O procurador-geral da República Augusto Aras enviou nesta sexta, 26, ao Supremo Tribunal Federal, um parecer pelo arquivamento de uma queixa-crime apresentada contra o presidente Jair Bolsonaro por supostos crimes previstos na Lei de Segurança Nacional. No documento, o chefe do Ministério Público Federal citou o entendimento da corte de que 'a liberdade política pressupõe a livre manifestação do pensamento e a formulação de discurso persuasivo e o uso de argumentos críticos'.
Editada em plena ditadura militar, a Lei de Segurança Nacional tem um 'encontro marcado' com o Supremo. A norma tem sido utilizada pelo governo do presidente Jair Bolsonaro contra opositores.
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A manifestação de Aras foi encaminhada ao ministro Marco Aurélio Mello, relator da petição impetrada no Supremo pelo advogado Walter Arnaud Mascarenhas Júnior. Na queixa-crime, ele listava uma série de posturas e falas de Bolsonaro, imputando ao presidente supostos crimes de: 'fazer, em público, propaganda de processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social'; 'incitar à subversão da ordem política ou social'; e 'tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados'.
O advogado listou quatro episódios envolvendo o presidente, sendo o primeiro deles protagonizado pelo então deputado federal em 1999. Segundo o advogado, na ocasião Bolsonaro mencionou que, caso viesse a ser presidente 'promoveria um golpe, visando realizar mudanças no Brasil, por meio de uma guerra civil e da matança de umas trinta mil pessoas'.
Outros dois momentos descritos na queixa-crime se deram em 2020: quando Bolsonaro divulgou vídeo no Whatsapp sobre manifestações no dia 15 de março; e quando o presidente, na famosa reunião ministerial do dia 22 de abril, defendeu o 'emprego de armas pela população brasileira em eventuais protestos contra prefeitos e governadores, face aos decretos de combate à pandemia'.
Já o último ponto questionado por Mascarenhas é o fato de o presidente ter alegado suposta fraude nas eleições brasileiras (sem apresentar quaisquer provas) e defendido o voto impresso, quando comentou a invasão do Capitólio, nos Estados Unidos, em janeiro de 2021.
No aparecer a Marco Aurélio, Aras fez ponderações sobre cada um dos episódios, citando por exemplo, que o primeiro deles, relacionado a uma fala de Bolsonaro quando deputado, já estaria prescrito, além de não ter relação com o mandato do presidente - que tem foro temporário. Já sobre as outras imputações, o PGR defendeu que 'não se amoldam às normas penais da LSN'.
Na avaliação do chefe do Ministério Público Federal, os fatos atribuídos à Bolsonaro refletem 'legítimos exercícios de seu direito fundamental à livre manifestação do pensamento'. "A liberdade de pensamento é considerada essencial à higidez do regime democrático e do princípio republicano. A livre circulação de ideias e o debate público são fundamentais para a garantia de uma sociedade aberta, em que são respeitadas, de forma isonômica, visões distintas sobre a mesma temática", escreveu o PGR.
O 'encontro marcado' da LSN com o Supremo
A constitucionalidade da Lei de Segurança Nacional deve ser enfrentada em breve pelo Supremo Tribunal Federal. Desde janeiro, diferentes partidos - PTB, PSB, PSDB, PT, PSOL e o PC do B - já impetraram ações no Supremo contra a norma. A discussão sobre a norma também reacendeu no Congresso Nacional.
Em manifestação encaminhada ao Supremo, a Advocacia-Geral da União defendeu a validade do instrumento jurídico que tem sido utilizado pelo governo do presidente Jair Bolsonaro contra opositores. O órgão sustenta que a aplicação da lei deve ser 'ser econômica e limitada às condutas que, de fato, se amoldem ao seu escopo, representado pelo dolo direto de atentar contra a segurança nacional'.
Como mostrou o Estadão, o número de procedimentos instaurados pela Polícia Federal para apurar supostos delitos contra a segurança nacional aumentou 285% nos dois primeiros anos do atual governo em comparação com o mesmo período das gestões Dilma Rousseff e Michel Temer.
O ministro da Justiça André Mendonça, já usou a norma para pedir inquéritos contra críticos de Bolsonaro, como o caso do advogado Marcelo Feller e do chargista Renato Aroeira. O chefe do Ministério da Justiça e Segurança Pública, também usa os crimes contra a honra para embasar pedidos de investigação contra opositores do presidente, como o sociólogo Tiago Costa Rodrigues (do caso do outdoor que comparou Bolsonaro a um 'pequi roído') e o ex-ministro Ciro Gomes (PDT).