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Coalas selvagens afetados por um retrovírus mortal estão combatendo a doença no nível genético, disseram cientistas nesta quinta-feira (10), um raro processo evolutivo que está se desenvolvendo diante de nossos olhos.

O retrovírus KoRV-A começou a infectar o marsupial entre centenas e alguns milhares de anos atrás, começando no norte da Austrália e se espalhando para o sul, e pode ter se originado em morcegos.

O vírus está ligado à Síndrome da Imunodeficiência Coala (Kids, na sigla em inglês), que é semelhante, porém menos potente que a aids em humanos, e torna os animais suscetíveis a cânceres fatais e infecções secundárias, como a clamídia, que os torna inférteis.

Os retrovírus funcionam inserindo seu genoma em um genoma hospedeiro, mas, diferentemente do HIV, o KoRV-A também entra nas células germinativas do animal que produzem espermatozoides e óvulos, o que significa que é transmitido através de gerações.

Tais infecções por patógenos nas células germinativas são muito raras, mas pesquisas recentes sugerem que elas são um importante impulsionador da evolução: a última vez que ocorreu em nossos ancestrais humanos foi há três milhões de anos, e 8% do nosso genoma vem de vírus antigos.

Às vezes, os vírus são cooptados para fins úteis, incluindo um que foi responsável pela evolução da placenta em nossos ancestrais mamíferos há cerca de 100 milhões de anos.

Em um novo artigo publicado na revista Cell nesta quinta-feira, uma equipe de cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de Massachusetts e da Universidade de Queensland revelou um tipo de "imunidade genômica" em coalas recém-infectados.

Isso contrasta com o combate à infecção pelo sistema imunológico, como os animais normalmente combatem as doenças.

Suas descobertas sugerem que as células germinativas reconhecem um passo essencial no ciclo de vida viral e o voltam contra o invasor para suprimir a infecção do genoma, sendo capaz de distinguir a diferença entre suas próprias células e o vírus.

"E parece funcionar, mas não muito bem", disse à AFP William Theurkauf, da UMass Medical School e principal autor do artigo.

Theurkauf fez uma analogia com um humano que pegou uma gripe: você se sentirá doente mesmo quando seu corpo estiver combatendo a doença. Não fosse a resposta imunológica inicial, todas as infecções acabariam levando à morte.

O que os coalas ainda precisam evoluir é uma segunda fase de resposta na qual pequenos ácidos ribonucleicos especializados (RNAs), que desempenham papéis reguladores cruciais em vários processos, são produzidos para desligar o vírus.

"Então, estamos vendo a resposta inicial", disse Theurkauf. "A questão é: podemos encontrar coalas que passaram para a próxima fase em que eles realmente o estão desligando?"

Não está claro se isso já aconteceu em alguns coalas ou, se não, quanto tempo levará para a espécie evoluir a resposta. Se isso não acontecer, o vírus "poderia ser um mecanismo de extinção", acrescentou.

Como alternativa, um dia os humanos poderiam intervir para acelerar a evolução via engenharia genética, em vez de esperar que os coalas cheguem lá sozinhos - embora a ciência ainda esteja muito distante disso.

O Fundo Global de Combate à Aids, Tuberculose e Malária anunciou nesta quinta-feira (10) que foi alcançado o objetivo de arrecadar os 14 bilhões de dólares necessários para o combate a estas doenças nos próximos três anos.

Este dinheiro está destinado a salvar cerca de 16 milhões de vidas adicionais - 32 milhões já foram - e evitar 234 milhões de novas infecções até 2023.

O Fundo, criado em 2002, também registrou a chegada de novos contribuintes. Os países da África contribuíram o dobro que na ocasião anterior.

No entanto, a Rússia e a América Latina não responderam ao chamado do fundo e se destacaram por sua ausência.

Peter Sands, diretor-executivo do fundo, declarou que está "muito orgulhoso" pelo dinheiro arrecadado. "Amanhã focaremos em qual é a melhor maneira de utilizá-lo", disse.

 

A Polícia Civil do Mato Grosso prendeu, na quinta-feira (29), Haroldo Duarte da Silveira, de 32 anos, por transmitir o vírus HIV para quatro mulheres com quem se relacionou por anos. Ele foi indiciado por quatro tentativas de feminicídio.

O suspeito estava fora do Mato Grosso e foi preso ao retornar para Cuiabá. Ele confessou a existência de uma quinta vítima, que deve ainda ser procurada pela polícia.

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Todas as mulheres que denunciaram Haroldo afirmaram que o investigado nunca anunciou ser portador da síndrome da imunodeficiência adquirida ou usou qualquer tipo de proteção durante as relações sexuais. Segundo a polícia, não havia condições do suspeito desconhecer que carregava o vírus.

A tipificação do crime como feminicídio gerou debate. Para a delegada do caso, Nubya Beatriz Gomes dos Reis, o preso agiu com dolo na modalidade eventual, pois assumiu o risco de contaminar suas parcerias com doença que, se não detectada e tratada, poderia levá-las à morte. "Sendo assim o indiciei pelo crime de feminicídio tentado quatro vezes", defendeu ela.

A delegada representou pela prisão preventiva de Haroldo para proteger a integridade física e psicológica das vítimas e evitar novas contaminações. "Oriento as mulheres que se relacionam com o suspeito que realizem o exame para constatação do vírus, e se o tempo de aquisição da doença coincidir com o do relacionamento que procure esta delegacia para que possamos instaurar novos inquéritos policiais e investigar os fatos", pediu Beatriz.

A Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia reduziu as tarifas de importação de 17 produtos como medicamentos para tratamento de câncer e HIV/Aids, materiais de consumo, fraldas e absorventes, que estavam na Lista de Exceções à Tarifa Externa Comum (Letec) do Mercosul. As alíquotas caíram de até 18% para zero ou 2%. A medida começou a valer nesta quarta-feira (7).

Segundo o Ministério da Economia, o objetivo é reduzir o custo de produção das empresas instaladas no Brasil e o preço dos produtos para os consumidores. A redução de gastos é estimada em R$ 150 milhões por ano para empresas privadas e para o governo federal.

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A Letec permite que os países do bloco apliquem alíquotas de imposto de importação diferentes das previstas pela Tarifa Externa Comum (TEC). O Brasil está autorizado a manter, até 31 de dezembro de 2021, uma lista de 100 produtos como exceções.

O número de mortes relacionadas com a aids no ano passado caiu a 770 mil, um terço a menos que em 2010, anunciou nesta terça-feira (16) a ONU, que fez uma advertência sobre a estagnação dos esforços mundiais para erradicar a doença com a redução do financiamento.

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Mais de três em cada cinco soropositivos no mundo - 23,3 milhões de 37,9 milhões - recebem tratamentos antirretrovirais, uma proporção recorde, afirma Unaids (Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/aids) em seu relatório anual.

Os tratamentos, que permitem não transmitir o vírus da aids quando tomados corretamente, alcançam 10 vezes mais pacientes do que em meados da década passada.

O número de mortes do ano passado foi um pouco inferior ao registrado em 2017 (800 mil) e um terço menor que o balanço de 2010 (1,2 milhão). E está muito abaixo da hecatombe de 2004, quando o vírus da aids matou 1,7 milhão de pessoas.

O número de novas infecções permanece estável na comparação com os anos anteriores (1,7 milhão).

As cifras globais escondem, no entanto, grandes diferenças regionais, destaca a Unaids, que adverte que a luta contra a doença não avança a um ritmo suficiente.

Em geral, a queda do número de mortes e o maior acesso aos tratamentos são explicados pelos avanços registrados no sul e leste da África, o continente mais afetado pela doença. Em outras partes do mundo, alguns indicadores são preocupantes.

No leste da Europa e na Ásia central o número de novas infecções disparou 29% desde 2010. O número de falecimentos em consequência da aids também aumentou 5% nestas regiões e 9% no Oriente Médio e norte da África, nos últimos oito anos.

Redução do financiamento 

A Unaids adverte em seu relatório que o financiamento para eliminar a doença está em queda. "Pela primeira vez desde 2000 os recursos disponíveis para a luta global contra a aids caíram", alertou Gunilla Carlsson, diretora interina da Unaids após a saída de Michel Sidibé.

No ano passado, 19 bilhões de dólares foram destinados a programas de luta contra a aids, um bilhão a menos que em 2017 e sete bilhões a menos que o valor considerado necessário para para 2020 (US$ 26,2 bilhões).

"Esta redução é um fracasso coletivo", destaca a Unaids. O programa da ONU afirma que o cenário envolve "todas as fontes de financiamento": contribuições internacionais dos Estados, investimentos dos países ou doações privadas com fins filantrópicos.

Por este motivo, 2019 é considerado um ano crucial. Organizada a cada três anos, a conferência de financiamento do Fundo Mundial acontecerá em 10 de outubro na cidade francesa de Lyon.

O objetivo é arrecadar 14 bilhões de dólares para o período 2020-22 para conseguir financiar o fundo. Os principais contribuintes são Estados Unidos, França, Reino Unido, Alemanha e Japão.

