Frente à pandemia do novo coronavírus, preparar-se para as provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) não tem sido tarefa fácil. Além das incertezas do período, vestibulandos, monitores e professores de pré-acadêmicos populares ainda precisam adaptar-se à nova realidade para seguir com os projetos que objetivam a aprovação no Exame.
Pernambuco atravessa um período delicado, em razão da pandemia da Covid-19, que assim como no restante do mundo, tem acometido a população. Para quem está em fase de preparação para prestar vestibular, a tensão e preocupação são evidentes, atingindo com intensidade os pré-vestibulares populares, que não possuem as mesmas estruturas ou recursos de cursinhos particulares para funcionar.
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As aulas presenciais no Portal UFPE, preparatório vinculado à Universidade Federal de Pernambuco, começaram em 29 de fevereiro e com apenas duas semanas em atividade, junto com o decreto de suspensão das aulas nas unidades públicas de ensinos fundamental, médio e superior, o projeto foi suspenso.
Em entrevista ao LeiaJá, a coordenadora geral do pré-acadêmico, Ramona Raissa, 23 anos, cientista social pela UFPE, nos explicou que inicialmente a ideia não era ter aulas on-line, mas que devido “à falta de previsão de suspensão do isolamento social”, adequar as atividades presenciais para a web era a alternativa mais viável para manter o curso conectado com os estudantes.
“Após 15 dias de suspensão de aulas, passamos a planejar as atividades e executar atividade a distância: monitorias via WhatsApp e/ou chamada de vídeo; aulas gravadas e/ou ao vivo via YouTube; e materiais complementares em PDF disponíveis no drive. O audiovisual e materiais como fichas, slides e similares também estão sendo disponibilizadas no site do Portal, criado por um voluntário do projeto durante esse período de isolamento”, enfatizou Ramona.
Mesmo com toda a reformulação no jeito de ministrar aulas e até mesmo a manutenção mínimo do planejamento pedagógico, feito no início do ano, as dificuldades afetam o cursinho. A coordenadora ainda nos conta que antes da pandemia, o contato presencial com os alunos, de segunda à sexta-feira, garantia uma boa relação que beneficiava diretamente no aprendizado.
“Nossas principais dificuldades giram em torno do acesso dos/das estudantes e dos/das voluntários/as aos meios para produção do material on-line. Isso se deve ao fato de que, como comentado, nem todos têm acesso à internet e/ou possuem meios físicos e estruturais (computador, notebook, celular, cômodo silencioso, mesa de estudos, etc) para efetivação dessas atividades online”, acrescentou a coordenadora geral do Portal.
Ramona também revela outra dificuldade com relação ao monitoramento das atividades na forma remota. “Além disso, o controle dos/as estudantes que assistem aos vídeos também se tornou complicado, tendo em vista que, a princípio, não havíamos encontrado uma forma efetiva de ter essas informações em mãos e assim entendermos a situação e as especificidades dos/das estudantes que não podem acompanhar as atividades remotamente”, disse.
A dificuldade relatada por Ramona no Portal UFPE estende-se a outros pré-acadêmicos. Assim aconteceu com o pré-acadêmico popular Vestibular Cidadão, atuante no Recife. O curso, apesar de funcionar na Universidade, não possui os recursos necessários para as aulas. Os encontros ocorriam de segunda a sábado.
“Em relação às dificuldades que estamos enfrentando nesta pandemia, a primeira é que não terminamos o processo de inscrição do projeto. Paramos no processo de inscrição, faltando dois dias e também a prova seletiva não foi realizada”, explicou José Nemésio, coordenador do Vestibular Cidadão.
Nemésio ainda fala com preocupação que, até o momento em que as candidaturas para o pré-vestibular estiveram em abertas, foram registrados mais de 900 inscritos. O projeto, porém, não possui estrutura para atender a esse contingente. Geralmente, o trabalho feito pelo curso alcança, após as provas seletivas, em torno de 180 alunos.
O coordenador ainda revela que o cursinho obtém toda a verba interna através do valor de R$ 20 das inscrições. Assim como acontece em outros pré-vestibulares, esse valor simbólico é direcionado para a manutenção das aulas e muitas vezes o recurso não chega nem ao final do ano letivo.
