É sob tom de ironia e reuniões políticas esporádicas que a candidatura do apresentador paulista, Danilo Gentili, de 41 anos, para as eleições presidenciais de 2022 segue um mistério. Anfitrião do seu próprio talk show ‘The Noite Com Danilo Gentili’, que vai ao ar pelo SBT, o empresário tem as telinhas como principal vetor das suas opiniões, por muitas vezes polêmicas e é protagonista de episódios controversos e embates judiciais.
Desde 2020, o comediante, que sempre se identificou com a ala conservadora e liberal, tem mostrado interesses políticos além da participação como cidadão e, de repente, se tornou umas das possíveis apostas para o próximo pleito. Gentili passou de soldado da ‘tropa bolsonarista’ para crítico ao presidente e figura quase política tentando se aliar às figuras de um suposto centrão.
##RECOMENDA##Em 2019, o ‘humor ácido’, como o próprio âncora descreve o seu trabalho, ganhou ainda mais notoriedade nas redes sociais, após constantes falas em apoio ao presidente Jair Bolsonaro, à época recém-eleito e ainda membro do Partido Social Liberal. Gentili, como bom bolsonarista, conseguiu chamar a atenção do chefe do Executivo, que em maio do mesmo ano foi o primeiro presidente a ser entrevistado no The Noite. A conversa de quase uma hora rendeu diversos memes, repercussão positiva entre internautas da direita e reafirmou a pregação marcada pelo antipetismo e pelo “politicamente incorreto”, expressão também do humorista e título de um dos seus livros publicados.
No entanto, a simpatia entre os aliados se foi com a indicação do filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, ao posto de embaixador do Brasil em Washington, nos Estados Unidos. A sugestão rendeu uma escalada de críticas do apresentador, que passou a ser alvo do exército de Bolsonaro nas redes sociais e até mesmo resultou em uma troca de farpas entre Gentili e o filho 03.
O paulista exibiu ainda uma montagem de Eduardo com um boné em que se lia “make mamata great again” (“tornar a mamata grande de novo”), trocadilho com o slogan de campanha de Donald Trump, “make America great again”. Em julho de 2019, o humorista afirmou na TV que achava boa a iniciativa, porque seria um “Bolsonaro a menos para atrapalhar o governo”.
Após a virada no favoritismo, Danilo Gentili caminhou de um perfil de direita mais ácido para um liberalismo não somente na economia, como ele sempre se identificou, mas também nas suas opiniões, que largaram o conservadorismo infundado e que não caminha como as ideias da movimentação que ocorre no centro, ala que possivelmente o acolherá em breve. Em 2021, na corrida em busca de nomes que possam chegar com alguma força na disputa do próximo ano contra Lula e Bolsonaro, o apresentador surge ao lado de nomes como Sérgio Moro e Luciano Huck, novas tendências incertas do liberalismo.
Em entrevista recente ao Estadão, o empresário diz que políticos “temem” a sua candidatura e se mostra positivo com o clima de brincadeira e sarcasmo que o seu interesse nas presidenciais carrega. A manifestação aconteceu depois de uma pesquisa divulgada no início de abril pelos Institutos de Pesquisa e Estratégia (IPE) a pedido do Movimento Brasil Livre (MBL).
O apresentador aparece em terceiro lugar, com 4% das intenções de voto, atrás do presidente Jair Bolsonaro, Lula, e empatado com Luciano Huck, João Doria, Luiz Henrique Mandetta e Ciro Gomes.
"Quando faço as minhas piadas, os políticos me levam muito a sério, a ponto de eu colecionar pedidos de prisão e de censura vindos deles. Então, na real, eu acho que eles é que temem que a minha candidatura seja levada a sério e não o contrário", disse Gentili na entrevista mencionada, mas contrapõe e diz que ao entrar na política, ele quem “sairia perdendo”.
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No último dia 10 de abril, foi especulada uma reunião entre Sérgio Moro, Gentili e o MBL, para discutir as opções e planos dos candidatos da “terceira via”, que devem aliviar a polarização Lula vs. Bolsonaro. Danilo negou que estaria envolvido em encontros de cunho político e até ironizou o rumor, mas já se sabe nos bastidores que ele é uma das principais apostas do grupo liberalista e até mesmo chegou a se reunir com João Amôedo, do Novo.
