A deputada federal Marília Arraes deixou o PT e se filiou ao Solidariedade nesta sexta-feira (25). Com o ingresso no novo partido, a neta de Miguel Arraes vai concorrer ao Governo de Pernambuco. Em pronunciamento na manhã de hoje no Recife, ela declarou que não se encanta pela zona de conforto, ao justificar a saída do PT, e se classificou como o nome para fazer frente à "influência negativa do projeto do poder pelo poder".
Trajetória
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Parlamentar desde 2008, quando foi eleita vereadora do Recife pelo PSB, a deputada federal também concorreu e se elegeu em 2012 e 2016 ao mesmo cargo e, em 2018, ao mandato que hoje exerce. Em 2020, a neta de Miguel Arraes teve uma disputa acirrada com o prefeito João Campos (PSB), seu primo, mas acabou sendo derrotada no segundo turno. O desgaste com o PT nas eleições de 2020 se estendeu até este ano, culminando no desembarque da sigla.
No Partido dos Trabalhadores desde 2016, em 2020, na disputa pela cadeira na Prefeitura do Recife, Marília acabou tendo vários embates internos até que seu nome como pré-candidata fosse oficializado. Era ventilada a possibilidade dela não concorrer à Prefeitura por conta da aliança entre PT e PSB na Frente Popular, defendida pelo senador petista Humberto Costa, por exemplo. Além disso, a sua trajetória na sigla foi cheia de expectativas não correspondidas
A cientista política e professora Priscila Lapa destacou que a situação de Marília com o PT “nunca foi confortável”. “Ela sempre se colocou numa posição incômoda, revelando incômodos com o partido e o partido com ela. Nunca houve um casamento perfeito de juntar a fome com a vontade de comer. A gente já espera que haverá esse rompimento em algum ciclo eleitoral, ainda não foi o momento oportuno em 2020, porque ainda foi possível a manutenção a partir dos elementos da conjuntura de 2020. Mas toda a eleição pernambucana tem um novo capítulo na relação PT-PSB, e Marília faz parte desse contexto”, explicou.
Senado
Neste ano, o desejo de Marília de sair como candidata ao governo de Pernambuco pelo PT foi, mais uma vez, frustrado. Recentemente a sigla deu como única possibilidade, que já havia sido descartada pelo partido antes da deputada demonstrar querer sair da sigla, a concorrência por uma vaga no Senado Federal.
No domingo (20), em reunião do Grupo Tático Eleitoral (GTE), sem a sua presença, o PT informou que Marília ia sair como candidata ao Senado pela Frente Popular. Em resposta, a deputada afirmou que a atitude revelava, “no mínimo, descuido com o tratamento de assunto tão sério e uma precipitação sem limites”. “Não fui consultada e não autorizei que envolvessem o meu nome em qualquer negociação, menos ainda que tornassem público, como se fossem os senhores do meu destino, sobretudo após meses de desgaste político e público”.
“Em 2018, o acordo de cúpula PT/PSB, impediu a minha candidatura ao Governo do Estado, quando liderávamos todas as pesquisas de opinião. Em 2020, nas eleições para a Prefeitura do Recife, a cúpula do PT fez de tudo para inviabilizar politicamente a minha campanha, o que ajudou a dar a vitória ao adversário. E agora, indelicadamente, usam o meu nome, como massa de manobra. Tudo isso não é compatível com o bom senso que deve nos nortear na política”, contou.
Na segunda-feira (21), Marília Arraes encontrou com o ex-presidente Lula e contou ter conversado sobre o quadro político nacional. “Analisamos a situação eleitoral em Pernambuco e as alternativas que se colocam no Estado, reafirmando o compromisso com a candidatura do presidente Lula”. Nas três últimas notas enviadas, ela destacou seu apoio intransferível à candidatura de Lula.
Liderança maior que o PT
De acordo com Priscila Lapa, a tentativa de comprovação da proximidade dela com Lula é uma “grande carta na manga”. “Ela pode se descolar do PT, mas não de Lula, e qualquer liderança que tente se meter nessa relação, é porque reconhece a parte da sua força perante ao eleitorado que reside nessa identificação. Assim como Lula, ela é aguerrida, tem as mesmas bandeiras de Lula e constrói isso muito bem, porque não constrói apenas no período eleitoral. Em todas as ocasiões de posicionamento político, mesmo em momentos em que ninguém queria falar de Lula, no ápice dos processos da Lava Jato e desgaste como presidente, ela sempre se posicionou favorável, assim como Teresa Leitão, e isso faz com que tenha uma identificação muito clara do eleitorado de Lula com Marília”.
Em recente entrevista à Rádio Clube, a deputada estadual Teresa Leitão (PT) afirmou que “Marília é a candidata eleitoralmente mais forte, não apenas dentro do PT, mas fora do PT também”.
A cientista política sustentou a afirmação da deputada estadual, e acrescentou que o eleitor de Marília deve acompanhá-la independente de qual partido ela esteja, tendo em vista que ele está chateado com a forma como o PSB a trata. “Marília se tornou uma liderança política maior que o PT em alguns aspectos localmente, e pode ser algo que ela utilize favorável a ela nesse sentido de independência de para onde ela vai, o eleitor acompanha. Ela tem um eleitor mais ideológico, mas que também está chateado. Vale salientar que o eleitor que pode se descolar de Marília porque vota no PT e pode não gostar da mudança partidária, provavelmente é minoritário no sentido de que o que prevalece dentro do eleitorado de Marília ficou claro nos comentários feitos nas publicações no fim de semana”.
“É uma eleitor chateado com a forma como o PSB lida com ela, as feridas de 2020 que ainda não foram saradas, porque o PSB coloca Marília numa condição jamais como aliada política ou alguém que pode somar, é sempre numa condição de adversária. O eleitor dela gosta da forma aguerrida com que ela enfrenta, inclusive o fato de ser família e não se desdobrar às determinações de um ponto de vista familiar como se ele tivesse uma autenticidade política que agrada o eleitorado dela e poderá acompanhá-la, sim, em qualquer movimentação partidária que ela poderá fazer”, detalhou a estudiosa.
Janela Partidária
Marília deixa o PT durante o período de janela partidária, tempo disponibilizado para a migração de partido de deputados estaduais e federais sem perder o mandato por infidelidade partidária, que iniciou no dia 3 de março e vai até a sexta-feira, 1º de abril. O período, de acordo com a cientista política e professora Priscila Lapa, é do “tudo ou nada”.
“Um passo errado agora compromete alianças e o futuro político das pessoas”. Sobre a possível troca de partido de Marília Arraes, a especialista afirmou que é um “momento delicado”, tendo em vista o isolamento que a deputada teve. “A impressão que fiquei é de que ela estava se metendo numa briga maior do que a sua capacidade de dar conta dessa briga e se colocar nesse cenário. Acho que nesse cenário de disputa entre PT e PSB, Marília acaba sendo um elemento frágil nessa relação a partir do momento que o partido dela não é fechado com ela. Se o partido não é fechado, dificulta a sobremaneira que nesse enfrentamento com o PSB, que a enxerga como uma adversária a altura”.
“Ela não incomoda porque é fraca”, diz Priscila. “É justamente porque o PSB tem dimensão de que se o nome dela for realmente trabalhado numa candidatura bem estruturada, Marília certamente tem muita chance de vencer uma eleição com uma grandeza maior”, detalha.
*Com informações de Victor Gouveia