Após um processo obstrutivo intenso da bancada do PSL, com debates acalorados e manobras regimentais que atrasaram o andamento da reunião, a relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News, deputada Lídice da Mata (PSB-BA), leu o plano de trabalho das atividades do colegiado. Entretanto, o documento não chegou a ser votado pelos deputados e senadores na reunião desta terça-feira (17).
Além de definir datas e temas a serem explorados a cada reunião, a relatora sugeriu a criação de três sub-relatorias: cyberbullying e os crimes de ódio; proteção de dados no contexto das fake news; e aliciamento de crianças e outros vulneráveis. As sub-relatorias não precisam ter a criação aprovada pelos integrantes, cabe ao presidente da CPI mista, senador Angelo Coronel (PSD-BA), indicar os relatores parciais. Quem deve assumir a de cyberbullying é o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
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Lídice sugeriu no texto temáticas a serem abordadas durante o funcionamento da CPI: conceituação e delimitação das fake news e seus impactos na sociedade; cyberbullying, aliciamento e orientação de crianças para o cometimento de crimes de ódio e suicídio; consequências econômicas da produção e disseminação das notícias falsas que atentam contra a democracia no mundo; e esquemas de financiamento, produção e disseminação de fake news com o intuito de lesar o processo eleitoral, entre outras. No entanto, salientou haver espaço para alterações, a partir das sugestões dos integrantes.
Para as discussões, serão convidadas pessoas com múltiplas visões sobre o assunto: especialistas, acadêmicos, membros do governo, autoridades públicas, servidores públicos, juristas, representantes de organizações da sociedade civil organizada, representantes de empresas digitais, e outros que se mostrem necessários, frisou Lídice.
Ela salientou a importância de se prosseguir com as investigações:
“Apesar do clima criado nas duas últimas reuniões, quase de torcidas futebolísticas, nossa CPMI pode e deve prosseguir com um conceito de investigação que sirva ao Brasil”, afirmou.
Devido à obstrução parlamentar, houve falta de quórum para votar o plano de trabalho, e o presidente Angelo Coronel encerrou a reunião.
Obstrução
Com o uso de ferramentas como leitura e pedidos de retificação de ata, de votação nominal e até tentativas de anular a votação de requerimentos da reunião anterior, em um verdadeiro “kit-obstrução”, como chegaram a denominar, os deputados do PSL buscaram impedir o prosseguimento da pauta na CPI. A vice-líder do governo na Câmara, deputada Bia Kicis (PSL-DF), alegou que o objeto de investigação da comissão tem vícios de origem e a comissão será politizada, de forma a atacar o governo, o que a base buscará impedir. A líder foi apoiada pela deputada Caroline de Toni (PSL-SC).
“Temos sim a fundada suspeita de que essa é a CPI da censura, de que é um terceiro turno para pegar o nosso presidente [Jair] Bolsonaro e que a oposição está imbuída desse intuito sim”, afirmou.
Os parlamentares da oposição questionaram por que a bancada do governo teme o avanço da investigação, quando na verdade esta é, segundo eles, a oportunidade para averiguar crimes orquestrados na internet profunda (deep web), como os que levaram ao massacre de Suzano (SP), em março deste ano, e outras ameaças, e indução a atos de suicídio.
“Novamente vem um processo de obstruir a continuidade do trabalho, já vi obstruir votação de projeto, medida provisória, processo de impeachment, mas impedir que uma CPI possa desenvolver seu trabalho, para mim, só tem uma justificativa: é medo, medo de quando a gente investigue isso aqui, comecemos a identificar os tentáculos, quem está por trás desse tipo de coisa”, disse o senador Humberto Costa (PT-PE).
Procedimentos
Por sugestão do deputado Ricardo Barros (PP-PR), o presidente Angelo Coronel informou que está em curso a tentativa de se construir um acordo de procedimentos, para que os parlamentares do PSL e a oposição possam ter uma pauta única de votação para os itens consensuais. Requerimentos e pedidos polêmicos, como os ligados às eleições de 2018, iriam para o voto. Segundo Coronel, a controvérsia envolveria a tentativa de identificar “quem influenciou as eleições passadas via perfil falso ou via abuso do poder econômico, montando bunker no Brasil ou fora”.
“Numa primeira etapa, temos que cuidar da sociedade, melhorar o marco regulatório da internet. Tem muitas falhas no marco porque a evolução é muito grande, a internet voa. Então coisas que foram aprovadas há quatro, cinco anos já evoluíram. Temos que propor ações legislativas para proteger a sociedade”, opinou o presidente, em entrevista coletiva após a reunião da CPI mista.
Ao ser questionado se o filho do presidente Jair Bolsonaro, o vereador Carlos Bolsonaro, poderia prestar depoimento à comissão, Angelo Coronel reafirmou existirem conjecturas a respeito disso, já que todos os atores envolvidos no processo eleitoral de 2018 poderão ser convocados.
“Como o próprio presidente Bolsonaro diz, que Carlos foi o artífice, o grande gestor da rede social dele, acredito que pode surgir requerimento para que ele seja convocado”, disse.
Após questionamentos da imprensa sobre a possibilidade de prisão do vereador, Angelo Coronel lembrou que há essa previsão caso haja crime de flagrante delito.
“Qualquer um que vier na condição de testemunha e faltar com a verdade é caso de flagrante delito. O presidente pode pedir a prisão dele, isso não é com Carlos, é com qualquer cidadão que mentir aqui na CPI. Não fui eu que inventei, é o Código Penal e o Regimento”, explicou.
*Da Agência Senado