Para exemplificar, antes mesmo da pandemia, os 180 estudantes atendidos pela iniciativa eram divididos em três turmas com 60 pessoas, que têm cinco aulas por dia durante seis dias da semana. Em um cálculo simples, por exemplo, por semana são investidos em fichas de atividades e outros materiais de impressão cerca de R$ 1.080. E devido à forte adesão ao curso neste ano, os recursos captados com as candidaturas efetivadas podem não ser suficientes para o período em que as aulas presenciais forem liberadas. “O dinheiro que temos para demandas internas vem das inscrições. Não é muito dinheiro, mas a gente faz a ‘mágica’ acontecer”, relatou.
Driblando a pandemia
Mesmo em um cenário vulnerável e que apresenta dificuldades cotidianaz para desenvolver os projetos, intensificadas pela crise sanitária emergencial, os pré-acadêmicos buscam alternativas para tentar manter o ritmo de atividades e feedbacks entre estudantes, professores e monitores. O Vestibular Cidadão decidiu não deixar desamparados os estudantes já inscritos no projeto.
Foram definidas estratégias para contornar as limitações impostas pelo distanciamento e isolamento social, provenientes de recomendações da Secretaria de Saúde do Estado, desde a crescente no contágio pelo coronavírus em Pernambuco. Nemésio explica que, para não deixar de fora nenhum estudante que está se preparando para o vestibular, algumas ações precisaram ser traçadas.
“Como medida, vamos [projeto] adotar o YouTube com aulas on-line, para todos que puderem e quiserem assistir. Teremos sala de aula e monitoria pelo Google Meets e WhatsApp, para retirada de dúvidas e acompanhamento", disse Nemésio. O calendário letivo presencial, porém, segue em atualização; ainda não há previsão para início das aulas.
No Portal UFPE, todo o formato do cursinho foi alterado conforme a necessidade dos estudantes vinculados ao projeto. A coordenadora geral Ramona Raissa tem como principal forma de alinhamento a comunicação constante entre os membros do pré-acadêmico. Assim, o curso, atrelado às atividades ministradas on-line, com materiais divulgados diariamente através do perfil do Instagram @portalufpe, chega ao objetivo de atingir "o maior número de estudantes do projeto”. "Somado a isso, uma das equipes do projeto, a Equipe Psicopedagógica, tem acompanhado os/as estudantes com o apoio psicológico, realização de horário de estudos e conversas sobre as questões individuais de cada", acrescentou.
Expectativas pós pandemia
Quando perguntados sobre as expectativas quanto ao Enem 2020 e planos futuros do projeto, os representantes dos pré-acadêmicos demonstraram preocupação. E argumentaram que, devido à baixa qualidade de ensino na rede pública, e sobretudo, com a quebra da rotina escolar, a competição entre os vestibulandos de cursinhos particulares e populares se dá de forma desigual.
“Minha expectativa para o Enem 2020 é um caos! É um pessoal que tem internet boa em casa, livros e acesso a certo capital cultural que viabiliza uma preparação mais intensa, das escolas aos cursinho preparatórios, enquanto a gente tem essas limitações que falei”, avaliou Nemésio, coordenador do Vestibular Cidadão.
Para ambos os projetos, os planejamentos para 2021 são indefinidos. "Acreditamos que o cronograma anual, assim como esse ano, será readaptado, bem como o processo seletivo do projeto. Nesse sentido, estamos aguardando mais orientações da universidade e das autoridades sanitárias para planejarmos nosso retorno às atividades presenciais, visando proteger todos/as nossos/as estudantes e voluntários (as), assim como garantir que o retorno se dê da melhor forma possível”, avalia Ramona.
Na mesma linha de análise da dinâmica educacional em Pernambuco, levando em consideração os efeitos da pandemia, torna-se comum aos projetos a aderência, até o momento, das aulas na forma remota, pela internet.
A reportagem procurou estudantes dos preparatórios que pudessem falar sobre suas perspectivas diante diante da pandemia, no entanto, por orientação da Equipe Psicopedagógica, eles não participaram da matéria, pois o momento "gera desconforto e desperta gatilhos que impactam negativamente os vestibulandos".