Tópicos | classe d

A crise econômica que atingiu o país nos últimos anos, causando o declínio na taxa de crescimento e milhares de desempregos, causou um impacto diferenciado em cada nível social do eleitorado recifense. Ao menos é o que aponta o novo estudo qualitativo feito pelo Instituto de Pesquisas UNINASSAU, encomendado pelo LeiaJá em parceria com o Jornal do Commércio, divulgado neste domingo (29).

Na avaliação, em que foi verificada a opinião de eleitores recifenses sobre a atual conjuntura do país, houve unanimidade entre os entrevistados quanto à existência da crise, mas as perspectivas de atuação diante dela foram diferenciadas. Para quem é das classes A e B, por exemplo, o fator de declínio econômico “está na cabeça das pessoas” e se perpetua por causa disso.

##RECOMENDA##

“Os entrevistados dizem que a crise atingiu eles em um primeiro momento. Contudo, hoje ela não mais os atinge, pois, decidiram enfrentá-la”, detalhou o cientista político e coordenador do estudo, Adriano Oliveira. Segundo ele, para esta parcela da sociedade “a crise é uma oportunidade para se reinventar”.

Foi o que aconteceu com a administradora Tatiana Veloso, de 42 anos, uma das entrevistadas pelo levantamento. Ela disse que no meio do arrefecer da economia deixou um emprego de 10 anos para empreender e abrir um brechó sustentável. “As pessoas precisam se reinventar na crise e inovar, pois é nela que surgem oportunidades. Hoje mesmo eu estou em um ramo que tem crescido, justamente por causa da crise, que são os brechós. Tem brechó que parece boutique e muitas pessoas optam por eles”, contou. 

Já os eleitores das classes C e D, de acordo com a amostra, registraram um certo “desespero” com a crise e pessimismo com a situação econômica do país, ao ponderar que estavam passando por “um momento muito difícil”.

“Eles salientam que a crise econômica atingiu a todos. Não só os pobres. Mas também os patrões, pois se ‘o pobre não compra, o rico deixa de ganhar’. Ao contrário das classes A e B, eles não afirmam que estão enfrentando a crise, mas que estão sobrevivendo diante dela. A crise econômica tem um impacto muito maior na mente e na vida dos eleitores das classes C e D”, observou o coordenador do estudo. “Quando falam em crise, não fazem referência apenas a crise econômica. Mas a crise da saúde, da segurança pública, da educação”, acrescentou Adriano Oliveira.

Para o levantamento, o Instituto UNINASSAU ouviu três grupos com recifenses das classes A e B (com salários acima de R$ 5 mil), C (entre R$ 2 mil e R$ 4 mil) e D (entre R$ 800 e R$ 1,2 mil) no dia 23  de abril. 

Os culpados pelo declínio econômico 

Se o impacto da crise teve significados diferentes para o eleitorado a partir da sua classe social, a pesquisa sugere que a responsabilidade pela existência dela tem dois culpados: os políticos e o povo. A partir dos argumentos expostos pelos entrevistados, o estudo observa que os eleitores das classes A e B apesar de culparem os políticos, ressaltam a dependência da população pelo Estado e, por isso, responsabilizam também a sociedade. 

“Diversos entrevistados das classes A e B afirmam que no Brasil existe a cultura do Estado. As pessoas estão sempre esperando pelo Estado e não fazem nada… É perceptível que os eleitores das classes A e B fazem questão de ser independentes do Estado. Ao contrário dos eleitores das classes C e D que revelam carência e que precisam do Estado para lhe ofertar bens públicos, como saúde, educação e segurança pública. E culpam, com ênfase, os políticos pela crise”, detalhou Adriano Oliveira.

Segundo Oliveira, durante o levantamento surgiu, inclusive, a menção de que para solucionar a atual conjuntura econômica seria necessária a mudança no quadro político do país, entretanto, "eles [os entrevistados] admitem que quem entra na política, se contamina [com a corrupção], e, por isto, a mudança tão desejada não é possível”. Os eleitores das classes C e D vão além e dizem que “o povo quer mudança, mas na hora de votar vende o seu voto”.

Método da pesquisa

Focada em verificar a opinião dos eleitores sobre o Brasil e a eleição presidencial, o estudo qualitativo feito pelo Instituto de Pesquisas UNINASSAU ouviu um recorte de três grupos recifenses e buscou identificar os sentimentos dos eleitores para com o momento do país.

“A pesquisa qualitativa possibilita que as visões de mundo, desejos e crenças dos eleitores sejam identificados e interpretados. O intérprete da pesquisa qualitativa deve decifrar os significados advindos das verbalizações dos indivíduos. A pesquisa qualitativa tem o poder de apresentar os elementos simbólicos que estão na conjuntura”, esclareceu Adriano Oliveira. 