Os obstáculos afetam o trabalho para alcançar o objetivo estabelecido pela ONU para 2020: que 90% das pessoas portadoras do vírus conheçam seu diagnóstico, que 90% destas pessoas recebam tratamento e que, entre elas, 90% tenham uma carga viral indetectável.

Em 2018, estas proporções foram, respectivamente, de 79%, 78% e 86%, com muitas diferenças regionais.

Pesquisadores americanos conseguiram remover o vírus HIV - responsável pela Aids - do genoma de animais vivos. O estudo divulgado pela revista cientifica Nature, nessa terça-feira (2), traz esperança e indica uma possibilidade de cura para a doença.

 

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Cientistas da Escola de Medicina da Universidade Temple, na Pensilvânia, em parceria com o Centro Médico da Universidade do Nebraska, optaram em utilizar 29 roedores nos testes laboratoriais. Após técnicas utilizando medicamentos e edição das células infectadas, o vírus foi eliminado em 30% das cobaias.

Com a progressão, os responsáveis pelo estudo vão realizar testes em primatas. Caso tenham resultados satisfatórios, o processo poderá ser realizado em humanos. A pesquisa pode ser acessada através do portal da Nature.

No próximo domingo (23) acontece em São Paulo a 23ª Parada do Orgulho LGBT. Pela primeira vez na história do evento, haverá distribuição de autotestes de HIV nos dias que antecedem a celebração. Essa é uma alternativa de diagnóstico precoce da Aids, que funciona de modo similar aos testes rápidos. A ação será realizada entre segunda e quinta-feira (de 17 a 20 de junho), no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP), das 11h às 20h30.

Serão realizados 1,5 mil testes rápidos e distribuídos 1,5 mil autotestes de Aids, 28 mil preservativos e 15 mil sachês de gel lubrificante. A iniciativa é do Programa Estadual de DST/ Aids, em parceria com a Aids Healthcare Foundation (AHF).

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Desde 1980, foram confirmados 183.141 casos de Aids em homens com 13 anos ou mais, sendo 53.126 em Homens que fazem Sexo com Homens (HSH). Esse segmento é o único que tem aumentado a participação proporcional e absoluta no total de casos. Em 2007, essa população correspondia a 31,3% dos casos e, dez anos depois,  essa porcentagem subiu para 50,3%.

Os testes de HIV estão disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS) durante o ano todo. A consulta ao serviço pode ser feita pelo Disque DST/AIDS (0800 16 25 50) ou pela internet.

Pelo menos 90 pessoas, incluindo 65 crianças, foram inoculadas com HIV no sul do Paquistão depois que um médico usou uma seringa contaminada, disseram autoridades na sexta-feira.

Segundo as autoridades, o médico usava a mesma seringa para injetar medicamentos nos pacientes, informou a polícia local. Segundo a fonte, o próprio médico era soropositivo.

As autoridades foram alertadas pela primeira vez na semana passada, depois que 18 crianças que moravam na periferia de Larkana obtiveram resultados positivos para o vírus da aids.

Un segundo encargado del sistema de salud confirmó esta contaminación, pero mencionó cifras ligeramente diferentes.

"O sangue dos pais das crianças infectadas também foi analisado, mas seus resultados deram negativo", indicou Azra Pechuho, ministra de Saúde da província de Sindh, onde Larkana se localiza.

O Paquistão é considerado um país com baixa prevalência de HIV. Mas a aids está aumentando, especialmente entre usuários de drogas, profissionais do sexo e imigrantes de países do Golfo.

A Prefeitura de São Paulo ampliou o acesso a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), pílula que evita que pessoas expostas ao vírus HIV desenvolvam Aids. Agora, 21 unidades de saúde da capital oferecem o medicamento de forma gratuita para pessoas em situação de vulnerabilidade e que têm maior risco de infecção.

Segundo a Secretaria Municipal da Saúde, esse grupo inclui profissionais do sexo, casais sorodiferentes (quando um tem HIV e o outro não) e toda a população LGBT. Para ter acesso à pílula, é necessário ainda agendar uma consulta com o médico da unidade mais próxima, que antes de receitar a PrEP irá conversar com o paciente e realizar testes de doenças sexualmente transmissíveis.

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Veja os locais da capital onde é possível agendar a consulta médica e encontrar o medicamento:

CENTRO

SAE Campos Elíseos - Alameda Cleveland, 374, Santa Cecília

Tel: (11) 3241-2224

ZONA SUL

CTA Santo Amaro - Avenida Mário Lopes Leão, 240, Santo Amaro

Tel: (11) 5686-9960 / 5686-1475

SAE Cidade Dutra - Rua Cristina de Vasconcelos Ceccato, 109, Cidade Dutra

Tel: (11) 5666-8386

SAE Santo Amaro - Rua Padre José de Anchieta, 640 - Santo Amaro

Tel: (11) 5686-1613

SAE Jardim Mitsutani – Rua Vittório Emanuelle Rossi, 97, Jardim Bom Refúgio

Tel: (11) 5841-9020

SAE M’Boi Mirim - Rua Deocleciano de Oliveira Filho, 641, M'Boi Mirim

Tel: (11) 5515-6207

ZONA NORTE

CTA Pirituba - Avenida Dr. Felipe Pinel, 12, Pirituba

Tel: (11) 3974-8569

SAEs Nossa Senhora do Ó - Avenida Itaberaba, 1377, Freguesia do Ó

Tel: (11) 3975-2032

SAE Santana - Rua Dr. Luís Lustosa da Silva, 339, Mandaqui

Tel: (11) 2950-9217

ZONA OESTE

SAE Butantã - Avenida Corifeu Azevedo Marques, 3.596, Butantã

Tel: (11) 3768-1523

SAE Lapa - Rua Tomé de Souza, 30, Lapa

Tel: (11) 3832-2551

ZONA LESTE

SAE Fidélis Ribeiro - Rua Peixoto, 100, Vila Fidélis Ribeiro

Tel: (11) 2621-4753

CTA São Miguel - Rua Engenheiro Manoel Osório, 151, São Miguel Paulista

Tel: (11) 2297-6052

CTA Itaim Paulista - Rua Valente de Novais, 131, Itaim Paulista

Tel: (11) 2561-3052

CTA São Mateus – Avenida Mateo Bei, 838, São Mateus

Tel: (11) 2919-0697

SAE Cidade Líder II - Rua Médio Iguaçu, 86, Cidade Líder

Tel: (11) 2748-0255

ZONA SUDESTE

SAE Ceci - Avenida Ceci, 2.235, Sala 30, Planalto Paulista, Jabaquara

Tel: (11) 2276-9719

SAE Herbert de Souza - Avenida Arquiteto Vilanova Artigas, 515, Teotônio Vilela

Tel: (11) 2704-0833

SAE Penha - Praça Nossa Senhora da Penha, 55, Penha

Tel - (11) 2295-0391

SAE Vila Prudente - Praça Centenário de Vila Prudente, 108, Vila Prudente

Tel: (11) 2061-7836

SAE Ipiranga - Rua Gonçalves Ledo, 606, Ipiranga

Tel: (11) 2273-5073

 

Quem passa por Timothy Ray Brown jamais imagina que ele é a primeira pessoa na história a ter sido curada da Aids. O americano de Seattle, Washington, passou por um tratamento complexo e quase mortal para se livrar do HIV. Registrado na literatura médica como "Paciente de Berlim", Brown decidiu abandonar o anonimato em 2010 e mostrar ele mesmo ao mundo a própria a cura.

Brown esteve em São Paulo na semana retrasada para participar de uma convenção sobre HIV na USP. Na ocasião, ele conversou com a reportagem, contou sua trajetória e como lida com o fato de ser a primeira pessoa a ser curada da doença.

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Hoje não gosta de ser identificado como o "Paciente de Berlim". "Se os casos são realmente interessantes os cientistas têm de encontrar um modo de se referir àquela pessoa e identificar mais rápido de quem estão falando sem precisar expor o nome do paciente. Como o meu caso ocorreu em Berlim, me chamaram de o 'Paciente de Berlim', embora eu não seja de lá", diz. "Em 2010, decidi dizer ao mundo meu nome e mostrar meu rosto. Quando as pessoas ainda usam 'Paciente de Berlim' eu fico meio irritado. Basicamente, dei permissão para usarem meu nome e disse que estou ok com isso."

Aos 53 anos, Brown aparenta mais idade do que tem, mas traz também no olhar o brilho de quem decidiu viver. Ele enfrentou primeiro a Aids em meados de 1990, época em que ser infectado pelo HIV era uma sentença de morte. Depois, em 2006, descobriu ter leucemia que, embora não relacionada com a Aids, foi a chave para eliminar o vírus da doença.

Depois de tentar quimioterapia sem muito sucesso, Brown estava desenganado quando a equipe médica resolveu uma última tentativa, um transplante de medula. A sacada foi tentar combater não só a leucemia, mas também o HIV. O vírus precisa de uma proteína presente no sangue para se instalar e reproduzir. Ocorre que algumas pessoas não produzem essa proteína - uma mutação que os permite ser imunes ao vírus.

