O Brasil era o oitavo país do mundo no ranking de suicídio, em 2016. No ano passado, o suicídio tornou-se a quarta causa de morte entre homens e mulheres de 15 a 29 anos, no país. Os dados estatísticos são da Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo Eduardo Oliveira Martins, psicólogo e pós-graduado em Saúde Pública, o Brasil está carente de grandes investimentos estruturais e educacionais sobre o assunto. Para Eduardo, é preciso combater o preconceito que existe contra as pessoas que têm a doença.
A saúde mental ainda é pouco discutida, apesar da relevância do assunto, e são muitos os casos que acabam prejudicando o paciente, como o desemprego, por exemplo. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),em agosto de 2018 havia mais de 27 milhões de desempregados. Eduardo Oliveira destaca o prejuízo para a saúde mental de quem vive essa realidade. Ainda existem muitas dúvidas sobre o assunto. Para ajudar a esclarecê-las, o LeiaJá entrevistou o especialista.
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LeiaJá - O que é saúde mental?
Eduardo Martins - Saúde mental está além de vivenciar ausência de doenças. É quando conseguimos equacionar de maneira saudável e fluida em nós o equilíbrio do bem-estar físico, mental e social. É mais do que a ausência de transtornos mentais ou deficiências. É uma parte integrante e essencial da saúde e devemos proteger nossa saúde mental com comportamentos ligados ao autoconhecimento, higiene mental através de atividades laborais, exercícios e lazer. Deve ser um compromisso pessoal e social, assim como deve ser olhado pelo poder público e sociedade como uma política pública.
LeiaJá - Qual a importância da conscientização para a saúde mental?
Eduardo Martins - Falar de saúde mental para população é uma busca constante na tentativa de amenizar a desinformação. De forma geral devemos trabalhar na perspectiva de motivar o outro a cuidar de si, cuidar das suas questões psicológicas, afetivas, humanas, sociais e espirituais, pois estas questões intrínsecas da pessoalidade humana são elementos que, se estiverem em harmonia, qualificam a autopercepção e facilitam a organização, o equilíbrio emocional e psicológico do outro. Vivemos em um país e em uma sociedade preconceituosa, e o preconceito com pessoas portadores de transtornos psicopatológicos, cujos sintomas são visíveis e interferem no cotidiano dos acometidos por estas doenças, gera muitos comentários pejorativos, promove ações excludentes e estigmatiza o portador. Uma forma importante de amenizarmos os julgamentos inadequados e os rótulos sobre as doenças mentais é a informação, o conhecimento sobre as questões de saúde mental. Enquanto na sociedade existirem falas referindo-se à depressão e ao depressivo como preguiçosos, pessoas que não querem trabalhar, sem iniciativa, indivíduos que desistem fácil das coisas, teremos muita dificuldade de construir um novo olhar sobre os portadores de transtorno mental.
LeiaJá - Quando a pessoa deve procurar ajuda profissional?
Eduardo Martins - Um importante indicador para a busca de ajuda profissional é quando os sintomas estiverem impedindo o sujeito de viver questões do cotidiano. Quando as reações diante de situações geradoras de frustrações no trabalho, na escola, na faculdade ou na família são desproporcionais e frequentes; se as oscilações de humor são constantes e existe dificuldade de controlar as emoções como frustrações ou raiva; se há crises de insônia freqüentes; se no relacionamento com a comida existem eventos característicos de compulsão, perda periódica de apetite, abuso de substâncias como álcool e outras drogas; se há tristeza crônica acompanhada de desconforto e angústia; isolamento social; ideação de suicídio, entre outras questões, podem ser indicadores para busca de ajuda profissional.
LeiaJá - É possível que a pessoa esteja com depressão sem que perceba?
Eduardo Martins - Tristeza e depressão são coisas que aparentemente se parecem, porém diferenciam-se em segmentos importantes. Tristeza é uma condição ou estado mental passageiro, um estado psicológico comum diante de situações que estejamos enfrentando, uma decepção com amigos, ou uma mágoa no trabalho, enfim, é normal ficar triste e, por si só, estar triste não indica que alguém esteja com depressão. Depressão é uma condição crônica de desconforto e angústia e, para ser diagnosticada como depressão, é necessário identificar pelo menos cinco ou mais sintomas presentes por pelo menos duas semanas. Questões como humor deprimido, perda de interesse ou prazer, sensação de vazio, proeminente diminuição do prazer ou interesse em todas ou quase todas as atividades na maior parte do dia, perda ou ganho de peso acentuado sem estar em dieta, insônia ou hipersônia quase todos os dias, entre outros, são indicadores de depressão. Estar com depressão sem perceber seria fruto de um prejuízo profundo de consciência e autopercepção. Avalio que há a vigência de não se perceber que está deprimindo; porém, diria que há um índice significativo em não admitir que esteja deprimido, pelo inadequado julgamento de achar que depressão é sinal de fraqueza.
