Um levantamento feito pelo Instituto de Pesquisas UNINASSAU, encomendado pelo LeiaJá em parceria com o Jornal do Commercio, revela o que para muitos pode significar o fundo do poço em relação ao atual cenário político brasileiro: a maioria dos recifenses preferem o político que “rouba, mas faz”.
A pesquisa qualitativa, feita com moradores de bairros periféricos do Recife, perguntou aos entrevistados qual seria a opção escolhida entre as duas alternativas: você prefere um político que rouba, mas faz ou um político que não faz e nem rouba? Em sua maioria, o panorama verificado remete a ideia de que “entre os males o menor” e a de que “melhor pouco do que nada”.
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O morador do bairro de Água Fria Paulo Sérgio, de 50 anos, foi um dos que preferem a primeira opção. “Eles roubam, mas alguns fazem. É o que temos, né? Agora o mundo está assim”, disse em tom conformista. Ele não acredita que exista algum político honesto. “Eu acho muito difícil encontrar um. Eu não confio de jeito nenhum”, complementou.
Para Paulo, só existem dois que se salvam: os ex-presidentes Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva. Apesar de acreditar que os dois petistas “roubaram”, em sua avaliação eles estão “perdoados”. “Antes de Lula, e depois ele passou pra Dilma, o pobre não tinha televisão não. A gente não tinha nem rádio de pilha. Ele "roubou" para dar para o pobre mesmo que tenha “comido” um trocado. O projeto de Lula é de ladrão pequeno porque o grande já vem roubando há muito tempo. Agora, tem muita gente aí na cadeia que continua roubando e recebendo dinheiro. Lula não roubou, ele fez desvio de verba para dar aos pobres. Se ele for candidato de novo, eu voto nele. Eu perdoava o “roubo” pelo que ele fez por nós”, justificou.
Antônio Avelino, 82 anos, garante que na sua geração havia muitos políticos honestos. O aposentado diz que não pode discordar com o fato de que “melhor ruim do que nada”. “Eu dou apoio sim, pois pior é o que rouba e não faz nada. Na minha época, não era assim, eu já votei em muito político honesto. Agora, a situação é diferente, o que vejo com muita tristeza, mas acho que ainda pode melhorar”.
O professor da UFPE e um dos coordenadores da pesquisa realizada pelo Instituto UNINASSAU, o cientista político Adriano Oliveira explica que o quadro encontrado não significa que esses políticos sejam aprovados ou admirados pela população. “Outros mostram indignação com este tipo de políticos. Contudo, o relevante é que parte dos eleitores, diante das demandas que eles têm, as quais os governos não são eficientes para atendê-las, passam a tolerar gestores que roubam, mas faz”.
A flanelinha Edileuza Bezerra, 60 anos, reforça o diagnóstico de Adriano Oliveira. “A gente, infelizmente, fica peneirando para o menos ruim. O que vai, pelo menos, fazer alguma coisa pela saúde e pela educação, que andam juntas. A maioria despreza isso que o povo tanto precisa. Não é o ideal isso, mas a gente não tem político honesto 100%. Está para nascer um”.
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Prisão para os corruptos
Os entrevistados também são unânimes ao enfatizarem que político corrupto tem que ir para a cadeia. “Tem que ser preso sim. Eles que roubam e querem ter o perdão. Que pague pelo que fez, mas na verdade quem vai mesmo para a cadeia é o pequeno ladrão, aquele que rouba por comida”, lamentou.
A dona de casa Noêmia Ferreira pede por punição e vai além ao afirmar que mesmo um político honesto pouco pode fazer porque “os ruins” não vão deixar. “Então, esse político vai pelo círculo errado e fica tudo igual. Todos eles têm que pagar pelo que fizeram. Eu não digo pena de morte não, mas prisão perpétua. Porque um pai de família que rouba um pacote de fubá vai preso e os políticos não? É o pobre que sempre paga o pato. A gente não pode confiar não porque é tudo desonesto. Só trabalham por ambição e a gente pobre morre e não leva nada, mas no fundo eu acho que eles não têm sossego na alma”.
Honestidade acima de tudo
Apesar de ser uma minoria, há quem opte pelos que “não fazem, mas não roubam”. Na opinião do funcionário público Rivaldo Gonçalves, morador da Bomba do Hemetério, não pode existir conformismo. “Se ele está roubando, ele está prejudicando aquele que não tem. É uma sacanagem”, pontuou.
O bibliotecário Marcílio Freitas afirma que a população não pode concordar com a “roubalheira”. Para ele, é preferível que o povo se una para pleitear algo ou construam sem esperar o poder público do que aceitar a desonestidade. “Não podemos aceitar que um político roube. É melhor a ação popular como todos agora que estão se mobilizando para ajudar as vítimas das enchentes. É melhor do que esperar algo deles [políticos]”.
O estudante Alessandro Silva, 18 anos, foi convicto ao ser questionado. “Eu não posso concordar com isso de que rouba, mas faz. Eu não me sinto confortável com essa posição. Não concordo de forma alguma”. O amigo Rodrigo Jefferson, 17 anos, tentou rebater. “Mas todos nós roubamos de alguma forma. Olha, furar uma fila é um tipo de roubo. Querer tirar vantagem por meio do outro também é roubo. Já virou costume, então, infelizmente, melhor roubar do que não fazer nada. Eu sei que o ideal é não roubar, mas eu não acredito em político honesto, então, é melhor roubar e fazer. Não tem outra opção”, argumentou.
De acordo com Adriano Oliveira, essa opinião contrária demonstra que a corrupção pública é reprovada pelos entrevistados. “Eles consideram que a corrupção pública faz parte do cotidiano e que todos os políticos estão no mesmo saco”, declarou. O objetivo da pesquisa foi identificar as percepções dos eleitores - com mais de 16 anos e residentes em bairros da periferia do Recife - sobre o cenário político atual. O levantamento foi realizado no dia 24 de maio de 2017.