Estratégia

A estratégia inédita era tentar encontrar para Brown um doador de medula compatível e que tivesse aquela rara mutação genética. A ideia era destruir seu sistema imunológico e substituir a medula dele pela do doador, criando um novo mecanismo de defesa e exterminando não só a leucemia, mas também o HIV.

Embora tivesse recebido dois diagnósticos de doenças potencialmente mortais anteriormente e mantido a calma, Timothy revela que só quando estava sozinho no quarto do hospital e com o próprio sistema imunológico destruído é que começou a "enlouquecer". O grau de vulnerabilidade que sentiu foi tamanho que o fez perder a praticidade com que lidava com a vida.

A experiência deu certo para eliminar a Aids, mas a leucemia ainda não tinha sido derrotada. "Neste sentido, a Aids tinha sido 'fácil' curar... Não é realmente fácil curar, mas eles tinham feito isso, mas a leucemia foi bem mais difícil", lembra. Foi preciso fazer um novo transplante com o mesmo doador para combater o câncer.

O caso pioneiro de sucesso foi publicado em 2009 no periódico New England Journal of Medicine. Em março deste ano foi anunciado que a eliminação da doença tinha sido obtida uma segunda vez, no "Paciente de Londres".

Brown conta como se sente com o título de primeira pessoa curada da Aids. "Em algum momento eu já pensei... e eu estou compartilhando algo que nunca falei antes, exceto para meu namorado. Às vezes penso que se houver mais pacientes curados eu não serei mais tão importante. Mas quero que haja, sim, muito mais curas. Meus pensamentos negativos não estão em sincronia com o meu desejo mais profundo (de uma cura universal)." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Um homem britânico tornou-se o segundo adulto no mundo a ser curado da aids, após um transplante de medula óssea de um doador resistente ao vírus HIV, anunciaram seus médicos, preservando a identidade do paciente. É apenas a segunda vez desde o início da epidemia global de aids, nos anos 1980, que um paciente parece ter sido curado da infecção por HIV.

A notícia chega quase 12 anos depois do primeiro paciente que teria sido curado, e em circunstância parecida. O sucesso do tratamento aumenta as esperanças de que uma nova estratégia para a cura de pacientes com o vírus da aids seja possível.

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Os investigadores devem publicar o seu estudo nesta terça-feira na revista científica Nature. Publicamente, os cientistas estão descrevendo o caso como uma "remissão em longo prazo". Em entrevistas, a maioria dos especialistas confirma se tratar de uma "cura", com a ressalva de que é difícil saber como definir a palavra quando há apenas dois casos conhecidos.

Quase três anos depois de receber células-tronco da medula óssea de um doador com uma mutação genética rara que resiste à infecção pelo HIV - e mais de 18 meses depois de largar as drogas antirretrovirais -, testes altamente sensíveis mostram que até agora não há vestígio da infecção por HIV no paciente tratado.

"Não há vírus lá que consigamos medir. Não conseguimos detectar nada", disse Ravindra Gupta, professor e biólogo especializado em HIV da Universidade de Cambridge que liderou uma equipe de médicos que trataram do homem. O paciente contraiu o HIV em 2003, disse Gupta, e em 2012 ele foi diagnosticado com um tipo de câncer no sangue chamado Linfoma de Hodgkin.

Apesar da esperança, os médicos alertaram que o resultado não significa que uma cura para o HIV tenha sido encontrada. Gupta descreveu seu paciente como "funcionalmente curado" e "em remissão", mas advertiu: "É muito cedo para dizer que ele está curado".

O homem está sendo chamado "o paciente de Londres", porque seu caso é semelhante ao primeiro caso conhecido de uma cura funcional do HIV - em um homem americano, Timothy Brown, que ficou conhecido como o paciente de Berlim - onde foi submetido a tratamento semelhante, em 2007.

Brown, que vivia em Berlim, mudou-se para os Estados Unidos e ainda está livre do HIV. Cerca de 37 milhões de pessoas em todo o mundo estão infectadas com o HIV, e a pandemia de aids matou cerca de 35 milhões de pessoas em todo o mundo desde que começou, na década de 1980. (com agências)

Pela segunda vez no mundo, um paciente viu diminuir sua carga de vírus HIV-1, causador da aids, e é provável que tenha sido curado, anunciaram, nesta terça-feira (5), os pesquisadores.

Dez anos após o primeiro caso confirmado de uma pessoa infectada que se livrou da doença, um homem conhecido apenas como "o paciente de Londres" não mostrou sinais do vírus por quase 19 meses após passar por um transplante de medula óssea e tratamento, informaram os pesquisadores na revista Nature.

Ambos os pacientes foram submetidos a um transplante de medula óssea para tratamento de cânceres no sangue, recebendo células-tronco de doadores com uma mutação genética incomum que impede que o HIV se entrincheire.

"Ao alcançar a remissão em um segundo paciente usando um método semelhante, mostramos que o 'paciente de Berlim' não era uma anomalia", declarou o autor do estudo, Ravindra Gupta, professor na Universidade de Cambridge, mencionando a primeira pessoa curada.

Milhões de pessoas infectadas com o HIV em todo o mundo mantêm a doença sob controle com a chamada terapia antirretroviral (ARV), mas o tratamento não elimina o vírus dos pacientes. "Neste momento, a única maneira de tratar o HIV é com drogas que retardam o vírus, que as pessoas devem tomar durante toda a vida", disse Gupta.

"Isso representa um desafio particular nos países em desenvolvimento", onde milhões ainda não recebem tratamento adequado, acrescentou. Quase 37 milhões de pessoas vivem com o HIV em todo o mundo, mas apenas 59% recebem ARV.

Quase um milhão de pessoas morrem todos os anos por causas relacionadas ao HIV, além da crescente preocupação com uma nova forma de vírus resistente aos medicamentos.

Gupta e sua equipe enfatizaram que o transplante de medula óssea, um procedimento perigoso e doloroso, não é uma opção viável para o tratamento do HIV.

Mas um segundo caso de remissão e possível cura após um transplante desse tipo ajudará os cientistas a reduzir a gama de estratégias de tratamento, disseram.

- 'Cura factível' -

Tanto o paciente de Londres quanto o de Berlim receberam transplantes de células-tronco de doadores portadores de uma mutação genética que impede a expressão de um receptor do HIV conhecido como CCR5.

"Encontrar uma maneira de eliminar completamente o vírus é uma prioridade global urgente, mas é particularmente difícil porque o vírus se integra aos glóbulos brancos", explicou Gupta.

O estudo descreve um paciente anônimo do sexo masculino da Grã-Bretanha que foi diagnosticado em 2003 e que está em tratamento antirretroviral desde 2012.

Naquele mesmo ano, ele foi diagnosticado com linfoma de Hodgkin avançado, um câncer mortal. Ele passou em 2016 por um transplante de células-tronco hematopoiéticas de um doador com duas cópias de uma variante do gene CCR5, portada por aproximadamente 1% da população mundial.

O CCR5 é o receptor mais usado pelo HIV-1. As pessoas que têm duas cópias mutadas do CCR5 são resistentes à maioria das cepas do vírus HIV-1, o que frustra as tentativas do vírus de entrar nas células.

Assim como o câncer, a quimioterapia pode ser eficaz contra o HIV, porque mata as células que estão se dividindo. Mas a substituição de células imunitárias por aquelas que não possuem o receptor CCR5 parece ser a chave para evitar que o HIV se recupere após o tratamento.

Após o transplante de medula óssea, "o paciente de Londres" permaneceu em tratamento ARV por 16 meses, quando foi descontinuado. Desde então, testes regulares não detectaram carga viral no paciente.

"O paciente de Berlim", que mais tarde foi identificado como Timothy Brown, tratado para leucemia, recebeu dois transplantes e foi submetido a irradiação total do corpo, enquanto o paciente britânico recebeu um transplante e apenas a quimioterapia menos intensiva.

"Não queria ser a única pessoa no mundo que foi curado de HIV", escreveu Brown em uma revista médica em 2015. "Quero dedicar minha vida para apoiar a pesquisa e encontrar uma cura para o HIV".

A equipe de pesquisa apresentará os resultados em uma conferência em Seattle (noroeste dos Estados Unidos).

"O segundo caso reforça a ideia de que é possível encontrar uma cura", disse à AFP Sharon R Lewin, diretora do Instituto Doherty Peter para Infecções e Imunidade da Universidade de Melbourne.

"Um transplante de medula óssea como uma cura não é viável. Mas podemos tentar determinar qual parte do transplante fez a diferença e permitiu que esse homem parasse de tomar seus medicamentos antivirais".

No próximo domingo (17), a partir das 14h, o trailer do Projeto Quero Fazer vai disponibilizar testes rápidos de HIV e sífilis, além de preservativos, na praça do Marco Zero, localizada na Região Central do Recife. A parceria com o Programa Estadual de IST (infecções sexualmente transmissíveis) /Aids vai atender até 70 pessoas.

