Tópicos | Revolta da Vacina

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) voltou às redes sociais para protagonizar mais um episódio de negacionismo científico, desta vez, resgatando a 'Revolta da Vacina' como um exemplo de vacinação em massa ou “vacinação compulsória”, nas suas palavras, que teria dado errado. As declarações foram feitas nesta terça-feira (15) através da conta do Twitter do filho do presidente Jair Bolsonaro, que já havia feito as mesmas comparações anteriormente.

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“As vacinas da COVID não seguiram os protocolos normais e reações adversas têm ocorrido. Excluir da sociedade quem não se sujeitar a tomá-la é, além de precipitado, contra a liberdade. Mesmo que eu esteja tendente a me vacinar não posso obrigar outros a fazê-lo”, escreveu primeiramente o deputado, iniciando fio de informações no Twitter.

E continuou: “Não posso me responsabilizar por essas reações adversas, a vacinação tem que ser uma decisão de cada um. Além disso, a Revolta da Vacina no Rio de Janeiro no início do século XX já nos ensinou que obrigar uma vacinação não termina bem”.

A Revolta da Vacina, ocorrida em 1904 na cidade do Rio de Janeiro, foi um motim popular e negacionista, responsável por um surto de varíola que causou milhares de internações na capital carioca. As autoridades, à época sob gestão de Pereira Passos, precisaram coordenar uma corrida aos postos de vacinação para conter a doença e o número de mortos.

Por fim, o deputado insiste na decisão de cada um, sem levar em conta que até mesmo aqueles que tomaram a vacina podem transmitir o coronavírus: “Por fim, a vacina traz uma proteção individual. Ainda que outras pessoas não a tomem isso não interfere na imunização de quem tomou”, completou.

Essa foi pelo menos a segunda vez que o conservador negou a vacinação da população geral usando o exemplo da revolta no século passado. O revisionismo histórico do filho do chefe do Executivo também teve espaço na mesma rede social em setembro de 2020, quando Eduardo disse que o “não é o papai Estado que vai te impor decisões sobre sua vida (ao menos o Estado federal)”.

Os conflitos que deram início à Revolta da Vacina, no Rio de Janeiro, completam 116 anos nesta terça-feira (10). Em 1904, os brasileiros iam às ruas para protestar contra a obrigatoriedade da vacina anti-varíola, que foi instituída após o cientista Oswaldo Cruz (1872-1917) incentivar o Congresso Nacional com um projeto que tornaria o imunizante obrigatório para toda a população.

A lei recebeu aprovação em 31 de outubro de 1904 e foi instituída em 9 de novembro. Aqueles que não apresentassem o comprovante de que haviam sido imunizados, não conseguiam emprego, certidão de nascimento e matrícula em instituições. A obrigatoriedade revoltou a população, que temia a vacina por conter pústulas de vacas doentes. Algumas lendas diziam que o imunizante causava mutações em quem o tomava.

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O protesto popular virou uma guerra civil. Os conflitos resultaram em prisões, feridos e até mortos. Toda a situação obrigou o presidente da república da época, Rodrigues Alves (1848-1919), a remover a lei de obrigatoriedade da vacina. Quatro anos após a revolta, uma epidemia de varíola atingiu o Rio de Janeiro e obrigou a população a recorrer ao imunizante antes rejeitado.

Em 2020, ainda existem grupos ideológicos que demonstram resistências às vacinas e contestam a eficácia delas. Segundo o imunologista José Zimmermam, a vacina é considerada o melhor remédio, pois impede a evolução de qualquer tipo de doença. "Os pais que não vacinam filhos contribuem para que doenças já erradicadas, como o sarampo, reapareçam, como temos observado com diversos casos graves e até mesmo fatais", alerta.

Em meio à pandemia de Covid-19, o médico afirma que uma possível vacina garante a imunização de rebanho, e quanto mais pessoas aderirem ao imunizante, maior será a proteção da população. O especialista acredita que, embora a imunização seja o melhor caminho, a obrigatoriedade pode não ser a prática mais eficaz. "Seria melhor fazer uma campanha ampla de vacinação e enfatizar que se vacinar é pensar nos outros", sugere Zimmermam.

A pandemia e o isolamento social, que ocorrem desde março no Brasil, deixaram muitas pessoas ansiosas pela imunização. Segundo Zimmermam, é necessário tomar alguns cuidados com as primeiras remessas de vacinas. "Elas diferem quanto ao seu mecanismo de ação: vírus inativado, proteína Spike do coronavírus e RNA mensageiro. As primeiras vacinas serão as menos elaboradas. O ideal é aguardar de um a três meses para verificar a proteção e os efeitos colaterais", recomenda o médico.

