Por Renato Torres e Geraldo de Fraga
A expressão ‘peladeiro’ ganha um novo sentido quando se traz para o lazer a seriedade de um campeonato profissional. Torneios amadores, mais conhecidos como futebol de várzea, movimentam comunidades e até cidades diferentes em disputas que em nada devem aos grandes campeonatos do futebol como conhecemos. Esses espaços servem para confraternizar, mas também são palcos para o surgimento de futuros craques, ou a reapresentação dos atletas hoje aposentados. São esses os mais caros em um mercado pouco difundido; o dos atletas de futebol amador. O LeiaJá ainda acompanhou uma decisão na Campina do Barreto, bairro da Zona Norte do Recife, para conversar com alguns desses destaques da várzea.
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Currículo cheio no futebol profissional e fama nos campos de terra
Buscando indicações de atletas que estavam recebendo para atuar pelos clubes amadores, a reportagem não demorou para encontrar aqueles que jogam profissionalmente. O meia Diogo Peixoto começou a carreira em uma escolinha do bairro do Totó, no Recife e, aos 30 anos, soma passagens por diversos clubes das regiões Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste. Ele lembra o começo de toda a sua trajetória.
"Foi com o professor Paulo Roberto, que é ex-jogador do Náutico. Dessa escolinha, dei meus primeiros passos pra chegar onde estou hoje. Passei por Sport, Santa Cruz, Corinthians-AL, Porto, Ypiranga, Belo Jardim, Coruripe-AL, Serra Talhada, Uniclinic-CE, Cuiabá, Uberlândia-MG, Salgueiro, e vim para o Patrocinense jogar o Campeonato Mineiro. Agora voltei ao Uberlândia para jogar o Brasileiro da série D", conta.
De acordo com o camisa 10 do time mineiro, foi no lucro dos presidentes de equipes de várzea que surgiram as oportunidades para fazer um extra no fim do mês. É assim que atletas profissionais e também ex-jogadores estão complementando sua renda. O pagamento varia entre R$ 100 e R$ 150 por partida a depender da qualidade do contratado. "Quando o donos de time perceberam que era possível ganhar campeonatos pagando jogadores profissionais para jogar em seus times, vi que também podia ganhar dinheiro jogando", revela Diogo.
Mas nem pense, caro leitor, que é apenas entrar em campo e fazer um 'migué' nas partidas. Existem metas a serem cumpridas que correspondem ao investimento total dos dirigentes. Quem aceita receber, já sabe que irá precisar estar em seu melhor. "O objetivo é sempre ganhar os jogos e, consequentemente, ser campeão do campeonato, até pelo que os diretores e presidente investem no time", afirma.
Só que há outra vantagem além do dinheiro recebido. Os 'peladeiros profissionais' contam que a realização de vencer um torneio amador é tão grande quando no futebol profissional. "Com toda certeza é tão grande quanto. Ganhar título de várzea ou profissional é a mesma emoção. Só muda o campeonato, mas a vontade de ganhar e a emoção da conquista é a mesma", diz o meio-campista.
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Caro é jogador ruim
Sexta-feira, 13 de abril, e a final da Copa Campina do Barreto, movimenta o populoso bairro da zona norte do Recife. 32 times começaram a disputa, até os dois melhores chegarem à decisão. Aqui não tem “meu Real” ou “meu Barça” e sim “meu Ajax”. Porém, não o gigante holandês e sim o homônimo da comunidade, o Ajax da Campina.
Do outro lado, A Tropa, time que chegou para a partida com uma torcida menor, mas não menos barulhenta do que a adversária. O campo de terra é cheio de buracos e está alagado. Os vestiários para quem não chegou uniformizado são os carros. Não tem nem sinal de comodidade, mas tem empolgação de sobra. As preleções são emocionantes e fogos são estourados nas arquibancadas. Tem corneta também, claro. “Rafael, meião bonito não joga bola”, grita um torcedor no alambrado, em direção a um jogador mais bem vestido.
Ceará é auxiliar de escritório de segunda à sexta, mas na várzea ele é o meia habilidoso que veste a camisa 8 do A Tropa. “Acabei de chegar de Feira Nova (agreste pernambucano), joguei um amistoso lá pelo Cruzeiro, contra o Vera Cruz”, conta, enquanto calça as chuteiras. Há sete anos, a pisada é essa. Ele é um entre tantos que recebe para defender os times amadores.
“Jogo em todo canto, em qualquer cidade. Já perdi as contas de quantos times defendi esse ano”, admite. O cachê varia de R$ 100 a R$ 150, quase como uma tabela, que não só complementa sua renda como é mais lucrativo que seu salário formal. Além de craque, Ceará é um líder. Uma das falas da preleção é dele. O que lhe credencia é o currículo como profissional, que coleciona passagens por Salgueiro e Iraty-PR, além de Uniclinic e Crato.
Mais novo, tratado como jovem promessa, Maicon, meia atacante de 23 anos, segue o mesmo esquema de Ceará para vestir a camisa do A Tropa. Ele ainda tenta se dedicar somente ao futebol. Nos primeiros meses de 2018, esteve no CSE para disputar o Campeonato Alagoano. Quando não consegue vaga no profissional, desfila suas jogadas pela várzea.
Na final da Copa Campina do Barreto, Maicon mostrou que o investimento nele dá certo. Marcou dois gols na vitória de virada por 4 x 2. Do prêmio de R$ 3.500 para o campeão, uma parte é dividida entre o elenco. Um ‘bicho’ muito do bem vindo e mais um título que pode aumentar seu passe.
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