O Brasil é conhecido por ser um país receptivo e abrigar cidadãos das mais diversas parte do mundo. Segundo os registros da Polícia Federal, só na cidade de São Paulo vivem 361,2 mil imigrantes de maneira regular.
Entretanto, com o decreto de pandemia há pouco mais de três meses, a preocupação não sai da cabeça de quem veio para o território brasileiro trabalhar e realizar seus sonhos de vida. Afinal, mais de 58,3 mil mortes por Covid-19 foram registradas em nosso país, das cerca de 503 mil em todo o planeta.
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Além de ficar atento aos cuidados por aqui, quem nasceu em outro país também se mantém aflito com a situação da família e dos amigos que seguem vivendo a milhares de quilômetros de distância.
Morador da cidade de Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo, o haitiano Jean Paul, 29 anos, acompanha a situação no país centro-americano por meio dos familiares que trabalham na imprensa de lá. De acordo com ele, o problema no Haiti é pior em locais sem estrutura de saúde.
Apaixonado por futebol, Jean Paul escolheu viver no Brasil e só retornaria ao Haiti para cuidar da mãe. Foto: arquivo pessoal
"O mais complicado para eles é o pessoal que vive no interior, no campo, porque o governo não chega até lá", lamenta o ajudante e estudante de enfermagem.
No Brasil há pouco mais de quatro anos, Paul é mais um dos que precisam sair para trabalhar e enfrentar o risco do contágio todos os dias, mas é cauteloso em relação ao vírus.
"Tenho que sair para a rua para buscar o pão, mas evito sair sem necessidade, vou ao serviço e volto para casa. Estou me cuidando ao máximo", afirma.
Apesar de toda apreensão, Paul, que escolheu vir para o Brasil por ser apaixonado pelo futebol, não pretende abandonar a terra que adotou. "Só voltaria para meu país agora para cuidar da minha mãe, depois da pandemia eu retornaria ao Brasil de novo", ressalta o haitiano.
Saudade da família
Há seis anos no Brasil, o professor de idiomas Andréz Felipe Olivoz Vega, 31 anos, é nascido em Bogotá, capital da Colômbia. Apesar de um número baixo de mortos em relação ao índice brasileiro (são cerca de 3,2 mil mortos em solo colombiano), ele acredita que ambos os países falharam no controle da pandemia.
"A negligência social de aderir ao isolamento e a negligência governamental de lidar efetivamente com este problema. Infelizmente nesse quesito estamos juntos, parece o que a gente tem mais em comum é o que tem de pior também", afirma.
O colombiano Andréz tem receio de não poder rever a família, que ele não visita há três anos. Foto: arquivo pessoal
De acordo com o professor colombiano, a saudade da família é grande e viver longe da terra natal exige muito equilíbrio psicológico. "O mais complicado é começar a pesar um pouco a paranóia de que vamos pegar o vírus, morrer e nunca mais ver a família", reflete.
Sem visitar seu país desde 2017, Vega diz que os seus parentes mais próximos estão preocupados com a realidade brasileira. "O desempenho do atual governo está dando o que falar no ambiente internacional e eles, ao verem tantos casos, se preocupam com a minha situação aqui", declara o bogotano que, mesmo com a redução de carga de trabalho, se mantém firme na rotina de aulas on-line e sonda novos alunos para voltar ao ritmo normal de atividades.
Segundo Vega, a razão não lhe permitiria voltar Colômbia agora, mas o coração segue apertado. "Acho que voltaria para passar um tempo com a minha família, dois, três, seis meses, quem sabe, e depois cogitar novamente voltar, mais por uma questão de saudades", fala.
Isolamento
Outro que vive a pandemia longe do país natal é o professor alemão Kai Lehmann, 44 anos. Membro do corpo docente do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da Universidade de São Paulo (USP) e vivendo no Brasil desde 2007, Lehmann lembra que ele e a esposa decidiram que eles e os dois filhos, um menino de oito e uma menina de quatro anos, iniciariam o isolamento social antes das orientações das autoridades brasileiras.
"Começamos a entrar em quarentena uma semana antes do decreto e desde então estamos aqui dentro do nosso apartamento pequenininho, mas nos sentimos razoavelmente bem", explica o europeu, que segue ministrando aulas em casa e transmitindo via Internet.
O alemão Kai Lehman e seu filho; a família está isolada em seu apartamento desde antes do decreto da quarentena oficial. Foto: arquivo pessoal
Apesar de considerar que as crianças se adaptam melhor a esse tipo de mudança na rotina do que os adultos, Lehmann afirma que a família tem dado um jeito de ajudar os filhos na hora do estudo e das atividades recreativas em um ambiente reduzido.
Segundo o professor, a esposa vem tendo trabalho para auxiliar o filho nas tarefas e a filha, que tem atividades o dia todo quando está na creche, tem que se ocupar sozinha em algumas diversões diárias.
"Fazer as brincadeiras com eles aqui é obviamente difícil, mas a gente está nessa situação há três meses, então ganhamos experiência e a aplicamos agora", cita o alemão, que realça certa aflição por alguns familiares na Alemanha, mas comemora o fato de os pais, que moram na capital Berlim, estarem bem, pois o país conseguiu controlar a pandemia.
"Eles têm respeitado as regras de lá. Minha irmã é professora e o marido dela atua em um hospital e, apesar disso ser o que mais preocupa, eles moram em Bremen e os números estão sob controle", observa.
Ainda de acordo com o professor, o comportamento da população que não cumpre as recomendações das autoridades sanitárias não o surpreende. "É muito mais difícil as pessoas respeitarem uma quarentena quando se ganha muito pouco e tem que sair para trabalhar", analisa.
Segundo Lehmann, a família considerou a possibilidade de deixar o Brasil e ir para a Alemanha e só não fez isso porque a mãe da esposa, que mora no Rio de Janeiro, não conseguiria ser aceita na Europa.
"Recebo mensagens da embaixada alemã pedindo para voltar, informando opções de voo, mas não podemos deixar ela sozinha, essa opção atualmente não existe porque ela não conseguiria entrar na Alemanha", explica.