Os primeiros votos do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin têm agradado a opositores do governo e lideranças evangélicas no Congresso e provocado descontentamento na base e entre militantes de esquerda. Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ministro tem se posicionado contra temas considerados progressistas e causas sociais, como descriminalização das drogas e equiparação de atos de homofobia e transfobia a crimes de injúria racial.
Zanin deu o primeiro voto contrário à descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. No julgamento na quinta-feira, 24, o ministro afirmou que a liberação do ato poderia agravar a questão de saúde pública que envolve a drogadição. "Não tenho dúvida de que os usuários de drogas são vítimas do tráfico e das organizações criminosas, mas se o Estado tem o dever de zelar pela saúde de todos, tal como previsto na Constituição, a descriminalização, ainda que parcial das drogas, poderá contribuir ainda mais para o agravamento desse problema de saúde."
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Os ministros do STF analisam se quem porta maconha para uso pessoal está cometendo crime. Não está em discussão a liberação das drogas ou descriminalização da venda. O placar está 5 a 1 pela descriminalização.
Na segunda-feira, 21, Cristiano Zanin foi o único magistrado a votar não em um julgamento que avaliava estender aos crimes contra a honra de pessoas LGBTQIA+ o mesmo tratamento dado aos casos de injúria racial. O ministro foi voto vencido no STF. Agora, os responsáveis por atos de homofobia e transfobia não terão direito a fiança nem limite de tempo para responder judicialmente.
O caso é um desdobramento do processo em que, em 2019, a Corte decidiu aplicar a legislação do crime de racismo aos crimes cometidos contra pessoas LGBTQIA+. Uma entidade de defesa da comunidade apresentou um recurso pedindo que a decisão se estendesse para os crimes de injúria.
Zanin deu voto contrário com o argumento de que o recurso apresentado não admitia que o mérito da causa fosse rediscutido. Diante da proporção que o caso tomou nas redes sociais, a assessoria do ministro divulgou uma nota, afirmou que Zanin não é contra o mérito da questão e se pautou em questões processuais técnicas para proferir o voto.
Zanin é relator de um caso em que dois homens recorrem da condenação por furto de um macaco hidráulico, dois galões para combustível e uma garrafa de óleo diesel, avaliados em R$ 100. A Defensoria Pública da União pediu que fosse aplicado o princípio da insignificância, pelo baixo valor dos itens. O ministro votou contra.
Ele foi acompanhado pelo ministro Luiz Fux. Já os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia divergiram. Apenas a ministra votou pela aplicação da insignificância. Os outros divergentes abrandaram a pena dos dois homens.
Os posicionamentos desagradaram políticos e militantes de esquerda, que passaram a considerar Zanin como "conservador". Vice-líder do PSOL na Câmara, a deputada Sâmia Bonfim (SP) classificou o voto do ministro no caso da descriminalização das drogas como "lamentável" e apelou para que a próxima indicação de Lula para o Supremo traga um nome que represente "as lutas democráticas e progressistas".
A deputada Erika Hilton (SP), também da sigla, não citou nominalmente Zanin, mas no momento do voto dele contrário à descriminalização das drogas, pediu "uma ministra negra e progressista no STF".
Publicamente, parlamentares do PT silenciam, apesar de críticas nos corredores do Congresso e nos grupos de aplicativos de mensagens. Em entrevista ao Estadão, o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), minimizou as reações e disse que é "muito cedo para fazer uma avaliação" do perfil do novo ministro na Corte e defendeu a atuação do magistrado. "Tenho plena confiança que ele será um excelente ministro."
Por outro lado, lideranças da direita se dizem surpresas positivamente com a atuação do novo ministro da Suprema Corte. "Essa decisão das drogas e da homofobia veio bem na esteira do que ele (Zanin) havia falado que são suas convicções morais", disse o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), integrante da Frente Parlamentar Evangélica, em referência à conversa com Zanin antes da apreciação do nome dele pelo Senado. "Se continuar da mesma forma, vai ser um ministro do STF com perfil de valores morais adequado ao padrão católico."
Antes da sabatina que chancelou a indicação do presidente Lula, Zanin se reuniu com membros da bancada evangélica. Na ocasião, ele defendeu que o STF não deveria legislar sobre assuntos como aborto e drogas. O ministro conquistou o apoio da bancada e arrancou elogios da senadora Damares Alves (Republicanos-DF), que foi ministra de Jair Bolsonaro. Depois de almoçar com Zanin, ela disse que "gostou muito" do advogado.
O deputado Eli Borges (PL-TO), também integrante da Frente, avalia que, entre os evangélicos, Zanin está "preenchendo a expectativa". O parlamentar lembrou que o ministro foi aprovado no Senado com o apoio dos conservadores e disse que recebeu "com louvor" a notícia do voto contrário proferido por Zanin no caso da descriminalização das drogas para consumo pessoal. "Ele está conseguindo manter a linha de um conservador. Que Deus o abençoe e que ele continue assim."
O senador Magno Malta (PL-ES), outra liderança evangélica, gravou um vídeo parabenizando Zanin pelo voto no caso da criminalização da homotransfobia. "Parabéns, é um voto acertado. Pela vida, pelos valores e pelos princípios. Ele não seguiu ideologicamente o que pensam o partido do presidente e seus 'puxadinhos'."
Ainda no Senado, Eduardo Girão (Novo-CE) diz que no voto do caso da descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal Zanin foi "coerente e respeitoso com o parlamento" e "responsável com o Brasil". O senador votou contra a indicação do ministro e defende que o Supremo mantenha o porte de entorpecentes como crime.
Na sua sabatina no Senado, Zanin disse que via "com otimismo" a revisão do tema da descriminalização das drogas pelo Congresso, mas deu poucos detalhes sobre a sua posição a respeito do tema. Quando foi questionado a respeito do que pensava sobre aborto, ele disse que o Brasil já tem um "arcabouço normativo consolidado" sobre o tema e defendeu a proteção do direito à vida. "Nessa perspectiva, temos que enaltecer o direito à vida, porque aí estamos cumprindo o que diz a Constituição da República", afirmou na ocasião.