A liberdade de não ter que se subordinar ao comando de chefes e ser dono dos lucros obtidos com o próprio trabalho cria em muitos recifenses o desejo de empreender. No entanto, para cidadãos das classes C e D entre 16 e 64 anos, a "ausência de verba" é o principal fator que impede a abertura de negócios. A informação é do mais recente estudo realizado pelo Instituto de Pesquisas UNINASSAU, promovido em parceria entre o LeiaJá e o Jornal do Commercio. A análise, trabalhada de maneira qualitativa, contou com entrevistados de vários bairros do Recife.

O desejo de ter o próprio negócio é notado principalmente entre os recifenses considerados maduros. Entre os possíveis empreendimentos, estão principalmente venda de batata frita, comércio de roupas ou mercadinho. Integrante do grupo das pessoas que almejam empreender, mas param na falta de recursos financeiros, Luciane Maria Neves, que tem 43 anos e atualmente trabalha como empregada doméstica, pensa em ter um negócio. Como também faz artesanato, a recifense do bairro de Casa Amarela, Zona Norte da cidade, vislumbra uma empresa para vender suas produções artesanais. “A questão financeira me impede, porque é caro abrir um negócio, o valor para comprar tudo que você precisa para começar é alto e existe o risco de não dar certo”, diz Luciane.

##RECOMENDA##

Também moradora da Zona Norte do Recife, Ranna Ivani tem 21 anos e diz que gostaria de ter a oportunidade de abrir uma academia. “Tenho vontade de ter um negócio, mas para a gente investir tem que ter oportunidade de levantar algum dinheiro. No momento, eu gostaria de abrir uma academia”, relata. “O lucro da pessoa que trabalha para si é mais vantajoso”, complementa a jovem recifense.

Ainda de acordo com a pesquisa, os entrevistados também apontam os impostos cobrados pelo poder público como barreiras para a abertura de empreendimentos, além da falta de certeza sobre se o negócio terá ou não sucesso. No geral, segundo o estudo, "empreender traz incerteza" para vários moradores do Recife.

Essa incerteza faz com que o público mais jovem e uma boa parcela dos recifenses maduros prefiram a segurança de ter uma renda fixa. Para isso, a aprovação em concursos públicos é o ideal, segundo relatos dos entrevistados. "Eles mostram o desejo de ser funcionários públicos. Segundo parte deles, trabalhar para o Estado possibilita que todo o mês, o 'certo entre na conta'. Portanto, empreender traz incerteza, é inseguro. Ser funcionário público traz o 'certo'. Eles desejam e elogiam a estabilidade do emprego público. Contudo, reconhecem que é muito difícil passar num concurso público”, diz o estudo do Instituto de Pesquisas UNINASSAU.

Para o coordenador da pesquisa e cientista político, Adriano Oliveira, o estudo mostra claramente que o desejo do recifense das classes C e D de ter o próprio negócio, caminha ao lado da busca por estabilidade financeira e profissional. "Os eleitores têm vontade de ser empreendedores. Tal desejo é observado entre os eleitores maduros. Entretanto, eles reconhecem que impostos e ausência de capital para abrir um negócio os impedem de empreender. Concorre ao desejo de ser empreendedor, o desejo da estabilidade, do certo. Jovens e maduros revelam opção pela segurança, estabilidade. Por isto, elogiam o emprego estatal e mostram desejo de conquistarem emprego público", analisa Oliveira.

LeiaJá também

--> Uma periferia marcada pela discriminação

--> Maioria prefere político que “rouba, mas faz"

--> Amor ao bairro: sentimento comum entre os recifenses

--> Periferia recifense nutre ‘raiva’ da classe política

Há mais brasileiros que pertencem às camadas de menor renda - C, D e E - nas nove regiões metropolitanas do País do que às classes mais ricas, A e B. Essa é a estratificação do Brasil que se configura pelo novo critério de classificação social da população, o Critério Brasil, adotado pela Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep). A nova métrica, mais minuciosa do que a anterior que está em uso desde 2008, começa a valer a partir de janeiro de 2015 para todas as pesquisas de mercado feitas no País.

Pelo novo critério, 68% dos brasileiros são das classes C e D, ante 63% pela estratificação antiga. Em contrapartida, diminuiu de 37% para 32% a fatia dos mais ricos, que pertencem às classes A e B. "Isso não significa que o brasileiro tenha empobrecido, mas pelo novo critério ficou mais difícil estar nas camadas de maior renda. Mudamos a régua", afirma o coordenado do Comitê do Critério Brasil, Luís Pilli.

