Mulheres de todos os continentes se mobilizaram, nesta quarta-feira (8), em defesa de seus direitos em franco retrocesso em países como o Afeganistão, ou sob pressão em outros, como os Estados Unidos, onde o direito ao aborto é questionado, passando por Brasil, México e Colômbia, onde os feminicídios se multiplicam.
No conservador e patriarcal Paquistão, milhares de mulheres foram às ruas apesar da tentativa das autoridades de várias cidades de impedir as manifestações convocadas por ocasião do Dia Internacional da Mulher.
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"Não vamos mais ficar caladas. É nosso dia, é nosso momento", afirmou Rabail Akhtar, uma professora que se somou às 2.000 participantes de um ato em Lahore.
"Por que há tanto medo das mulheres que reivindicam seus direitos?", perguntou-se Soheila Afzal, uma designer gráfica.
No Afeganistão, "o país mais repressivo do mundo em relação aos direitos das mulheres", segundo Roza Otunbayeva, diretora da missão de assistência da ONU no país, cerca de 20 mulheres se manifestaram em Cabul, constataram jornalistas da AFP.
Desde a volta dos talibãs ao poder, em agosto de 2021, as mulheres e as meninas afegãs têm sido "apagadas da vida pública", lamentou o secretário-geral da ONU, António Guterres.
De forma geral, Guterres advertiu que "os avanços alcançados em décadas estão evaporando" no mundo.
"No ritmo atual, a ONU Mulher prevê que serão necessários 300 anos" mais para a igualdade entre homens e mulheres, acrescentou.
Durante um evento da Forbes em Abu Dhabi, a ex-secretária de Estado americano Hillary Clinton destacou que "as mulheres e as crianças são as principais vítimas dos conflitos e das mudanças climáticas" e que "nenhum lugar (...) nos mostra isso de forma mais dramática do que a Ucrânia hoje".
Em um vídeo, o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, agradeceu às mulheres que "sacrificaram sua vida" desde o início da invasão russa, há um ano. Do outro lado do conflito, o presidente russo, Vladimir Putin, elogiou as mulheres que "cumprem seu dever" a serviço da nação.
- Sanções inéditas -
Em um gesto simbólico na véspera do 8 de março, a União Europeia (UE) adotou sanções contra nove funcionários e três entidades oficiais de seis países, entre eles o Afeganistão, a Rússia e o Sudão do Sul, por casos de violência sexual e abusos contra as mulheres.
O Reino Unido seguiu a mesma linha nesta quarta e congelou os ativos e proibiu a entrada ao país de vários indivíduos e entidades responsáveis por agressões contra as mulheres no Irã, na Síria, no Sudão do Sul e na República Centro-africana.
Na Irlanda, onde a Igreja católica exerceu durante décadas um ferrenho domínio moral, o governo anunciou para novembro um referendo para decidir se serão eliminados artigos constitucionais que determinam que o lugar da mulher é "o lar".
Na Espanha, uma multidão com roupas e pintada com tinta na cor roxa percorreu o centro de Madri.
Esta manifestação "me dá muita força, muita esperança e muita energia para continuar lutando por direitos iguais para todas", disse à AFP Mariam Ferradas, uma auxiliar de cozinha de 52 anos, lembrando que suas avós "lutaram" por "certas liberdades que agora querem voltar a tirar de nós".
O governo do socialista Pedro Sánchez, em coalizão com o partido de esquerda radical Podemos, sofre atualmente um racha pela reforma de uma lei sobre agressões sexuais.
Na França, dezenas de milhares de pessoas se manifestaram por ocasião do Dia da Mulher, marcado este ano pela luta contra a reforma da Previdência, impulsionada pelo presidente Emmanuel Macron, que quer alterar de 62 para 64 anos a idade de aposentadoria.
"As mulheres são as grandes perdedoras desta reforma, pois com frequência suas carreiras são descontínuas", afirmou Odile Deverne, uma professora de 60 anos, em Lille (norte).
- Direito ao aborto -
Outro tema central dos protestos é a defesa do direito ao aborto, fragilizado nos Estados Unidos pela decisão da Suprema Corte de revogar, em junho, a sentença de 1973 que garantia a interrupção voluntária da gravidez em âmbito federal.
Esse direito também foi reduzido na Hungria e na Polônia.
"Lutamos contra um patriarcado (...), que desafia até a saturação estes direitos nossos - como o aborto -, que alcançamos lutando", proclama o manifesto da marcha em Madri.
Contrariando essa tendência, Macron declarou seu apoio a uma iniciativa de blindar o direito ao aborto, incluindo-o na Constituição francesa.
- Mobilizações na América Latina -
Sob os lemas "Nem uma assassinada a mais!" e "Contra as violências machistas e o trabalho precário!", coletivos feministas convocaram manifestações nas principais cidades do México, onde em 2022 foram registrados 969 feminicídios, segundo dados oficiais.
Também na Colômbia, organizações de mulheres convocaram manifestações em Bogotá, Medellín, Cali e outras cidades para exigir ações frente ao aumento dos feminicídios, que passaram de 182 em 2020 a 614 no ano passado.
O Brasil também bateu um recorde negativo em 2022, com mais de 1.400 feminicídios, o que representa um caso a cada seis horas, segundo uma pesquisa publicada pelo portal de notícias g1.
Uma "grande batucada feminista" denunciará, em São Paulo e no Rio de Janeiro, os "cortes nas políticas de proteção da mulher" e o "crescimento vertiginoso do machismo e da misoginia" durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022), afirmou Junéia Batista, da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
Na Venezuela, sindicatos e federações convocaram uma marcha em Caracas para exigir garantias a seus direitos, violados pelos baixos salários, pelos abusos e pela "crescente feminização da pobreza".
Sem permissão das autoridades para se manifestarem livremente, as organizações feministas independentes de Cuba convocaram uma "marcha virtual" nas redes sociais para gerar sensibilização sobre a violência de gênero e os feminicídios.
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