Além dos testes, que duram em média 30 minutos, os pernambucanos e turistas vão receber aconselhamentos sobre saúde sexual. Caso seja diagnosticado, o paciente será encaminhado para uma unidade de referência, onde iniciará o tratamento. Vale lembrar que os exames já são disponibilizados em diversos postos de saúde do município, Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA) e ONGs.

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Testes gratuitos de HIV e sífilis serão oferecidos nesta semana em Jaboatão dos Guararapes, Região Metropolitana do Recife (RMR). O Programa Estadual de Infecções Sexualmente Transmissíveis da Secretaria Estadual de Saúde (SES) promove os exames nesta terça (22) e na quinta-feira (24). As avaliações serão feitas das 9h às 13h.

Nesta terça, o ônibus ‘Prevenção para Tod@s’ está na Praça Ministro Marcos Freire, no bairro de Marcos Freire. Já na quinta, ele estaciona na área de lazer abaixo do Viaduto de Prazeres. Ao todo, 50 pessoas serão atendidas por dia.

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A ação da prefeitura do município em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), também vai entregar preservativos e sachês de gel lubrificante. Os testes duram cerca de 30 minutos, pois, além do exame, os populares receberão aconselhamento. Em casos positivos, o paciente será encaminhado para o tratamento em alguma unidade de referência.

A importância do diagnóstico precoce

Com 536.825 testes de HIV realizados até setembro de 2018, a gerente do Programa Estadual de IST/Aids/HV da SES Camila Dantas, relatou sobre a importância do diagnóstico precoce e onde são feitos os exames no dia-a-dia. “Os testes rápidos estão disponíveis nos postos de saúde, nos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA) e em outras unidades de saúde, como maternidades e UPAs. Quanto mais rápido o diagnóstico, mais rápido o início do tratamento. Isso é essencial para dar qualidade de vida para a população vivendo com HIV, para tratar a sífilis e as hepatites virais”, reforçou.

Cerca de 80 jovens morrerão todos os dias de AIDS até 2030, caso o avanço da prevenção da transmissão não for agilizado, de acordo com o relatório “Crianças, HIV e AIDS: O Mundo em 2030”, publicado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).

Segundo o estudo, 3 milhões de pessoas com 19 anos ou menos estão infectadas com HIV no mundo e mais da metade das crianças que morrerão de AIDS não chegarão aos cinco anos de idade, principalmente em casos de transmissão de mães para bebês.

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Nos últimos oito anos, o número de infecções caiu 40%, porém as meninas representam dois terços de todas as infecções por HIV entre adolescentes. A meta global da ONU é assegurar que o número de crianças infectadas com a doença não ultrapasse 1,4 milhão até 2030. A taxa planejada a partir do trabalho da saúde pública é de 1,9 milhão. Dois milhões de novas infecções podem ser evitados até 2030, se compromissos internacionais forem cumpridos, estima o fundo da ONU.       

Neste sábado (1º), Dia Mundial de Luta Contra a Aids, o deputado federal Jean Wyllys (Psol) voltou a causar ao afirmar por meio das redes sociais que há uma tentativa de destruir o programa de combate ao HIV/AIDS no Brasil.

Segundo ele, o programa sofreu um impacto negativo, principalmente após o golpe parlamentar de 2016 e afirmou, também, que houve negligenciamento no governo Michel Temer.

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"A perspectiva para o futuro não são as melhores", alertou. Jean também disparou contra o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). "O fascista que se elegeu presidente, apesar de todos os nossos alertas, já declarou anteriormente em entrevistas que o poder público não deve custear o tratamento das pessoas com HIV, que cada indivíduo deve se virar por conta própria, tirar do seu bolso e correr atrás dos medicamentos", pontuou.

"O futuro ministro da saúde que integrará esse governo desastroso já declarou que não acredita na efetividade das campanhas de prevenção e educação continuada em escolas ou unidades básicas de saúde, que o combate e prevenção ao HIV deve se restringir ao âmbito familiar", complementou.

O deputado reeleito também pontuou que era necessário somar esforços para salvar o programa em defesa da dignidade das pessoas convivendo com o HIV. "Temos que defender, sobretudo, a saúde pública do nosso país", finalizou.

Uma reportagem especial do LeiaJá, elaborada pela repórter Eduarda Esteves, destaca que o país tem registrado, anualmente, uma média de 40 mil novos diagnósticos de Aids nos últimos cinco anos. Apesar disso, houve uma redução de 16% no número de detecções nos últimos seis anos. A matéria aborda a luta de uma recifense desde a descoberta da Aids.

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--> Famosos que perderam a luta contra a Aids

Há 30 anos, em 1⁰ de dezembro é celebrado o Dia Mundial de Luta Contra a Aids. A data foi instituída em 1987 pela Assembleia Mundial de Saúde e Organização das Nações Unidas (ONU), para buscar mais solidariedade a quem foi infectado pelo HIV/Aids. A Aids (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) é causada pelo vírus do HIV e acomete o sistema imunológico. De 1980 a junho de 2018, foram identificados 926.742 casos da doença no Brasil. O país tem registrado, anualmente, uma média de 40 mil novos diagnósticos de Aids nos últimos cinco anos. Apesar disso, houve uma redução de 16% no número de detecções nos últimos seis anos.

De acordo com o Boletim Epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde, em 2017, quando analisada a taxa de mortalidade nos estados, Pernambuco tem números acima da média nacional, que foi de 4,8 óbitos por 100 mil habitantes, e também lidera os casos no Nordeste, tendo uma taxa de óbitos entre soropositivos de 5,6. Dados divulgados pelo Grupo de Trabalhos em Prevenção Posithivo (GTP)+ apontam que no Estado, uma média de duas pessoas morrem por dia com a doença e a cada seis horas uma contrai o vírus.

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A pernambucana Maria da Silva*, que nesta reportagem ganhou nome fictício, se tornou parte dessas estatísticas assustadoras; há 22 anos precisou criar uma rotina e foi informada de que seria para a vida toda. Todos os dias, todas as manhãs, ela se levanta, pega um copo de água e coloca goela adentro três comprimidos responsáveis por manter o seu corpo funcionando bem. “Eles me dão anos de vida e mais tempo com os meus filhos”, garante a diarista, que aos 18 anos foi diagnosticada como portadora do vírus HIV, oito dias após ter dado a luz a um de seus oito filhos.

Aos 40 anos, a recifense sente que já viveu dez décadas e renasceu várias vezes. Ganhou chances de resistir aos problemas que enfrenta por ter o vírus. Se viu no limite entre a vida e a morte ainda jovem, deitada na cama de um hospital habitado por estranhos, sem a presença dos parentes ao seu redor. Perdeu as contas de quantas vezes precisou ser socorrida, caiu doente e tudo se repetiu. O semblante de Maria na década de 1990, na época da descoberta, era esmorecido. “Fui abandonada pela minha mãe e a família. Achavam que eu estava com a pior doença do mundo, não tive apoio. Colocavam água quente no meu lençol como se eu fosse uma indigente”, lamenta.

Aos 40 anos, a recifense sente que já viveu dez décadas e renasceu várias vezes. Ganhou chances de resistir aos problemas que enfrenta por ter o vírus. Foto: Júlio Gomes/LeiaJáImagens

A vida de Maria nunca foi fácil, mas os percalços aumentaram quando aos nove anos, a mãe se separou de seu pai e ele a abandonou com 15 filhos para criar. Era maria e mais 14 irmãos que vagavam nas periferias do Recife procurando o que comer. Desde então, passaram muitos padrastos e todos molestavam ela e as suas irmãs. “Passei pouco tempo com minha mãe na infância porque vivia fugindo de casa, não gostava deles, era abusada. Fui muito danada e sempre fugia de casa, não aceitava aquilo”, relembra.

Não restaram tantas escolhas senão ir morar na rua. Arrumava confusões, se escondia, foi levada para a Fundação do Bem Estar do Menor, na época a Febem, atual Funase e aos 14 anos saiu de lá após uma rebelião. “Prometi a deus e a mim de que nunca mais cairia naquele lugar. Só queria estar ali porque tinha alimentação e um dormitório. A rua era muito violenta, mas não queria estar encarcerada, eu tinha vontade de viver”, detalha.

Maria vagava pelo Recife, teve filhos, engravidou de novo, se mudou para o Rio de Janeiro e foi morar em um colégio interno para grávidas. Por lá, passou três anos, não se recorda bem o tempo, mas nunca se acostumou com a estadio dos cariocas. Eram rudes, preconceituosos e não havia emprego por lá. No Recife, precisou se prostituir nas esquinas para alimentar seus filhos porque era uma forma de conseguir um trocado com o corpo.

Grávida de cinco meses de uma das filhas, ela foi orientada a fazer um exame de HIV pelo seu histórico de vida sem muitos cuidados, principalmente nas relações sexuais. Mas, na época, o exame demorava para ser entregue pelo serviço público e foi liberado quando ela já estava amamentando a pequena há oito dias.

