O noticiário não parece indicar que a Venezuela seja um destino turístico cobiçado. No entanto, o voo da Copa Airlines que liga a Cidade do Panamá a Caracas parte lotado. Entre os passageiros, venezuelanos voltando, turistas indiferentes ao drama, movidos pelos preços atraentes dos pacotes de viagem, e caçadores de oportunidades de negócios.
A hipótese dos investidores é simples: se a Venezuela chegou ao fundo do poço, não seria hora de comprar imóveis e empresas baratas, que se valorizarão quando o regime mudar, ou discutir parcerias com empresários locais, para participar da bilionária reconstrução do país?
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"As oportunidades são muitas, sendo as mais óbvias no setor imobiliário, pelo fato de serem ativos reais performados com baixos riscos operacionais e extremamente depreciados", analisa Eduardo Vidal, sócio de uma empresa de investimentos em projetos estruturados para o mercado imobiliário, em São Paulo. Ele visitou Caracas com mais dois investidores brasileiros, no fim de semana retrasado, quando a oposição tentou fazer entrar a ajuda humanitária. "Ouvi sobre oportunidades a 15% do valor de face potencial."
Segundo a Câmara Imobiliária Metropolitana, o metro quadrado em Caracas caiu 84% entre janeiro de 2014 e setembro do ano passado. O corretor Gustavo Hernández cita o exemplo de um apartamento de 165 metros quadrados, que em 2014 valia US$ 200 mil, e hoje está à venda por US$ 85 mil - desvalorização de 57%. "Muitas pessoas que moravam nos bairros de classe média de Caracas foram embora do país", diz Hernández. "Se houver mudança, o mercado vai se recuperar. E um apartamento que estamos vendendo a US$ 85 mil talvez não chegue a US$ 200 mil, mas pode chegar a US$ 180 mil."
O corretor levou os três brasileiros para visitar apartamentos. Um deles, uma cobertura de 500 metros quadrados, numa área de classe média alta do bairro La Castellana. Segundo a proprietária, o apartamento valia US$ 1 milhão, mas ela está pedindo US$ 600 mil. "Quero comprar outro mais barato, para também aproveitar os preços baixos, e usar uma parte do dinheiro", disse a proprietária, que prefere não se identificar. O pagamento é feito em dólares, numa conta em banco venezuelano com agência nos Estados Unidos.
Ele mostrou também um condomínio com dez torres de apartamentos novos, no bairro de classe alta El Mirador de los Campitos. O que pode parecer surpreendente, considerando a paralisia e o caos econômico e político da Venezuela. Nesse, apartamentos de 300 metros quadrados estão à venda por US$ 900 mil.
A incorporadora HW, responsável pelo empreendimento, captou os recursos de empresas que investem em imóveis para proteger seu capital da desvalorização do bolívar frente ao dólar. "Como as empresas não podem repatriar capitais, para que os seus bolívares não percam todo o seu valor preferiram investir na construção civil", explica Hernández.
"Além disso, concessões de serviços públicos, como energia, saneamento, estradas e comunicação, também deverão ser atrativas", acrescenta Vidal. "Outra boa oportunidade será explorar as operações de turnaround e recuperação, em ativos de bens de consumo e bens de capital que pertenciam a multinacionais: recuperar e revender de volta para os antigos donos." Já o mercado financeiro "parece um pouco mais complicado em função da falta de estrutura e regras e das cartas bem marcadas", ressalva o investidor.
"As melhores oportunidades estão nas empresas paradas que requerem injeções de capital, as fábricas que pertenciam a multinacionais e, especialmente, imóveis", sugere o advogado Pedro Urdaneta, especialista em fusões e aquisições do escritório Imery Urdaneta, que também se reuniu com os brasileiros.
"Há todo tipo de empresas fechadas ou que estão operando a um mínimo de capacidade", acrescenta ele. "As primeiras que vão experimentar crescimento são as que estejam associadas aos setores do Plano País: petróleo, alimentos, indústrias", diz Urdaneta, referindo-se à proposta elaborada por 200 técnicos para um governo pós-chavista. O consultor garante que "há boas marcas à venda e com avaliações muito atraentes", mas pede que os nomes das empresas não sejam publicados, por sigilo profissional.
"Claramente existe oportunidade de investimento em alguns ativos, como imóveis comerciais e residenciais, galpões e empresas que estão praticamente inoperantes, por falta de matéria-prima", avalia outro investidor do grupo de brasileiros, que trabalha no mercado financeiro, e pediu para não ser identificado. "Se tomássemos hoje a decisão de correr o risco, compraríamos por volta de 20% do valor de cinco anos atrás", calcula ele. "Mesmo que não recupere todo o preço, o ganho é grande."
O que desencoraja esse investidor, neste momento, é que "a solução política pode não ser tão simples". Eduardo Vidal concorda: "O dia seguinte de um novo governo deverá ser ainda mais desafiador do que apenas chegar lá. Demandará muito tempo para se atingir um mínimo de estabilidade empresarial".
O outro investidor observa que a maior parte dos pagamentos por imóveis e por empresas é feita fora da Venezuela. "Muito pouco do valor efetivamente pago ficará registrado nos livros contábeis do comprador. Se amanhã você for desapropriado, por ser estrangeiro, no máximo receberá pelo que estiver registrado." Como observa Vidal, "o modo de fazer negócios lembra o Brasil de antigamente, com buscas por resguardo em moeda forte, medo de interferência do governo e legislação frágil, fazendo com que a informalidade e as operações fora do país sejam as mais utilizadas".
Talvez os brasileiros se sintam mais em casa que outros estrangeiros, embora o Brasil não tenha experimentado um caos como o da Venezuela. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.