Enquanto os colégios de São Paulo continuam proibidos de oferecer classes presenciais, aulas de idiomas e esportes viraram atalhos para reabrir a escola. Atividades extracurriculares ganham espaço em colégios particulares e unidades voltadas para o contraturno, impulsionadas pela demanda de retomada da rotina escolar pelas famílias.
Como são cursos livres, ou seja, não fazem parte da educação regulamentar, as atividades estão permitidas pelo plano de reabertura econômica do governo paulista e também por regras municipais.
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Especialistas afirmam que o risco de infecção nessas atividades é mais baixo pelo menor número de alunos e tempo de permanência no local, mas destacam que há dúvidas sobre a capacidade de transmissão do vírus pelas crianças.
No início do mês, o Colégio Magno/Mágico de Oz, na zona sul, abriu as portas para cursos extras que já oferecia antes da pandemia. As atividades incluem berçário e pré-vestibular. Segundo o colégio, a decisão foi tomada após ouvir a comunidade escolar. O arranjo é possível, de acordo com a direção, porque cursos livres no colégio são realizados por outra empresa, ligada ao Magno.
"São abertos porque é um centro integrado de estudos que funciona dentro da escola", explica Cláudia Tricate, diretora pedagógica do Magno. No berçário, o tempo de permanência é de 45 minutos para atividades como musicalização e educação psicomotora. Já a sala de Inglês recebe até três crianças.
A oferta de cursos livres atende a uma dupla necessidade: por um lado, das famílias, que veem crianças ansiosas e estressadas. Por outro, das escolas, que podem ceder a infraestrutura do prédio a empresas responsáveis pelas atividades.
A Afterschool, na Vila Madalena, na zona oeste, já recebe até 20 crianças de 4 a 11 anos. A unidade, cadastrada para ensino de idiomas, música e arte, funciona como um contraturno bilíngue, com atividades em inglês e pertence aos mesmos donos de uma escola de educação infantil a 2 quilômetros, que está fechada.
Agora, passou a oferecer turmas em Português. Crianças com atividades escolares podem levar o computador e serão supervisionadas nas tarefas. "Há famílias que estão com anseio de voltar ou precisam voltar", diz Bruno Campos, diretor e fundador da Afterschool.
Donos de colégios particulares já avaliam juridicamente a possibilidade de abertura com cursos livres. "Minha escolha é por retomar as atividades", disse a mantenedora de uma escola de educação infantil na zona sul, que perdeu 40% das receitas e pretende abrir em setembro para cursos livres.
O Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (Sieeesp) tem consultoria jurídica para esse modelo de abertura. Segundo Ademar Batista, da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), essa oferta tem crescido em todo o País. Com receio de fiscalização, diz, "as empresas estão fazendo sem alarde".
A Fenep entende que mesmo cursos livres oferecidos pelas escolas (e não por terceirizadas) podem funcionar. Já para Benjamin Ribeiro, do Sieeesp, as escolas precisam de cadastro específico para ofertar esses cursos.
Procura
Pais que optam por matricular os filhos nessas atividades relatam exaustão e prejuízos ao desenvolvimento pela longa quarentena com as crianças. "Estava há 150 dias trancada em casa e não dava mais para suportar", diz Millena Onesti, mãe de Caio, de 6 anos, e Maia, de 4. As crianças continuam matriculadas na escola, mas não se adaptaram bem às classes online e a mãe procurou aulas particulares e espaços que atendessem presencialmente. "Descobri uma escola de Kumon para ter outra atividade de raciocínio", diz Millena. Cerca de 60% das unidades do Kumon da capital, voltado para a resolução de questões de Matemática, Inglês e Português, já têm aulas presenciais. "Aqui tem procura por pessoas de outros bairros. Os pais sentem falta da rotina", diz Zilda Celidonio, orientadora de uma unidade em Pinheiros, na zona oeste. Todos que entram têm a temperatura aferida, as salas não recebem mais do que cinco crianças e o contato dos alunos com os orientadores foi reduzido.
Cautela
A liberação para os cursos livres é vista com cuidado por educadores e médicos. Por um lado, existe a necessidade dos pais e das crianças, cansadas do confinamento. Além do fato de a exposição ao risco ser menor do que se elas estivessem em aulas regulares. Por outro, há questionamentos se as atividades podem piorar a pandemia, com crianças assintomáticas contaminando pais e professores.
"Há demanda por essas atividades, tanto pelos pais, que precisam trabalhar, quanto pela exaustão que se criou entre as crianças", diz Silvia Colello, educadora da Universidade de São Paulo (USP). "A criança que sai para fazer atividade física tem a possibilidade de descarregar energias, relaxar. Mas temos de assumir que é uma exposição e tem um risco - atenuado pelo número menor de alunos. Mas estranho pelo fato de não ser atividade essencial."
Já na opinião do infectologista Carlos Magno Fortaleza, do Centro de Contingência do Coronavírus em São Paulo, do governo estadual, chegou-se à conclusão de que os cursos livres oferecem menos riscos e permitem que se faça preparação para a abertura das escolas, por reunirem menos pessoas e por período menor de tempo. "Uma coisa é uma escola abrir em momentos isolados para aula de Inglês. É bem diferente de lotar de alunos o tempo inteiro. Pode haver contradições em termos educacionais, mas não em termos epidemiológicos."
Já o plano de abrir escolas para reforço em setembro, apresentado pelo governador João Doria, não se diferencia dos cursos livres do ponto de vista epidemiológico, segundo Fortaleza. "Fala de começo com só 20% da ocupação das classes e revezamento de horários. É uma proposta sutil e pensada para não prejudicar demais as crianças no momento em que os pais voltam a trabalhar."
Professor da Faculdade Medicina da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, Domingos Alves, por sua vez, acredita que a abertura dessas atividades com crianças pode aumentar as infecções, em cenário que ainda é de alta taxa de contaminados. "Todas as evidências das experiências praticadas em nível internacional mostram que o retorno a essas atividades com o número de casos ainda aumentando é um desastre para a saúde pública." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.