Foram meses de espera e o resultado positivo trouxe espanto por Maria não saber do que se tratava o vírus, perigo e o medo do futuro. “Ainda me lembro, os médicos me orientaram a parar imediatamente de amamentar a minha filha e por um milagre divino ela não foi infectada pela doença. Considero isso um livramento porque pelo leite eu poderia ter passado algo que odeio ter para a minha filha, sem culpa alguma nisso”. Ela não sabe com quem pode ter pego a doença, mas admite que a vida desregulada e sem cuidado tem poucos caminhos possíveis, sendo um deles esse.

Pouco tempo depois, Maria passou a tomar a medicação e desde então não pode esquecer nenhum dia dos remédios, com quem tem uma relação de ódio e amor. “Sei da importância dos comprimidos, mas as vezes passamos por muita humilhação, sabe? Eles têm um efeito colateral muito forte e causam enjoos e tontura”, conta. Ela se refere ao período em que ainda trabalhava fazendo faxinas na casa de algumas pessoas, mas sempre que tomava a medicação, passava mal e precisava largar mais cedo. “Eles ficavam desconfiados e sempre descobriam do HIV de alguma forma. E aí, eu me sentia presa na doença porque mais uma vez era mandada embora, humilhada”.

Na comunidade onde vive, o assunto ainda é um tabu. Maria é mulher negra, moradora de periferia, pobre e portadora do HIV. Foto: Júlio Gomes/LeiaJáImagens

São 22 anos convivendo com o preconceito ao seu redor, alimentando a esperança de que um dia a cura será viabilizada para todos, sem a interferência da indústria farmacêutica. Maria encara a vida como uma batalha a cada dia, ao acordar agradece pela vida e por ter filhos companheiros ao seu lado. “Eles nunca me abandonaram. Tenho muito orgulho disso e sempre procuro explicar que eles também precisam se proteger ao ter relações sexuais. O mundo é difícil e tem muita maldade”.

Na comunidade onde vive, o assunto ainda é um tabu. Maria é mulher negra, moradora de periferia, pobre e portadora do HIV. Ela mora em uma casa de um só vão e logo na entrada, onde fica a cozinha, já conseguimos enxergar o quarto, bicicletas no teto, panelas penduradas nos canos e fios expostos. As paredes laterais são coladas com as dos vizinhos e a espessura que as divide é pequena. Por isso, a família evita falar alto sobre Aids, HIV e medicações para os outros moradores do beco não descobrirem a doença. “Sei que eles desconfiam, mas eu tenho medo de retaliações, de rejeição, assim como aconteceu com a minha família quando eu era jovem. Prefiro me preservar”, explica.

Após ser diagnosticada com HIV, Maria da Silva nunca conseguiu um emprego formal. O sonho de ser auxiliar de cozinha, no entanto, ainda é vivo e ela pretende batalhar para conseguir um espaço em algum restaurante da cidade. Recentemente, ela fez um curso com duração de seis meses para se especializar na área, voltou a estudar e está aprendendo a ler e escrever em um colégio do bairro. “Já sei escrever até meu nome”, revela. Mas, na última tentativa em uma cozinha, foi informada de que por conta de sua aparência não seria aceita. “Meus dentes estão todos quebrados, tenho muitas bolhas no braço, também. Mas é tudo por causa do HIV, da diabetes e das sequelas que fiquei das vezes que quase morri nos hospitais”.

Ter as portas abertas de algum empreendimento realizaria um dos sonhos de Maria para poder dar uma melhor condição de vida aos filhos e netos. Hoje ela consegue se manter com o benefício que conseguiu do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), um salário mínimo e com o auxílio de ONGs que ajudam pessoas positivas em Pernambuco. “Tem época que a medicação falta no Estado e a gente fica aqui doido. Aí como conhecemos muitos amigos que também se tratam, pegamos emprestado porque a gente não pode ficar sem. Meu corpo estoura, a minha imunidade fica muito baixa, pego doenças oportunistas como a pneumonia e minha vida não segue”.

Nascida de sete meses, ela avalia que é impaciente e após sofrer tanto na vida, perdeu um pouco a fé na empatia das pessoas ao seu redor. “Hoje em dia eu nem tento mais explicar que Aids e HIV não são bichos, são completamente controlados por remédios. Ninguém quer saber, prefiro me resguardar porque a vida me tornou essa pessoa dura, não tenho mais paciência”.

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— Eles me bateram bastante e me levaram para o Cotel. E lá, quando eu entrei, nem os agentes penitenciários tiveram a sensibilidade de me informar porque eu estava encarcerada. Eu só descobri que era traficante quando procurei um canto para dormir na cela e os outros presos pediram a minha “nota de culpa” e eu entreguei o papel. Nele dizia que eu tinha sido presa em flagrante em posse de R$ 32 e 18 pedras de crack.

Há oito anos, Cleide Gomes*, que nesta reportagem ganhou nome fictício, hoje com 26 anos, era presa e nem imaginava que passaria pelo pior pesadelo da sua vida. Ela trabalhava como profissional do sexo nos principais pontos de prostituição do Recife, sempre migrando. Em uma dessas temporadas, optou por trabalhar no centro da capital pernambucana e o local ficava próximo a pontos chave do tráfico de drogas, além de ser violento. Para que as profissionais se sentissem mais seguras, elas se organizavam e pagavam R$ 50 cada para policiais que faziam a ronda na área ficarem de olho.

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Mas, Cleide relembra que o clima nunca foi tão amistoso com os agentes públicos, eles a revistavam, escolhiam algumas para bater, levavam na cadeia e depois soltavam. Em uma dessas abordagens, uma policial mulher começou a revistar o corpo de Cleide. Ela a apalpava em todos os locais do corpo e quando chegou na região da genitália, descobriu que a profissional do sexo era uma mulher travesti e ficou indignada. “Eles não perguntavam nada, só vinham, começavam a tocar os nossos corpos e a gente era obrigada a aceitar tudo. A policial ficou muito irritada por ter tocado no meu pinto sem saber e começou a me bater, me bateram muito e cortaram o meu cabelo”, relembra Cleide.

Cleide entrou para o mundo da prostituição ainda jovem, não sabia que travesti podia fazer outra coisa". Foto: Chico Peixoto/LeiaJáImagens

Pouco tempo depois do ocorrido, ela tentou firmar um acordo com as outras travestis que trabalhavam na região, de que não iriam mais pagar nenhum centavo aos policiais, já que eles estavam batendo nelas e atrapalhando o desenrolar do local de trabalho das mulheres. “Eu lembro que nem todo mundo concordou, algumas meninas continuaram a pagar aos guardas e a gente dava nelas. Eu ficava revoltada e isso começou a ser percebido por eles, que eu batia de frente e colocava a minha voz sem medo nenhum”, destaca Cleide, admitindo que ir de encontro a voz da polícia para quem é marginalizado é muito perigoso.

Em uma dessas noites, de acordo com Cleide, como ela já estava “marcada” pelos agentes, foi algemada e apanhou muito. Depois, foi levada a central de plantões e logo em seguida presa. Cleide sempre alegou inocência e afirmava rotineiramente que nunca tinha traficado e seu trabalho era outro.

Encarcerada, para ela injustamente, sem direito a nenhuma voz, começou a perder as esperanças no Estado e na Justiça. Passou a encarar a nova realidade como parte de sua rotina e aceitou por algum tempo que seu futuro seria na prisão.

Cleide entrou para o mundo da prostituição ainda jovem, não sabia que travesti podia fazer outra coisa. Ao contar a família que queria viver como travesti foi expulsa de casa e passou a morar na rua com outras colegas. Aos 15 anos, encontrou uma transgênero e se identificou. “Ela me disse que se eu quisesse ser mesmo, meu único trabalho era programa. Eu me vi nela, percebi que isso era eu. Também queria aquela aparência de mulher. Foi aí que comecei a modificar o meu corpo. Tinha acabado o ensino médio e na época fui aprovada no vestibular para cursar enfermagem”, cita.

A família dela nunca a aceitou bem e apesar de seu companheiro na época não ter gostado da sua escolha, teve de conviver com ela. “Ele foi o meu primeiro e único amor. Mas mesmo com o olhar estigmatizado da travesti, eu quis ser”. Trabalhou em Pernambuco, em outros estados e também na Europa. Em uma semana boa e movimentada, Cleide conta que chegava a apurar R$ 15 mil. “Eu confesso que sempre quis sair da vida de fazer programa, mas eu não via outras alternativas. Travesti não podia ter emprego formal. As pessoas eram e ainda são preconceituosas. É só olhar ao redor e contar quantas estão atuando profissionalmente em áreas distintas”. lamenta.

Em 2010, assim que foi presa, ela relata que para sobreviver na prisão, precisava realizar trabalhos tipicamente femininos, na lavagem de roupas, na massagem de outros presos e também se prostituindo para ter onde dormir. Mas, por ela ter o curso técnico de enfermagem, conseguiu certo “privilégio” trabalhando nas enfermarias dos presídios. Foi transferida muitas vezes, sempre que acontecia uma rebelião, a levavam para outro presídio e a colocavam na enfermaria.

