O segundo dia de provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ocorreu no último domingo (12) em todos os estados do país e no Distrito Federal. Cerca de 2,7 milhões de candidatos realizaram o vestibular, que se tornou assunto principal no Brasil.
Entre os tópicos levantados, uma questão de matemática teve muita repercussão nas redes sociais, por ter um “teor racista” na charge. O quesito levanta as diferenças culturais de povos e possui uma imagem caricata de pessoas pretas. O professor de matemática Edu Coelho, também é um homem preto e conversou com o Vai Cair no Enem sobre a situação.
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O docente explica que a questão aborda o conteúdo de sequência e lógica indutiva, para fazer o aluno descobrir qual o próximo termo da sequência, seguindo a lógica por trás da sequência de termos apresentados na figura. Segundo o matemático, este tipo de pergunta poderia ser feita de diversas maneiras, utilizando os mais “diversos símbolos, nos mais diversos contextos”. Porém, o uso da charge não foi a melhor escolha.
“Nós sabemos que a charge se comunica não apenas com a fala, mas com tudo que ela mostra ali, com o desenho, com todo o contexto e tal. E o que nós temos ali é a escolha de uma linguagem que remete realmente ao que nós, por muito tempo, fomos acostumados a chamar de selvagem ou primitivo. Essa sonoridade que acaba remetendo alguns povos, que foi introduzido na gente de maneira errada, querendo ou não, existe essa ligação ao que a gente entende a muitos povos africanos”, explica o profissional.
Para Coelho, a forma que as pessoas foram representadas e suas feições, foram de “extremo mau gosto”. Ele defende que a pergunta, na parte da matemática, poderia ser feita de outras formas e que a escolha do quesito foi “bem complexa, bem complicada”. Um dos milhares de estudantes que fizeram a prova do Enem também expressou seu descontentamento com a prova nesta questão.
Valber Willians é um jovem negro de Recife, Pernambuco. O rapaz contou ao Vai Cair no Enem que, no início, não notou a problemática por estar tão nervoso ao fazer o vestibular, mas ficou abalado ao ver o quesito em casa.
“O que mais me pega nessa questão é o fato de estar estereotipando o negro, sabe? Tipo, aquele negro com o cabelo de pixaim, com aqueles lábios gigantes e o nariz muito avantajado. Só fica estereotipando o negro, relata o aluno. Well ainda levanta que esta atitude foi “hipocrisia da bancada”, porque, nas palavras dele, na primeira semana de provas, o Enem defendeu que “racismo não”, mas na semana seguinte, estaria “estereotipando”.
“De primeiro eu nem reparei, porque eu tava muito focado na prova, eu tava focado mais em responder as questões. Só que é quando eu cheguei em casa que eu dei uma lida de novo na prova e fui atrás das questões que eu vi, e isso me deixou muito chateado, me deixou abalado, porque como eu falei, foi hipocrisia da bancada, hipocrisia”, afirma o recifense.
O professor de matemática Edu Coelho concorda com o aluno no ponto de esteriotipar traços negros. Para o docente, esta pergunta foi muito problemática, por trazer uma charge que possui feições “animalesticas”.
“Eu achei muito problemático porque meio que estigmatiza, sabe? Você piora o estigma que existe em relação às pessoas pretas, porque obviamente que dentro das pessoas pretas existem as características que já são muito estigmatizadas, sofrem bastante discriminação em relação, por exemplo, ao formato de lábio, de nariz, e aí você tem essas feições, com cahrges reproduzindo pessoas pretas. Nesse formato, eu achei bem errado, na verdade”, finaliza o matemático.
A questão apresentada é bem similar a outro quesito, presente no vestibular da Universidade Estadual de Goiás (UEG) de 2003. Contudo, o quesito original não possuía charge alguma, e foi adaptada para o Enem 2023. Mesmo com a similaridade, o ministro da educação Camilo Santana afirmou que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira não tem pretensão de anular a questão.
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