O Campeonato Brasileiro tem 12 fornecedores de uniforme para os seus 20 clubes. São seis empresas (Umbro, adidas, New Balance, Nike, Puma e Volt) que brigam pela atenção dos dirigentes e tentam agradar ao torcedor. Seis clubes, no entanto, apostam em fabricação própria, uma tendência cada vez maior no mercado. Times como Fortaleza, Ceará, Atlético-GO, Coritiba, Goiás e Juventude quebraram a hegemonia das grandes empresas e partiram para produções menores e personalidades, onde tudo pode ser resolvido num café entre as partidas.
Trata-se de um mercado dinâmico, em que cada time analisa as suas possibilidades financeiras para fazer uma escolha mais adequada. No caso do Atlético-MG, que recentemente anunciou parceria com a gigante do ramo adidas para o fornecimento do material esportivo, por exemplo, todas os aspectos foram explorados: o clube poderia continuar com a antiga fornecedora, a Le Coq Sportif; poderia ainda investir em uma produção própria; e poderia fechar com uma das grandes empresas, que foi o que aconteceu neste caso.
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Segundo Leandro Figueiredo, diretor de negócios do Atlético-MG, um fator que foi levado em conta para a escolha foi a internacionalização da marca do clube, além de um pedido da torcida, já que a empresa alemã vestiu o time há quase 40 anos. O formato do negócio, baseado em royalties, também foi um atrativo. A marca própria, embora analisada, não seria ideal para o momento que o Atlético está, diz o dirigente.
"A adidas nos ofereceu um material completíssimo, assim como toda a possibilidade de internacionalizar ainda mais o nome do clube, além de uma padronização para o nosso futebol tanto masculino quanto feminino. A nossa torcida abraçou essa chegada e tivemos um ótimo lançamento. Temos uma expectativa de vender cerca de 40% a mais do que na temporada passada (quando o time de Cuca foi campeão brasileiro e da Copa do Brasil). Apesar de termos poucos dias desde o anúncio da parceria, vemos que acertamos na nossa decisão", disse.
Vestir o time com camisas novas a cada temporada é tão importante quando contratar reforços para o elenco. A novidade sempre trás esperança de conquistas, de acordo com os entrevistados. E camisa de futebol tem muito simbolismo nessa história, sem falar dos colecionadores.
O que acontece na parceria entre Atlético e adidas é que a empresa fornece um enxoval completo para o clube, que é abatido no valor total de receita. Existe uma participação de cada um nas vendas dos produtos e, ao fim da temporada, ambos fazem um balanço e dividem os lucros conforme os valores que forem atingidos. "Existem gatilhos de royalties que precisam ser atingidos nesta parceria e é nisso que se baseia o negócio. Nós entendemos que o Atlético é um meio, não o fim da operação. É uma coisa que retroalimenta e beneficia os dois membros da parceria, e não só um. Para se ter ideia do nível de profissionalismo trazido pela adidas, hoje nós temos um profissional específico até para ajudar com as chuteiras que nossos atletas vão utilizar, em todos os níveis, garantindo ainda mais qualidade", disse Figueiredo.
Com a assinatura com o Atlético, a adidas se manteve como a segunda empresa que mais tem participação no mercado de fornecedores da Série A do futebol brasileiro, com quatro clubes: também estão com o Flamengo, o Internacional e o São Paulo. Quem lidera essa preferência, no momento, é a Umbro, com cinco: Athletico-PR, Avaí, Cuiabá, Fluminense e Santos.
Um dos destaques da marca inglesa neste ano foi o lançamento de uma "collab" entre Umbro, Santos e Charlie Brown Jr. Segundo o diretor da Umbro Brasil, Eduardo Dal Pogetto, a marca busca fugir das repetições e trazer objetos customizados para cada um dos clubes, entregando produtos que possam conectar não só à história do cliente, mas também de outros universos.
"Somos uma marca bastante diferenciada no que se refere à qualidade dos produtos, cuidado com os temas trabalhados, além da preocupação que temos em produzir projetos customizados para cada time parceiro, fugindo ao máximo da repetição de um tipo de layout entre eles nas camisas oficiais. Aliado a isso, a Umbro busca sempre oportunidades que possam acrescentar à parceria, explorando projetos que fujam do óbvio", diz o gestor. "Na collab entre Umbro, Santos e Charlie Brown Jr, conectamos quatro mundos distintos: moda, futebol, música e cultura do skate, tornando-se sucesso não apenas com a torcida santista como também com as torcidas dos demais clubes".
Pogetto acrescenta, ainda, que o mercado de vendas de camisas depende de diversos fatores. Alguns deles podem ser controlados por quem comanda a operação, como a Umbro, que são o design, distribuição e mix de produtos. Outros, dependem muito do desempenho esportivo do time em competições, da chegada de nomes importantes no mercado ou da contratação/venda de um ídolo, por exemplo. O processo de desenvolvimento de uma camisa dura cerca de um ano e, por vezes, mais de dez opções são oferecidas.