Após dois anos presa, Cleide foi transferida para o antigo presídio Aníbal Bruno, hoje transformado no Complexo Prisional do Curado, na Zona Oeste do Recife. Ela e mais duas travestis foram colocadas dentro de uma cela com mais de cem homens. Eram 103 pessoas dividindo um espaço minúsculo, em que não mal cabiam vinte presos. “Quando eu cheguei, o preso mais velho da cela, geralmente é o mais respeitado, me deu a mão, me ofereceu um canto para dormir e consegui até comer. Durante o dia ele foi gentil comigo e me preservou”. Ela detalha ainda que não imaginava que seria estuprada.

“De início, eu não fiquei preocupada quando fui colocada com mais duas travestis para uma cela com cem homens. Eu tinha certa ascensão lá dentro, trabalhava e era de certa forma respeitada, eles me conheciam e não imaginei que fossem me fazer mal. Mas, mesmo assim, pedi aos agentes que não deixassem nós três lá. Não adiantou”, conta. Cleide relembra que a noite se aproximou muito rápido e detento mais velho da cela a segurou pela mão e disse que queria ter relações sexuais.

“Eu não queria. Entrei em uma briga corporal e ele me furou com um pedaço de madeira. Fiquei toda machucada e cedi. Ele me estuprou a noite toda, por vários dias. Ele gostava da minha aparência feminina, era um objeto sexual. Ele me preservava porque me queria só para ele, apesar de outros homens também me estuprarem. As outras meninas também estavam sendo abusadas. Foi um pesadelo e não tinha o que ser feito. Tive que aceitar”.

Cleide relembra que quando retornou à cela após a triagem, apontou o homem que a estuprava todas as noites e foi informada pela enfermeira: “ele é soropositivo”. Foto: Chico Peixoto/LeiaJáImagens

Após vários dias de estupro, uma das travestis apresentou uma fissura anal de tanto ter relações com os outros presos e o sangramento de uma levou as três mulheres à sala da enfermaria para realizar uma triagem. Elas denunciaram a situação que acontecia nas noites, dentro da cela. “Estavam trancafiadas por vinte dias sendo molestadas. Eu contei a enfermeira e pedi para que saíssemos daquele local. A gente podia ser transferida. Mas nada foi feito. Mais uma vez. Naquela época não tinha pavilhão específico para LGBTs”.

Cleide relembra que quando retornou à cela após a triagem, apontou o homem que a estuprava todas as noites e foi informada pela enfermeira: “ele é soropositivo”. A gestão do presídio nada fez, no entanto. Sem muita informação dos processos que poderiam ser adotados após se expor à prática sexual sem preservativos, o corpo de Cleide começou a enfraquecer alguns meses depois. “Eu não sabia dos métodos que poderiam ser aplicados a mim, como hoje conheço a PEP*. Mas eles existiam. E era obrigação do Estado me proteger. Eles falharam comigo. Os presos continuaram me estuprando e eu não podia me prevenir, achava que era o meu fim”, lamenta.

*PEP – Profilaxia Pós-Exposição – é o uso de medicamentos antirretrovirais por pessoas após terem tido um possível contato com o vírus HIV em situações como: violência sexual; relação sexual desprotegida (sem o uso de camisinha ou com rompimento da camisinha), acidente ocupacional (com instrumentos perfurocortantes ou em contato direto com material biológico). A PEP deve ser iniciada logo após a exposição de risco, em até 72 horas; e deve ser tomada por 28 dias.

Ainda no ano de 2012, Cleide descobriu que estava infectada pelo HIV e caiu em depressão. Continuou na cela com os mesmos homens até o fim do ano. “Não tive o acompanhamento básico, não conseguia me prevenir, não tive tratamento humanizado e só comecei a tomar a medicação alguns meses depois do diagnóstico sair”, relata. Seu corpo era usado todos os dias. Ela só conseguiu observar um futuro diferente quando conheceu Maria Clara, agente de direitos humanos do Projeto Mercadores de Ilusão, que promove a prevenção, a cidadania, o protagonismo e autonomia dos profissionais do sexo, bem como tem representações em instâncias e espaços de controle social, atuando na promoção dos direitos humanos.

No cárcere, Cleide conheceu Clara e pela primeira vez descobriu que uma travesti também podia trabalhar muito além da prostituição. “O projeto me ajudou muito a conseguir realizar exames e ganhar os medicamentos de forma correta, além de explicar o que eu tinha, como deveria me tratar e trabalhar para eu me aceitar e seguir em frente”, analisa.

Três anos se passaram e quando Cleide já estava desacreditada na inocência, em 2013, conseguiu ser absolvida da pena e foi liberado. Após uma investigação, descobriram a filmagem de uma câmera de segurança de um hotel na rua onde a travesti foi presa em flagrante. As imagens mostravam que os policiais roubaram a bolsa dela e colocaram o dinheiro e a droga para forjar o crime de tráfico. “Assim que fui inocentada, eu comecei a processar o Estado. Fui presa injustamente, fui estuprada e infectada com HIV. Sofri muito”.

Decidida a ganhar a causa, Cleide precisou deixar de lado o processo porque recebeu visitas intimidadoras dos policiais que participaram da sua prisão, já que eles conseguiam o endereço que ela residia com facilidade. Fora da prisão, voltou a morar com seu companheiro de vida e conseguiu um trabalho fixo com carteira assinada, que preferiu não detalhar para não se expor.

No segundo semestre de 2018, ela estava indo visitar o marido no cárcere e enquanto aguardava a liberação do lado de fora do presídio, foi atingida por um tiro no centro do peito. Foto: Chico Peixoto/LeiaJáImagens

Oito anos depois, ela conta que parou de trabalhar como profissional do sexo para se preservar porque as pessoas soropositivas precisam de uma vida mais regrada e com mais cuidados. Ainda sente muita dor ao olhar para o passado e converte a revolta de seu corpo em militância na causa LGBT e no movimento Aids, a quem ela considera como único acolhedor nesse processo de descoberta e tratamento. “Eu tive a sorte de conhecer o GTP+, tiveram sensibilidade comigo e com meu corpo, era vista como ser humano”.

Tudo que aconteceu na vida de Cleide gerou muita revolta não só nela, mas também no seu marido, que hoje se encontra preso por cometer assaltos. “O sistema não é justo. Nossas ações muitas vezes liberam o nosso sentimento de raiva, por tudo que passamos”, comenta. No segundo semestre de 2018, ela estava indo visitá-lo no cárcere e enquanto aguardava a liberação do lado de fora do presídio, foi atingida por um tiro no centro do peito. “Eu estava sentada na kombi, esperando dar a hora de ir embora, quando começou um tiroteio. A bala entrou e não saiu”, conta. Ela foi socorrida, internada e conseguiram salvá-la. Ganhou uma cicatriz para se lembrar por toda a vida da posição que ocupa, à margem.

Mas isso não a fez uma pessoa fraca, pelo contrário, foram muitas situações difíceis que teve de enfrentar para estar viva e pronta para ajudar outras pessoas. “Eu aprendi muito sobre tudo, principalmente sobre a importância de se prevenir, de lutar pelos seus direitos e de entender que a vida pode ser tranquilamente vivida por uma pessoa soropositiva, mas o alerta tem que estar ligado a tudo. Porque a gente pode também decair muito rápido, se o tratamento não for seguido à risca”, finaliza.

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De 2007 até junho de 2018, foram notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) 247.795 casos de infecção pelo HIV no Brasil. Nesse período, o levantamento aponta um total de 169.932 (68,6%) diagnósticos em homens e 77.812 (31,4%) em mulheres. Embora qualquer um possa ser infectado pelo HIV, estão mais vulneráveis homens que fazem sexo com homens, mulheres trans, trabalhadores sexuais, jovens, pessoas que usam álcool e outras drogas e pessoas privadas de liberdade.

Em 2013, quando tinha 33 anos, o estudante Mauro Santos*, que nesta reportagem ganhou nome fictício, foi diagnosticado com o vírus em um dos exames rotineiros que fazia anualmente. Ele não preferiu se estender ao contar o contexto em que foi infectado, mas relembra que estava em um relacionamento sério com outro homem e que teria se tornado soropositivo através dele, por um descuido no preservativo.

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Mauro reconhece que estava em um grupo de risco, apesar da vivência em movimento social desde o ano de 2002, atuando na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, alertando sobre os perigos da Aids em escolas e ambientes de aprendizado. “Eu não era um completo ignorante. Eu sabia de tudo e aceitei o risco quando me expus ao meu companheiro na época”, diz.

"Ao receber a notícia, a sensação foi de desespero porque é algo que todo mundo está sujeito, mas ninguém quer para si. Eu procurei me recompor porque sabia da importância do meu psicológico para tocar a minha vida e foi o que eu fiz", relembra.

Mauro convive com o HIV há cinco anos e confessa já ter passado por altos e baixos. Ele iniciou seu tratamento no Hospital Correia Picanço, em 2014, para tomar a medicação e lhe foi informado que o melhor horário para se medicar seria à noite por causa dos efeitos colaterais. “A tontura é angustiante e mistura com a depressão, causa um desespero. Tive que fazer de tudo para que a minha mãe não percebesse. Em uma das minhas primeiras quedas, eu me sentia acabado, passei o dia mal. Era o início de tudo, estava me acostumando”, relata.

