ter força de lei, a medida provisória tem seus efeitos válidos a partir do momento em que é editada, inicialmente por 60 dias. Esse prazo é automaticamente prorrogado por igual período quando a votação nas duas Casas do Congresso Nacional - Câmara dos Deputados e Senado Federal -, onde é convertida definitivamente em lei ordinária, não é concluída.

Prioridades

A regulamentação do homeschooling, como também é chamada a educação ministrada no lar, consta das 35 metas prioritárias dos 100 primeiros dias do governo Jair Bolsonaro e tem dividido opiniões. No ano passado, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu não reconhecer essa modalidade de ensino. Para a Corte, a Constituição prevê apenas o modelo de ensino público ou privado, cuja matrícula é obrigatória, e não há lei que autorize a medida.

Durante a discussão no STF, manifestaram-se contrárias ao homeschooling a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Procuradoria-Geral da República, esta argumentando que a modalidade "não encontra fundamento próprio na Constituição Federal".

Na semana passada, o secretário executivo do Ministério da Educação (MEC), Luiz Antônio Tozi, defendeu que a educação domiciliar deve complementar a educação formal e que matrículas nas escolas seguem obrigatórias.

“O homeschooling não substitui a escola, ele complementa a escola. Está na lei que [crianças e jovens de 4 a 17 anos] têm que vir para a escola.  Ele complementa o processo educacional, trazendo para perto da casa dele, para dentro de onde ele mora, a questão da educação, que é algo que tem que ser valorizado pela sociedade. Os pais têm que estar sabendo e devem estar participando da formação de seus filhos”, disse Tozi.

A demanda por regulamentação do ensino domiciliar foi levada ao governo pela Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned). O último levantamento da associação, de 2018, mostra que 7,5 mil famílias educam os filhos em casa - número que representa mais que o dobro das 3,2 mil famílias identificadas em 2016. A estimativa é que 15 mil crianças recebam educação domiciliar. A estimativa do governo é que 31 mil famílias são adeptas da modalidade.

Leianas redes sociaisAcompanhe-nos!

Facebook

Carregando