Sérgio Moro, em sua coluna periódica na Crusoé, afirmou que Danilo Gentilli "teria seu voto", o que pode colaborar para reforçar o nome como um possível presidenciável. Os dois supostos aliados estão no mesmo radar dos possíveis presidenciáveis, que também traz o ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa (PSB) e a ex-ministra Marina Silva (Rede).
Em março, foi lançado o Manifesto pela Consciência Democrática, assinado por Ciro Gomes (PDT), Eduardo Leite (PSDB), João Amoêdo (Novo), João Doria (PSDB), Luiz Henrique Mandetta (DEM) e Luciano Huck (sem partido), mas o grupo tem agido mais individualmente do que em conjunto, o que tem possibilitado as discussões paralelas.
Apesar das negações e das constantes piadas entre seus seguidores, o fazer pouco das eleições não condiz com as reuniões recentes e, entre os liberais, a palavra é de que Gentili está mais animado do que Huck ou Moro. Para Renan Santos, coordenador do MBL, que defende uma aliança entre Amoedo e Gentili, a conversa "é muito séria". Por enquanto, o movimento liberal é o maior e único apoiador declarado de Gentili, a nível de tê-lo como primeira opção. É missão do grupo este ano encontrar a sua aliança para 2022.
"A gente está falando de dois caras que, se estiverem juntos, podem angariar 10% dos eleitores, segundo algumas pesquisas, e que não estão sendo considerados como alternativa. João Dória, outro dia, falou que Fernando Haddad era um amante do Brasil. É assim que se espera construir uma terceira via?", disse Santos, durante entrevista virtual em abril.
Resoluções para 2022
A expectativa é de que o Movimento Brasil Livre continue apostando em Danilo Gentili até 2022. A sigla conta o poder das redes sociais — Gentili tem 17 milhões de seguidores no Instagram e é um dos maiores influenciadores digitais do Brasil — para erguer uma leva de simpatizantes politicamente. Essa tática não é mais nova, já que a campanha de Jair Bolsonaro, até 2018, era levada no mesmo tom, até o atual presidente sair da posição de “meme” da direita e de um prestígio baixo em um partido de baixo clero, para ocupar a cadeira de chefe de Estado.
Caso a candidatura não decole, o tom de sarcasmo já está mais do que encaixado na narrativa do humorista e tudo poderá ser visto como uma piada em 2022. A verdade é que, além das suas piadas, Danilo Gentili não esteve em qualquer articulação política até então e a maior parte das pautas que defende, são defendidas via opinião particular. Pelo contrário, a política foi inserida no seu trabalho como pauta de humor e ainda não foi possível ver o apresentador falar seriamente de algum tópico que pode ser marco ou mesmo divisor de águas nas campanhas do ano que vem.
Há anos ele se mostra desinteressado nas pautas progressistas, logo, o mínimo que se espera é uma não aliança à qualquer figura da centro-esquerda — ou esquerda no geral — que tenha lutas como o feminismo, o antirracismo ou o movimento LGBTQ+ no centro da sua atuação.
Em seu histórico, o apresentador tem, na verdade, uma série de polêmicas envolvendo essas e outras minorias, já tendo até sido processado anteriormente por injúria, injúria racial, difamação e outros crimes. O caso mais recente tomou conhecimento do público em fevereiro deste ano, quando o artista foi processado pelo Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo por ter feito uma piada sobre masturbação com os profissionais da saúde.
A perspectiva clichê do que é o interesse de cada ala política, tendo a aversão de Gentili quanto ao progressismo no aspecto social, foi um dos motivos da sua popularidade ter aumentado tanto nos últimos anos. Nas redes, o seu mote é “desde 1979 estragando tudo e decepcionando pessoas”.
A última menção de Danilo Gentili à sua suposta candidatura veio na noite da última quinta-feira (29), em uma de suas redes sociais. Em tom irônico, ele escreveu “Sigo rumo à casa branca brasileira”, adicionando ao texto uma montagem sua com a faixa presidencial e a manchete “Grupo de presidenciáveis busca Joaquim Barbosa e Danilo Gentili para ampliar esforço por 3ª via” da Folha de São Paulo, publicada na quarta-feira (28).