“Eu não era um completo ignorante. Eu sabia de tudo e aceitei o risco quando me expus ao meu companheiro na época”, diz. Foto: Rafael Bandeira/LeiaJáImagens

O estudante decidiu que não contaria a família sobre sua saúde porque tinha medo da reação deles e preferiu viver em silêncio sobre esse assunto. “Até hoje a minha família não sabe, e eu prefiro que seja assim porque é outra cultura, minha mãe já é mais velha e tenho receio dela não aceitar. Só quem sabe são poucos amigos porque precisei desabafar”.

Reconstruir a vida na condição de soropositivo é uma batalha diária porque a sociedade ainda é muito reativa quando se fala em Aids. E Mauro sentiu isso na pele. No último relacionamento que se envolveu, após duas semanas conhecendo melhor a outra pessoa, precisou revelar a sua condição de saúde porque a preocupação com o outro é fundamental para acabar com o HIV de uma vez. “Estava com esse homem e quando contei, o resultado não me surpreendeu. Ele preferiu se afastar e seguimos em frente no caminho oposto”, conta.

Muitas pessoas ainda acham que a doença pode ser transmitida pelo ar, no beijo, ou em um simples abraço. Mas longe dos gestos afetuosos transmitirem algo de ruim.  “O preconceito é algo que eu já sentia por ser gay, mas agora é duplo porque quando alguém fala algo negativo de um soropositivo, eu ouço e me sinto ofendido, mas nem sempre posso falar algo”, afirma.

O tratamento contra o HIV disponível atualmente no Sistema Único de Saúde (SUS) é um coquetel de três medicamentos responsáveis por inibir o máximo possível a reprodução do vírus no corpo, enquanto mantém o sistema imunológico atuante e protege contra infecções oportunistas.

Mauro relata que sabe dos riscos de ficar sem a medicação e condena o sistema de saúde de Pernambuco porque em 2018 foram no mínimo duas semanas com a medicação em falta. “A minha sorte foi que eu nunca deixo meus remédios acabarem, sempre pego antes. Então eu tinha certo estoque, mas muitos amigos me ligaram pedindo, desesperados sem saber o que fazer e a quem recorrer nessas horas”, comenta o estudante, que diz fazer parte de um grupo de WhatsApp para soropositivos trocarem informações e se ajudarem.

Um dos sonhos que ele carrega para diminuir o impacto da doença na sua vida é que criem uma vacina para tomar mensalmente. “Evitaria da gente ter que tomar as medicações todos os dias, vai ser muito melhor”, opina esperançoso.

Uma pesquisa internacional avaliou o efeito de injeções espaçadas de dois antirretrovirais em mais de 200 pacientes. Em dois anos, 87% dos que receberam a dose uma vez ao mês suprimiram o vírus. Mas, para que o estudo possa se expandir e se tornar seguro e efetivo, precisa passar por uma nova fase de pesquisas com um número bem maior de voluntários. Ainda não há expectativa para que seja aplicado ao mercado.

Aos 23 anos uma médica informou que o resultado do seu exame tinha sido reagente e que ele estava com o vírus. Foto: Chico Peixoto/LeiaJáImagens

O profissional do sexo José Carlos* - nesta reportagem ganhou nome fictício -, 27, que trabalho com o corpo desde os 14 anos, lamenta não ter conhecido a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV antes de ser diagnosticado com o vírus. O PrEP é o uso preventivo de medicamentos antes da exposição reduzindo a probabilidade da pessoa se infectar com vírus e pode ser utilizada por grupos de alto risco, gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH); pessoas trans; trabalhadores/as do sexo e parcerias sorodiferentes (quando uma pessoa está infectada pelo HIV e a outra não).

Não deu tempo. Aos 23 anos, uma médica informou que o resultado do seu exame tinha sido reagente e que ele estava com o vírus. José era casado e tinha uma filha. Quando decidiu contar a sua esposa, teve medo de dizer como poderia ter pego porque a prostituição era algo secreto e ela nem desconfiava. “Fui muito irresponsável, falei que tinha pego com alguma mulher porque tinha a traído na rua, mas não tive coragem de revelar a forma que ganhava dinheiro”, esclarece.

A mãe e o pai ficaram em choque, sem entender direito como seria a vida do filho daquele momento em diante, mas José sempre demonstrou tranquilidade porque fez pesquisas, passou a frequentar reuniões no GTP+ e em outras ONGs, e as conversas no ciclo de amigos próximos também o acalmavam. “A minha mãe ainda se preocupa muito comigo, quando saio para beber e perco noites de sono. A gente sabe que não pode exagerar porque a doença chega muito rápido. Mas minha mente sempre foi mais aberta, consigo me acalmar para poder tranquilizar quem está ao meu redor”.

José se considera heterossexual e que o fato de transar com homens em seu trabalho não altera sua sexualidade. “Gosto de mulheres, quero encontrar uma para que eu possa me apaixonar de novo, espero que ela me aceite. Mas, são negócios e mantenho relações sexuais com homens principalmente para sobreviver”. Ele conta que já frequentou saunas gays, cinemas, e pontos de prostituição por muitos anos, mas agora mantém um caso com um pastor de uma igreja evangélica que pediu “exclusividade”.

Mas, apesar disso, continua trabalhando com programa quando aparece alguma oportunidade. “É um trabalho que não tem crise, não abala, quem quer sexo vai procurar isso, eles pagam para isso. Quem me conhece, me procura porque gosta de mim. Mas sei que ficando velho, vou perder clientes e essa é a tendência, os mais novos são mais procurados”.

Mesmo sendo portador do HIV, ele diz que leva uma vida tranquila, saudável e sempre que vai fazer sexo, faz o uso da camisinha. Com os medicamentos que fazem parte do coquetel, as perspectivas de vida para soropositivos estão cada vez melhor. Pior mesmo é o preconceito que só aumenta. “O desconhecimento é muito grande, tenho medo de nunca conseguir casar de novo. É um assunto que parece um monstro para tantas pessoas e é tão simples de ser entendido. A gente sofre demais, mas não me entrego”, admite.

Para ele, os casos de HIV entre jovens aumentaram porque falta conscientização, principalmente nas periferias, em que o acesso a educação sexual é mais precário. “Muitas pessoas se drogam, precisam trabalhar com o corpo, e estão vulneráveis. O estado precisa intervir urgente e criar novas medidas mais eficazes para essa molecada ter mais conhecimento”, opina.

José não se arrepende de ter entrado na prostituição para se manter e por consequência ser infectado, mas sente mágoa de seu passado e presente e gostaria de largar o sexo por dinheiro de uma vez por todas. “Quero ter um trabalho como qualquer outro, uma vida mais digna, me cuidar mais. Só que nem tudo é tão simples assim, o dinheiro fácil é atrativo, mas da mesma forma que ele vem com facilidade, vai embora também”, analisa.

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— No velório do meu companheiro, a família dele jogou cal em seu corpo, lacrou o caixão com madeira e prego e pediu que ninguém tocasse nele porque tinha morrido com Aids.

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Emocionado ao relembrar um dos momentos mais difíceis de sua trajetória, Wladimir Reis, 58, hoje se tornou coordenador do Grupo de Trabalhos em Prevenção Posithivo (GTP+), fundado em 2000 por pessoas com HIV e seus familiares.

Na década de 1990, Wladimir Reis e o seu companheiro trabalhavam na mesma empresa no Porto de Suape, na cidade do Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife, em uma indústria náutica. Ele relembra que Alberto, seu namorado, era homossexual, mas havia casado com uma mulher porque ela tinha engravidado e eles precisavam manter a aparência para a sociedade. Longe dos holofotes, os dois eram só amores. Alberto gostava de se cuidar, era vaidoso, andava sempre com os cabelos arrumados e as unhas cortadas, se recorda Wladimir, em tom de saudosismo.

Em 1994, em três semanas, ele percebeu que Alberto estava mudado, com o físico abalado, sem se cuidar e o aspecto de doente. “Ele dizia que não estava legal, mas não sabia o que estava acontecendo. Eu também não tinha ideia do que estava por vir”, relembra. Poucos dias depois de perceber a mudança, ele recebeu a ligação da esposa de Alberto e foi informado de que ele estava passando mal. “Eu ainda me lembro, consegui um carro com a minha chefe na época, ela também me ajudou a marcar uma consulta em uma clínica no centro do Recife. Fui buscá-lo na casa dele o fomos direto para o consultório do médico”.

Alberto já não se locomovia, estava fraco. Quando o doutor fez a radiografia, apontou que o quadro de saúde era de pneumonia, mas que não era grave e que ele podia ir para casa. “Era uma sexta-feira e o médico me disse para levá-lo ao Otávio de Freitas na segunda-feira, e lá poderiam conseguir interná-lo, mas que ele ficaria bem”, destaca Wladimir.

E o procedimento que o médico informou foi seguido. Wladimir levou Alberto de volta à casa de sua família e teve que realizar uma viagem a trabalho para o interior de Pernambuco. Na segunda-feira, logo pela manhã, recebeu a ligação fatídica. A esposa de Alberto informava que ele faleceu a caminho do hospital. “Ele tinha uns 40 anos, era jovem e não teve tempo de chegar à unidade médica. Eu não acreditei porque foi tudo muito rápido. Fiquei desolado”, assume.

