Após 30 dias de uma processo de investigação com 452 fases e 21 pessoas ouvidas, foi concluído o inquérito de investigação do caso do garoto Miguel Otávio, de cinco anos, morto após cair do nono andar do edifício Píer Maurício de Nassau, no centro do Recife, e ser deixado sozinho no elevador por Sari Côrte Real, patroa de sua mãe, a doméstica Mirtes Renata Santana de Souza, que passeava com o cachorro da empregadora. O delegado Ramon Teixeira, que acompanha o caso, anunciou que Sari será indiciada por abandono de incapaz.
“Entendemos, de forma fundamentada nos autos, ser perfeitamente capaz o cometimento de um crime de abandono por uma conduta omissiva. O fechamento da porta do elevador [Sari retira braço e permite que o equipamento se feche] foi acachapante para a produção do resultado”, explica Teixeira. O delegado também frisou a previsibilidade do resultado morte. “60% das unidades condensadoras apresentavam tela de proteção, outras 40% não. Uma pequena maioria dos moradores enxergou os riscos da área. Não é difícil prever que, dentre incontáveis áreas sem redes, com escadarias, lajes técnicas desprotegidas, piscina, diversas seriam as formas de se alcançar o resultado morte indesejado, mas previsível”, completa.
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Através de uma animação, a perícia explica o caminho feito por Miguel. O garoto desce do elevador no nono andar, abre a porta corta-fogo, caminha pelo corredor, até encontrar uma janela à sua esquerda, que pula. Com isso, se vê em uma pequena área destrita de condensadores de ar diante de um gradil com função estética, no qual sobe e pula. “Dois funcionários confirmaram que ouviram por duas vezes gritos de criança pela mãe, de chamamento. Difícil estabelecer com precisão o que aconteceu, mas é perfeitamente possível que a criança tivesse visto a mãe com o cachorro da moradora na pista do edifício e inferir que o motivo pelo qual a criança chamou a mãe é diretamente decorrente do fato de ter sido abandonada”, coloca o delegado.
Embora a porta corta-fogo estivesse com as trancas quebradas e não houvesse tela de proteção no recinto adentrado por Miguel, o edifício e sua administração não serão responsabilizados. “Teriam levado ao mesmo resultado. O laudo deixou claro que não havia sido o sistema de travamento que teria impedido a criança de escalar [o gradil] e isso também reforça a previsibilidade”, completa Teixeira.
Segundo o perito do Instituto de Criminalística André Amaral, a morte de Miguel tratou-se de um evento de natureza acidental. “Era inviável a presença de outra pessoa no local. Houve desequilíbrio e precipitação da criança”, comentou.
O crime de abandono de incapaz está previsto no artigo 133 do código penal, “abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono”. Caso a conduta resulte em morte, a pena é de detenção, entre quatro e 12 anos.