A atual politização de questões relativas a uma vacinação obrigatória contra o coronavírus, assim como a disseminação de informações falsas sobre efeitos colaterais da imunização encontram paralelo num dos mais notórios episódios de saúde pública da história do Brasil: a Revolta da Vacina de 1904.

Naquele início de século 20, a politização do tema foi um dos combustíveis para violentas manifestações contra a vacinação obrigatória e contra o governo na cidade do Rio Janeiro, então capital do País. O motim, que durou seis dias, levou à decretação de estado de sítio na cidade e só cessou após a revogação da obrigatoriedade da vacina. Trinta mortos, 110 feridos e mais de 1.500 presos e deportados constam nos números oficiais sobre a rebelião.

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A revolta, que teve como estopim as discussões sobre a lei que tornou obrigatória a vacinação contra a varíola, surgiu de uma combinação de fatores que desencadearam um enorme descontentamento popular - e tem, no seu cerne, uma orquestrada campanha de desinformação mobilizada por opositores do governo do então presidente Rodrigues Alves e do médico responsável pela ação de imunização, o sanitarista Oswaldo Cruz, então secretário da Saúde Pública. Este último, alvo favorito das charges dos opositores.

Na guerra política contra a vacinação, a oposição veiculou uma série de inverdades sobre a vacina. Afirmava que ela causava diferentes males à saúde, entre eles gangrena, epilepsia, meningite, tuberculose e sífilis. As falsas histórias trouxeram à circulação uma absurda teoria segundo a qual quem tomasse a vacina poderia assumir características de um bovino - crescimento de um chifre, casco ou pelagem do animal. A história se devia a que, nos primórdios da criação da vacina, havia um processo de inoculação da benigna varíola bovina.

Opositores

Médicos e políticos, que no passado haviam endossado outras campanhas de vacinação, engrossaram as fileiras que investiam contra a vacina. O senador Barata Ribeiro e o deputado Barbosa Lima eram exemplos do jogo político nos bastidores dessa disputa. O Estadão de 28 de setembro de 1904 publicou aguerrido discurso de Barata Ribeiro no Senado contra a vacinação: "Ao que parece, o governo tem o propósito de alimentar a epidemia desprezando a prophylaxia afim de obrigar o povo a estender o braço à lanceta homicida. Queria que o sr. Rodrigues Alves saísse da mudez de seu palácio e viesse para o meio da população. Elle coraria também vendo tanta desgraça (...)". A solução proposta pelo senador era aprovar mais leis de crédito para construção de hospitais.

O deputado Barbosa Lima, um major positivista e florianista, foi governador de Pernambuco e lá fundou o Instituto Vacinogênico no Estado - mas desta vez ele investiu contra a vacinação. Para obstruir a votação da lei que tornou obrigatória, em 31 de outubro de 1904, ele apresentou mais de 30 emendas contrárias ao projeto.

Com laços estreitos com o senador e tenente-coronel Lauro Sodré, que fundou a Liga Contra a Vacina Obrigatória, Barbosa Lima é um representante dos setores militares que insuflaram um levante na Escola Militar da Praia Vermelha para derrubar Rodrigues Alves.

Moralismo

No discurso contra a vacinação, a questão moral também se fez presente. Enquanto as pessoas vacinadas mostravam os bons efeitos da proteção da imunização, os discursos contrários à vacina passaram a enfocar a violação do lar pelos agentes sanitários. Oswaldo Cruz coordenava então uma ação de vacinação feita de casa em casa. A oposição passou a dizer que a honra do trabalhador estava em perigo, pois suas esposas e filhas seriam forçadas à desnudar braços, coxas e talvez até as nádegas para os servidores da secretaria de Saúde Pública.

Outro viés na narrativa dos antivacinas era a violação das liberdades individuais. Em um artigo de capa publicado em 17 de julho de 1904, o Estadão tratou da situação de penúria em que vivia a saúde no Rio e criticou os políticos adversários da vacina. "Acima de tudo os princípios. Que importa que a Peste dizime? (...) A varíola grassa de modo pavoroso - o hospital de S. Sebastião regorgita, não há mais um leito e os carros da assistencia não param recolhendo nos bairros pobres as victimas da terrivel molestia."