Na terça-feira, no retorno para o Recife para participar do velório de seu companheiro, Wladimir teve o primeiro contato com o preconceito contra Aids. Caixão lacrado, olhares desconfiados, ninguém podia chegar perto ou pelo menos essa era a orientação repassada pelos próprios familiares do falecido. “Ele morreu com Aids, não toquem”, diziam. Aquele dia foi marcante na trajetória de luta e resistência de Wladimir. “Considero o primeiro impacto com a doença. Eu não conhecia muito, só lia pelos jornais quando se falava da epidemia na Europa, não se falava disso no Brasil, a gente sabia muito pouco”, aponta.

Com a pouca informação da época, ele acrescenta que não tinha o menor preconceito com o corpo de seu amado, diferente da maioria das pessoas que passou pelo velório para prestar condolências aos familiares. “Ele não merecia isso, era trabalhador, tinha um bom emprego, dava uma boa condição financeira para a família, mas todos os desprezavam naquele momento de tristeza”, garante o coordenador do GTP+.

Passado os dias, Wladimir precisou retomar a vida e voltou a trabalhar em Suape. Mas logo percebeu que o futuro seria diferente, os olhares desconfiados não tinham sido enterrados junto ao corpo velado de Alberto. Eles permaneceram e permanecem até hoje. No trabalho, foi questionado por seus colegas se poderiam comer ao seu lado ou dar um simples abraço ou aperto de mão.

“Conheci outras pessoas com HIV e ela sofriam igual. Vi muitas delas subir no Hospital das Clínicas e pular. Foto: Chico Peixoto/LeiaJáImagens

“A sociedade começou a me matar aos poucos. Decidi ir ao Hospital das Clínicas e lá fui acolhido e me descobri HIV. Até a pessoa que tirava o meu sangue era um psicólogo e me tranquilizava. Ele sabia como era difícil estar com o vírus dentro de uma sociedade discriminatória. Foi aí eu criei forças para lutar e dar continuidade a minha vida e continuar escutando se eu podia comer no mesmo prato, tomar água no mesmo copo”, alega.

A Aids só começou a ser diagnosticada em 1981, pelo Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos, que anunciou a descoberta de uma infecção que afetava cinco homossexuais americanos. Eram os primeiros casos identificados de Aids, doença que se transformou no mal do século XX. No Brasil, os primeiros casos foram identificados em 1982.

Em contato com outras pessoas soropositivas, Wladimir passou a perceber que o preconceito não era só com ele. “Conheci outras pessoas com HIV e ela sofriam igual. Vi muitas delas subir no Hospital das Clínicas e pular. O peso é muito grande porque a gente vive em uma sociedade que não valoriza princípios e valores”, aponta.

Ao longo da década de 1990, os anos foram difíceis. Com o diagnóstico oficial de que era soropositivo, as pessoas começaram a ir embora de sua vida. Amigos que saíam para tomar cerveja, para ir à boate, foram sumindo. Todo mundo foi embora, não fosse pelo apoio dos avós, ele destaca que não sabe se teria suportado a dor.

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“Eu antes participava de uma instituição em que a gente se encontrava uma vez por semana em hospitais e na outra semana quatro, cinco tinham morrido. As pessoas diziam que iam se matar, logo que se descobriam positivas porque o afeto se perdia e não tinham esperanças”, relembra. Com a chegada do AZT, primeiro antiviral, nos anos 1990, as vítimas ganharam uma nova perspectiva de futuro.

Nessa época, Wladimir destaca que a Aids também começou a atingir os pobres, porque antes era algo propagado em classes mais ricas. “Daí, então, a comunidade começa a se organizar para enfrentar a epidemia junto a nova população que estava sendo acometida com o vírus. A gente montou um grupo de teatro porque era fácil de levar a mensagem com a arte cênica e interagir com diferentes classes sociais”, afirma.

Eles foram convidados para se apresentar em diversos locais na Região Metropolitana do Recife e no interior do Estado. “Nos deparamos com situações de mulheres que não podiam mais vender doces e salgados porque ninguém mais comprava já que elas tinham HIV. Pessoas proibidas de andar nos coletivos e nos carros de saúde dos municípios. Começamos a nos organizar”.

Em 2000, com o apoio de colegas, fundou o Grupo de Trabalhos em Prevenção Posithivo (GTP+), uma das primeiras ONGs a oferecer ajuda especializada em tratar o vírus no Nordeste. Wladimir lembra que uma instituição alemã apoiou a estruturação da ONG, doando equipamentos e verba para custos de aluguel.

O foco do atendimento ainda hoje é nos profissionais do sexo e pessoas vivendo com HIV em situação de vulnerabilidade social. Foto: Chico Peixoto/LeiaJáImagens

A instituição atende jovens, homossexuais, bissexuais, mulheres travestis, mulheres transexuais, mulheres cisgênero, pessoas vivendo com HIV/Aids, profissionais do sexo, priorizando pessoas em situação de vulnerabilidade social.

Nos últimos anos, no entanto, Wladimir afirma que o apoio internacional diminuiu bastante e eles dependem da abertura de editais municipais e estaduais para captar recursos para projetos no intuito de conseguir se manter. A sede do GTP+ fica no centro da capital pernambucana e atualmente se encontra com nove aluguéis atrasados, bem como a estrutura do primeiro andar está danificada. “Eu sinto que esse público marginalizado só é do interesse dos nossos políticos na época da eleição e não para construir políticas públicas de saúde, de educação”, lamenta. Mundialmente, existem agora mais de 17 milhões pessoas que vivem com HIV e com acesso a medicamentos antirretrovirais.

“A gente procura realizar eventos, promover o nosso bazar, pedir ajudar as entidades, mas está cada vez mais difícil. Atendemos pessoas aqui vulneráveis, que não tem nem passagem, nem dinheiro para se alimentar. O mundo diz que quer acabar com a Aids até 2030, mas da forma que as coisas andam, acho muito difícil. Não somos prioridade”, alerta Wladimir. Acabar com a epidemia de AIDS até 2030 é uma parte central dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. No Brasil, entre 2007 e 2016, foram registrados 136.945 novos casos de infecção por HIV.

De acordo com a gerente do programa estadual de IST/Aids e hepatites virais, Camila Dantas, da Secretaria Estadual de Saúde (SES), a gestão busca sempre dialogar com as ONGs e reconhece o trabalho dessas instituições na rotina de quem precisa desse acolhimento. Atualmente, Camilla aponta que apesar das denúncias no inicio deste ano, não há falta de medicamentos na rede estadual de distribuição.

Em Pernambuco, são 37 unidades especializadas na assistência à portadores de HIV/Aids que dispõem de equipe multiprofissional e oferecem o tratamento retroviral. "Aqui em Pernambuco a gente vem trabalhando bastante para uma detecção precoce do HIV. Porque se diagnosticado precocemente, a pessoa pode iniciar o quanto antes o tratamento e essa terapia retroviral no intuito de evitar que o quadro evolua para a Aids. Nossa inteção é que ela consiga alcançar a carga viral indetectável e passe a não transmitir o HIV".

Ainda de acordo com a SES, a PrEP está presente em todo o estado de Pernambuco nos hospitais de assistência especializada de HIV. "Atuamos na prevenção combinada, não só pensando no uso do preservativo, mas sim em uma série de estratégias que possam fortalecer esse diálogo, observando o estilo de vida de cada pessoa. Além do preservativo, temos a PEP e a PrEP para pessoas que se expõem bastante. Um equipe multiprofissional do estado analisa a melhor estratégia dependendo dos casos e da vulnerabilidade de cada pessoa. Outros pontos que a gente procura trabalhar é na quebra do preconceito. As pessoas podem viver com o HIV e não morrer com Aids. É preciso perder esse medo", afirma Camilla.

Sobre os altos índices no estado, a gerente do programa estadual de IST/Aids e hepatites virais alega que é preciso conversar ainda mais sobre sexualidade nas escolas. "A gente procura trabalhar com professores para que eles acolham esses alunos e sejam receptivos aos questionamentos desses estudantes", aponta. Ela destaca que a gestão estadual tem um projeto para 2019 de trabalhar diretamente com as gerências regionais de educação em todo o estado para fortalecer o diálogo entre professores e alunos. "Estamos desenhando o projeto de prevenção das infecções as escolas e a ideia é que ele saia do papel o quanto antes", conclui.

Na visão de Wladimir, a válvula de escape para sair desse labirinto da falta de apoio governamental e do alto índice de infecção no Estado é apostar no apoio coletivo e na sensibilização da sociedade civil. Ele assume que não há uma receita pronta para conseguir alcançar esses objetivos. “Talvez um caminho seja a quebra do preconceito, a humanização das pessoas soropositivas. Traçar um caminho em que o mundo se torne mais humano e habitável para os corpos diferentes. Enquanto isso, resistimos todos os dias, bravamente, lutando para viver”, finaliza.

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