LeiaJá - Quais as doenças mentais mais diagnosticadas?
Eduardo Martins - Os transtornos de ansiedade são muito comuns, como síndrome do pânico, ansiedade generalizada, estresse pós-traumático, transtorno obsessivo-compulsivo, entre outros.
LeiaJá - Quais as formas de combater as doenças mentais e manter uma mente saudável?
Eduardo Martins - Atividades que estimulem o autoconhecimento e que possibilitem uma higiene mental. Atividades laborais, caminhadas, andar de bicicleta, dançar, nadar, psicoterapia como mecanismo de prevenção, autoconhecimento e ressignificação da história de vida. Bons hábitos de vida como uma boa alimentação e boas noites de sono. Frequentar bons ciclos de pessoas que estimulem práticas de convivência fraterna, diálogos saudáveis e tenham o movimento de solidariedade e compromisso coletivo.
LeiaJá - Alimentação, rotina, exercícios físicos são importantes para manter a saúde mental?
Eduardo Martins - Diria que são fundamentais e, se colocados em adequada sequência de encadeamento, são um rico instrumento de prevenção. Uma boa alimentação facilita o bem-estar físico e previne doenças crônicas. Pesquisas já comprovaram que nutrientes obtidos através da alimentação influenciam significativamente na saúde neurológica e emocional, em particular na depressão. Os exercícios físicos, por sua vez, geram a produção de serotonina, dopamina e noradrenalina, que combatem desordens de humor, falta de concentração, depressão e ansiedade. As endorfinas também ajudam na regulação da dor e nas emoções, promovem o relaxamento natural do corpo e a sensação de prazer. Diria que a alimentação, a prática de exercícios físicos e um sono regular e organizado são grandes aliados do cuidado em saúde mental.
LeiaJá - Depois que a campanha janeiro branco passou a existir, diminuíram os casos de depressão registrados?
Eduardo Martins - Não temos dados estatísticos sobre esse tipo de pesquisa que associa a diminuição de casos relacionados à vigência da pesquisa, porém, quando você estimula as pessoas a cuidarem de algo relacionado à sua saúde, a tendência é que pessoas sintam-se impulsionadas a buscarem cuidar do segmento de saúde proposto na campanha. A tendência é que a busca pelo cuidado em saúde mental não diminua, e sim, aumente.
LeiaJá - Qual o profissional competente para atendimento e diagnósticos da doença?
Eduardo Martins - Para atendimento e diagnóstico, os trabalhos em parcerias entre psicólogos e psiquiatras são os mais indicados. Porém, não podemos esquecer as equipes multiprofissionais existentes nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que fazem um trabalho importante, qualificado e eficaz. Nestas equipes existem outros segmentos e categorias profissionais que trabalham de forma integrada e contribuem significativamente para o cuidado em saúde mental.
LeiaJá - Há atendimento desse profissional nas unidades públicas de saúde?
Eduardo Martins - Sim. Existem nos CAPS profissionais e equipes capacitadas para o cuidado em saúde mental no município de Belém. E é pertinente frisar que em algumas unidades de saúde do município existe o psicólogo que atua no programa de saúde mental na atenção básica para os casos que estão no perfil previsto para atendimento, que são casos não severos, diagnosticados e matriciados pelos CAPS. Ou para questões de saúde mental detectadas em acompanhamentos na Unidade Básica de Saúde que estejam no perfil da atenção básica para acompanhamento em saúde mental.
LeiaJá - O que as pessoas que procuram esse tipo de ajuda devem fazer?
Eduardo Martins - Devem ser frequentes nos atendimentos. Devem cumprir os prognósticos, confiar nas equipes profissionais, aderir ao tratamento e buscar no dia a dia ressignificar sua história e condição de saúde mental.