"O povo, aterrado, dispõe-se à vacina, corre aos postos medicos e justamente quando se vae impondo, pela convicção, a prophylaxia que tem provado tão vantajosamente em todo o mundo, homens de prestigio, como os drs. Barbosa Lima, na Camara, e Barata Ribeiro no Senado, insurgem-se contra a medida salvadora."

Redução da imunização

A campanha contra vacinação levou o caos às ruas do Rio. Não derrubou Rodrigues Alves, mas foi eficiente em reduzir a vacinação. Entre maio e julho de 1904 o número de vacinados mostrava-se numa curva ascendente: foram cerca de 8.200 pessoas vacinadas em maio, e 23.021 em julho. Com a discussão sobre a obrigatoriedade da vacina e as disputas derivadas do debate sobre a lei, em agosto o registro caiu para 6.036 vacinados. Em final outubro, dias antes da revolta, o registro era de apenas 1.138.

A recusa popular à vacinação foi amplamente sentida, mesmo antes da aprovação da Lei nº 1261 de 31 de outubro de 1904, que tornava a vacinação obrigatória. As campanhas de imunização já eram usadas com sucesso em países da Europa, mas seu uso no Brasil era pequeno e a população ainda desconfiava de seus efeitos. "A onda de insatisfação instaurou a desordem nas ruas. Poucos se submetteram à vaccinação.", contava o jornal.

O aulão do Vai Cair No Enem, na UNIVERITAS, no Rio de Janeiro, recebeu o professor de história Everaldo Chaves. Abordando a Revolta da Vacina (1904), na época da República Velha, o professor conectou o assunto a conceitos de democracia, fazendo referência, ainda, à Revolta da Chibata.

Com muita interação, o professor explorou os motivos que resultaram na Revolta da Vacina e a reforma urbana e sanitária promovida pelo presidente Rodrigues Alves, com o apoio e expertise do médico e sanitarista Oswaldo Cruz, que precisou enfrentar surtos de febre amarela, peste bubônica e varíola. 

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A transmissão do evento está sendo realizada pelo Instagram (@vaicairnoenem) e canal do Youtube (youtube.com/vaicairnoenem) do Vai Cair No Enem. A apostila da aula de história está disponível online. Confira:

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O historiador Nicolau Sevcenko morreu na noite desta quarta-feira, 13, em São Paulo, aos 61 anos. A causa da morte não foi informada, mas, segundo sua mulher, Cristina, teria sido de enfarte.

Formado pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP em 1975, Sevcenko foi professor da PUC-SP e da Unicamp. Também deu aulas em Harvard, onde ministrava história e cultura da América Latina e do Brasil.

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Filho de imigrantes russos vindos da região da Ucrânia, Sevcenko dedicou-se especialmente ao estudo da cultura brasileira e do desenvolvimento de capitais como Rio e São Paulo.

Deixou outras importantes obras, como Literatura como Missão, em que trata do papel lógico da literatura, mas seu trabalho mais representativo deva ser A Revolta da Vacina, lançado em 1984 pela editora Brasiliense e reeditada em 2010 pela Cosac Naify. Trata-se de um clássico por detalhar os bastidores da maior convulsão social do Rio de Janeiro, ocorrida em 1904: pelas contas oficiais, a onda violenta de insatisfação popular durante a campanha de vacinação contra a varíola resultou em 30 mortos, 110 feridos, 945 presos e 461 deportados.

No livro, Sevcenko parte da rebeldia contra a imunização obrigatória para revelar tensões históricas profundas numa República que buscava se consolidar. E, por envolver história social, urbanismo, antropologia, saúde pública, a obra chegou a estar mencionada entre os 75 livros produzidos por professores da USP mais citados em trabalhos acadêmicos.

Sevcenko também sempre se interessou pela versatilidade da arte brasileira, aprendida justamente na adversidade. Em 2006, escreveu o artigo A Imaginação no Poder e a Arte nas Ruas, em que faz um sucinto levantamento das experiências estéticas dos séculos 19 e 20.

Também histórias curiosas não fugiam de sua atenção como o debate que suscitou em 2005 sobre a rua mais representativa de São Paulo - para ele, era a Rua São Paulo, próxima da Praça da Sé. "Era o espaço maldito da cidade onde, no século 18, a coroa portuguesa estabeleceu a forca, visível de praticamente todos os quadrantes da cidade, expondo assim cruamente a todas as gentes a força da justiça."

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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