##RECOMENDA##

O Critério Brasil de estratificação social da população foi formulado pelos professores brasileiros Wagner Kamakura, da Rice University, dos Estados Unidos, e José Afonso Mazzon, da FEA/USP. Essa nova métrica leva em conta não apenas a renda das famílias, mas principalmente a posse de bens, o tipo de moradia, o nível educacional e o acesso a serviços públicos, como saneamento e ruas pavimentadas. Ao todo são 35 variáveis avaliadas para se chegar ao estrato social.

Pilli explica que a intenção de criar um modelo que considera vários elementos, não apenas os valores monetários que as pessoas embolsam, é tentar tirar uma fotografia da renda permanente das pessoas. O conceito de renda permanente foi introduzido pelo economista americano Milton Friedman no qual ele considera a renda corrente, isto é o que entra no bolso das pessoas, ajustada às expectativas de quem a recebe.

De acordo com esse modelo de estratificação social, são atribuídos pesos e pontos à população, de acordo com o acesso a determinados bens e serviços, grau de instrução e uso de serviços públicos e tipo de moradia.

Sai TV

Pilli explica que várias mudanças foram feitas em relação ao Critério Brasil hoje vigente para obter um retrato mais próximo da realidade social. Itens como a posse de televisor, rádio e aspirador de pó foram eliminados, pois, de acordo com os formuladores do modelo, esses bens não refletem mais a posição social. Em compensação, passaram a ser considerados nessa avaliação a posse de microcomputador, lava-louça, lava roupa, motocicleta, secadora, forno de micro-ondas e acesso a serviços públicos, como saneamento e pavimentação. "Posse de microcomputador e acesso a serviços públicos têm pesos muito grandes", diz Pilli.

Na lista de quesitos foram mantidos itens como a posse de geladeira, freezer, aparelho de DVD, automóvel, banheiro, ter empregado doméstico e o nível de escolaridade do chefe da família.

O coordenador do comitê do Critério Brasil ressalta que alguns itens que já faziam parte do critério anterior foram mantidos, mas tiveram o peso aumentado. Entre eles, estão o número de banheiros existentes na moradia, a quantidade de automóveis e o número de empregados domésticos. Por causa do maior número de itens considerados nessa nova métrica, o total de pontos que a classe A pode atingir, se preencher todos os quesitos, é 100. Pelo critério anterior, e em vigor atualmente, o total de pontos é 46.

Além de agregar novos itens para avaliar a posição socioeconômica da população, o novo critério usa uma base de dados mais ampla que permite ter um retrato mais fiel do País. "O banco de dados mudou: agora passamos a usar a POF (Pesquisa de Orçamento familiar) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de abrangência nacional. Antes, era usado o levantamento do Ibope que considerava dados das nove regiões metropolitanas." Pilli observa que, apesar de 40% a 45% do consumo estar concentrado nas nove regiões metropolitanas, o dinamismo da economia brasileira está andando mais rápido fora desses polos.

Dois 'Brasis'

Por causa do universo maior de dados do novo critério, que tem âmbito nacional, só é possível fazer comparações entre a estratificação social nova e a velha para as nove regiões metropolitanas. Segundo Pilli, o que chama atenção pela estratificação social no novo critério é que, na prática, existem dois "Brasis" em termos de perfil de classes sociais. Um deles é formado pelas Regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste. Nessas três regiões, a metade da população pertence à classe C, cerca de 30% são das classes A e B e uma pequena parcela é de classe D. "O Centro-Oeste, por causa da riqueza gerada pelo agronegócio e também em função da capital federal, já se aproxima da estratificação social das regiões mais ricas do País", observa.

Já as Regiões Norte e Nordeste mostram a outra face do Brasil. De acordo com o novo critério, quase a metade da população dessas duas regiões são da classe de menor renda, a classe D. Na Região Norte, 42% da população pertence à classe D e no Nordeste essa fatia chega 47%. Já as classes mais ricas, A e B, representam 16% na Região Norte e 13% no Nordeste. "Esses resultados mostram que o Brasil ainda é muito desigual", afirma Pilli, ressaltando, no entanto, que houve nos últimos anos ganhos de renda. Pelo novo critério, no País como um todo, 75% da população pertence às classes C (48%) e D/E (27%) e um pouco mais de um quarto integra as camadas mais ricas. Por essa métrica, a classe A representa 3% e a classe B responde por 23%. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Leianas redes sociaisAcompanhe-nos!

Facebook

Carregando