Nem todos os times, porém, acreditam que confiar toda a operação a uma marca é ideal. Esse foi o caso do Fortaleza, que criou a Leão1918. Segundo Bruno Brayma, gerente de projetos do clube, isso se deu primeiro porque o Fortaleza percebeu que as grandes empresas têm fabricação no Ceará e aí veio o estalo de produzir as camisas do time nessas mesmas fábricas, mas sem terceiros, sem atravessadores, e com a mesma qualidade e tecnologia desses perfis.
"Nós temos uma média entre 100 e 120 mil unidades de camisas de jogo que são comercializadas em nossas lojas anualmente, sem entrar no mérito de enxoval - passeio, concentração, viagem e outros produtos. Todo uniforme da Leão1918 vem com um contexto histórico por trás, como os 100 anos do clube, além de homenagens e camisas temáticas da Copa do Nordeste. Com o advento da marca própria, o clube conseguiu fortalecer o seu elo junto ao torcedor com um produto de qualidade. Não apenas camisa de jogo, que é a locomotiva desse trem, mas o clube evoluiu com os produtos. Com a marca própria, trazendo mais retorno tanto em estrutura quanto qualificação dos seus funcionários como também dentro do gramado", explicou.
Bayma diz que, na visão do Fortaleza, embora as marcas grandes tenham as suas vantagens, a produção própria trouxe uma força motriz maior para as aspirações do clube, que chegou à sua primeira Copa Libertadores neste ano. "A diferença entre as marcas - Nike, adidas, Kappa, por exemplo - e a produção própria é o modelo de negócios, no qual o Fortaleza ganha no todo, na aquisição de seus produtos, e na venda. Já com marcas terceiras, elas expõem a sua marca como um patrocínio e entram com um aporte financeiro para garantir tanto a visibilidade da marca quanto garantir um enxoval mínimo para os times. Cada clube participa do seu modelo de negócios. O Fortaleza está satisfeito com a marca própria e acredita que é mais rentável e que dá mais credibilidade à sua marca junto ao torcedor".
Empresa brasileira que teve entrada no mercado anunciada há pouco mais de um ano, a Volt Sport também é uma das marcas que estão inseridas no Brasileirão, com o fornecimento de material esportivo para o América-MG, além de clubes em outras divisões. O modelo de negócios da empresa é atrativo e desperta a curiosidade dos clubes - existe pré-contrato com dois times, que ainda não podem ser anunciados. A empresa possui fábrica própria em Joinville (SC) e garante aos parceiros enxoval, remuneração contratual e repasse de royalties sobre o faturamento.
O sócio-diretor da empresa, Fernando Kleimmann, disse ao Estadão que o surgimento da Volt se deu pelas lacunas encontradas no mercado, tanto no fornecimento de produtos quanto em questões de atendimento e de entrega. Por conta disso, o modelo formalizado foi o de oferecer uma solução completa aos clubes envolvidos, desde o desenvolvimento das peças até sua entrega e venda - um cuidado com toda a 'cadeia' envolvida no fornecimento das camisas. Por conta disso, diz ele, oito clubes já são atendidos neste período de um ano e, desses oito, seis funcionavam no modelo de marca própria.
"O mercado carecia de uma marca nacional forte, que trouxesse garantias e benefícios para os clubes. Nós temos três pilares para fazer dar certo: fabricação própria, investidores e o know-how do mercado. Os torcedores compram história, pertencimento e material exclusivo. A Volt oferece porcentagens relacionadas ao valor bruto, modelo de negócio que vai na contramão do mercado brasileiro. Além disso, garantimos o enxoval completo do time, sem nenhum custo adicional, que engloba linha de jogo, treino e viagem", explicou Kleimmann. "Por já ter trabalhado do outro lado dos projetos, como diretor de clube, tenho noção das dificuldades na relação com os fornecedores de materiais esportivos. Conheço os anseios das agremiações, principalmente quando falamos de equipes de menor porte, em relação a confecção e distribuição dos produtos oficiais".
Armênio Neto, que trabalhou no marketing do Santos na era Neymar, acredita que o modelo de negócios do futebol brasileiro vem sofrendo uma mudança, com maior força nos royalties e uma divisão do mercado regional, como é o caso do Fortaleza. "Nos últimos anos, houve uma mudança no modelo de negócio entre as empresas de material esportivo com os clubes. Atualmente, as companhias dão mais royalties do que garantias fixas aos times. Por outro lado, os com força regional, preferem migrar para as marcas próprias ou fabricantes na mesma região, impulsionando os lucros no mercado. A chegada da SAF (Sociedade Anônima do Futebol) não significa que as relações serão modificadas. O que pode acontecer é uma renegociação das parcerias, tendo os novos gestores à frente do projeto empresarial do clube. É o caso do Botafogo-RJ, que rompeu os acordos com os patrocinadores antigos para pleitear a valorização da marca", analisou.